A BALA DE MORANGO NO FEIJÃO

Sabe, dizem que escrever aqui é espalhar ao mundo, mas com a opção de desfazer amizade ou deixar de seguir ngm ouve ngm, é como se todos gritassem ao mesmo tempo sem que ngm pudesse realmente se ouvir.

Eu trato isso como um diário de bordo, acontecimentos marcantes pra mim, assuntos que me fazem pensar, assuntos sobre os quais gostaria que vocês pensassem na esperança de que esse exercício promova uma melhora na sociedade. E desde que tomei consciência do mundo q eu detesto a grande maioria das coisas aqui.

tentam me convencer desde sempre que existe um lugar melhor que este, que existe outro lugar e que teremos vida eterna. Outros mundos, outras dimensões, outras religiões, o salvador vem buscar e etc. essa teoria caiu pra mim há dois anos atrás.

A morte não é uma existência, a morte não é. Existência é vida e a morte é a não existência da vida. Existe a vida e a não existência dela, e só. A Vida existe e depois não mais. E só.

Desde que eu me reconheço existir eu sinto o ambiente interferindo em mim. E todos a minha volta me dizendo ou me fazendo pensar que sou doente por me importar.

Eu me importo tanto com tudo q não entendo como podem julgar evolução deixar de se importar.

Dizem que isso tem nome de doença mental, problemas hormonais, défice de substancias no cérebro.

Mas eu acho mesmo que a doença não é esta, a doença é outra.

Como alguém tem CORAGEM de dizer pra uma pessoa deprimida que vá ao hospital pra ver o que é sofrimento e ver o quanto sua vida é ótima perto da vida de pessoas que sofrem de verdade.

Como alguém pode pensar que ver o outro sofrer pode me deixar feliz? Onde esta a sanidade disso? Onde esta a sanidade em olhar alguém passando frio na rua e pensar "que sorte a minha por não estar no lugar dele"? E isso me fazer sentir alegria e felicidade e gratidão? Gratidão por existir alguém ao meu lado que passa necessidade eu não? É sério? Prefiro ser doente então. Mas saber que as pessoas que mais amamos pensam assim dói. Dói de um jeito que parece não ter solução. Pois nós mesmo com tudo de errado ainda amamos.

Pessoas enfermas sentem dor por seu acometimento e elas tem razões físicas para sofrer. Não sofrem por se importarem, sofrem por não ter opção. E isso não é diferente de quem sofre por empatia. Oque difere é que sofremos pelas dores dos outros como se fossem nossas. E realmente não me lembro de conhecer pessoas assim. Só me lembro de perde-las.

Eu sai de um hospital onde fiquei meses em tratamento de uma doença desconhecida, eu no meu primeiro ano de vida conheci o sofrimento e a solidão dos hospitais, a frieza delicada de quem sorri antes de te furar com uma agulha por pensar que o sorriso ameniza a dor de quem sofre. Eu lembro da solidão, lembro da incompreensão do que acontecia, lembro do amor que não desistiu, lembro de querer sair e nunca mais voltar. Lembro de não poder nada. Os sentimentos ficam cravados no corpo. E só se importa quem já sofreu. Já não chega?

Por isso eu vivo tanto o meu mundo e minha vida corrida que esqueço as vezes que existe "la fora" esse la fora é fora de mim. Acabo me envolvendo com quem está ao meu redor, são poucas pessoas que me orbitam mas elas são pra mim o mundo que existe. Até que....

Dragada pra realidade as noticias surgem como tornados. Lindas manifestações da natureza que destrói tudo o que tem pela frente, apenas para que depois a vida possa voltar a existir pura.

Há dois anos perdi meu irmão de sangue. Cara q foda, sério, parada sinistra que não pá. Tipo... Ssssssss.... Sabe.... Não da pra explicar, a reação comum é chorar desesperar e sair correndo se jogar da ponte, criar movimentos, reação em cadeia... Mas eu... Que vivo fora não sei nem como reagir. Então eu faço uma ligação, peço ajuda de uma amiga, corro atrás dos papéis, limpo as sobras da mesa e preparo a janta. E o exercício mantem a roda do cotidiano girando até que...

