PERTENCIMENTO

Que lugar pertencemos?

A lugar nenhum.

Que amor teremos?

Amor nenhum.

Que família teremos?

Família nenhuma.

Pode parecer pessimismo, mas se olharmos bem as pessoas, estão todas perdidas em afetos defeituosos, misturados com medos religiosos, ostentando uma paz falsa, onde a dor é escondida no fundo da alma. Somos uma sociedade construída em cima da dor e exploração dos mais fracos, vivemos num mundo de aparências, de verdade escondidas, de aberrações mascaradas, onde as crianças e os idosos são as maiores vítimas, são vidas jogadas no lixo.

Gente produzindo e não tendo a quem mostrar, os teatros e cinemas, agonizam, os livros nem se fala, o mar ainda é uma boa opção, mas sem amigos, sem os ares dos anos oitenta, Copacabana perdeu seu encanto, aquele cantinho de areia em frente a Raul Pompéia, agora é igual a rodos os outros, o tempo destruiu a magia que havia no ar, nos caracóis dos meus cabelos, no fio dental da ousadia do meu corpo quase nu, tão dourado que aquela brancura de Nova Iguaçu se foi.

Os sonhos, as buscas, as viagens, os quartos de hotéis, Rio, S P, M.G, Bahia, eram dias de descobertas, de muito trabalho, de muito público, nossa quantas pessoas iam nos ver!

Até o famoso Carequinha fez parte desse cenário, eram dias de muita luz, dos refletores, do sol, a vida era uma incógnita aos vinte anos.

Hoje continua igual, mas um pouco mais cinza, dos meus cabelos, da névoa que a arte se meteu, ligo a tv, não reconheço os atores, os atuais parece que perderam o ritmo, não consigo me emocionar com nenhum deles, os textos já não me prende diante das telas. O quê fazer?

Não sei, talvez iniciar uma revolução cultural, criando um espaço novo, onde a arte possa brotar com toda sua força e arrebatar plateias de movo.

É esse o meu lugar de pertencimento, o palco.

Sei que o mundo é um grande teatro, mas ando cansada dele, na verdade eu gosto mesmo é do outro, aquele com ribalta, coxia, bilheteria, e colegas a nos dá a deixa.

Sinto