Há uma semana meu outro irmão escolheu partir. Pqp que escolha... E eu que sempre preguei a autonomia humana, o autogoverno e o desenvolvimento do ser humano voltado para a própria vida perdi alguém por escolha própria. E pra piorar eu entendo! Eu entendo, eu permito q ele escolha, eu acolho a sua escolha, e sinto muito por nós que ficamos. Mas não sinto muito por ele! Sinto por nós que o perdemos. Eu não estava presente na vida dele, nem ele na minha, mas nos conhecíamos e eu o conhecia, e o reconheço em cada relato dos amigos, o reconheço em cada frase, cada palavra cada atitude dele relatada. E sinto inveja de todos que estiveram mais com ele do que eu. pq desde q olho pra fora da janela só vejo sangue morte sexo tiro violência. Sempre desejei partir daqui o mais breve possível, e pessoas como ele me fazem querer saber mais e querer ficar... Ele escolheu não ficar. E eu entendo. Entendo o quanto é complicado perder e perder. Buscar e Buscar... E nunca chegar ao tão sonhado paraíso, o paraíso que o amor prega e o paraíso que pregam sobre o amor. O paraíso que o casamento e a vida a dois prega. O paraíso ilusório do amor eterno que pregam pra cima de nós. A obrigação da busca pela felicidade eterna, a ânsia de viver o que o outro vive. A obrigação de ser feliz todos os dias independentemente de tudo oq haja. Como se apenas a felicidade fosse valida para uma vida valer a pena.

A felicidade pra mim é uma bala de morango no meio do feijão. A comida salgada que sustenta, a bala que da uma adoçada momentânea na vida, e o gosto do feijão ainda com a bala que tento desesperadamente saborear e sentir aquele doce que logo acaba e volto pro feijão da vida real. e ele que se formou chef só queria refinar o feijão do dia a dia.

Depois de um ano da separação do meu pai ele já tinha uma namorada nova, e alguns anos depois disso minha mãe viria a se relacionar com o pai dele do Rafa e da Bruna. E assim ficamos irmãos. Duas famílias pela metade se tornou um inteiro. Éramos inteiros juntos. Acho que passei os anos mais felizes da minha vida ao lado deles. O Pai dele fazia minha mãe muito feliz, era o que eu achava e sentia. Entre eles não sei, mas pra mim eles eram felizes, apaixonados, entregues... E eu gostava de tudo oque fazíamos, íamos a restaurantes, viagens, tínhamos mais dois irmãos, e ver a minha mãe feliz era a melhor parte de tudo. Moramos juntos por tempo suficiente para nos amarmos o resto da vida... mas como a bala n meio do feijão o doce uma hora acaba.

O Pai dele me levava pra escola todos os dias, só não levava quando eu saía escondida pra ele não levantar. Ele tinha uma preocupação comigo que eu não entendia porque com os meninos ele não tinha. E só hoje depois de 3 filhas entendi porque, ele conhecia a vida, a violência, morte, tiro e sangue, e sabia o quanto uma menina está vulnerável nesse mundo. E ele me levava todas as manhãs pra escola. Mas o filho dele não. O Rafa era expulso dos colégios, chamado sempre na diretoria, ele fugia e brigava. Eu sabia que ele mentia, mas o ajudava sempre que podia, tentava amenizar as surras... E lembrando de tudo isso só consigo entender ainda mais. Quando digo que os pais deveriam ter uma universidade antes dos filhos não digo isso apenas por me sentir despreparada pras minhas mas por ver o quanto os pais em geral são completamente rendidos ás questões dos filhos. Seres humanos negligenciados ao extremo por pessoas que apenas pensam em não ficarem sozinhos na velhice. Por quererem ajuda na roça, por precisarem prender o marido em casa (RA) por acharem que sendo mães e pais estão sendo completos. Querem filhos mas não os tratam como tal,

Ausente e presente. Bate e assopra.

E nos separamos quando o pai dele morreu. Sentimos muita falta. Mais um marco na minha vida mudou tudo, da bala de morango pro gizado de jiló e viemos morar aqui. O Jiló dos infernos essa cidade.

Cidade de gente ruim interesseira, falsa... Que falam errado como se fosse certo e ainda acham que o mundo é o erro. Chamam estojo de penal e se sentem evoluídos por usarem um termo alemão pra dar nome de salsicha... Porque ser europeu é chique e evoluído. ME ERRA. Gente q te enlouquece e sai por aí dizendo que a louca surtou, e faz todos pensarem q o errado é certo. Cidade de gente que vê o outro apanhar na rua humilhado e passa reto como quem não vê. Cidade de gente que se acha dono de mulher, tratando mulher como propriedade, essa cidade é disso.

Cashmere
Enviado por Cashmere em 21/09/2024
Código do texto: T8156278
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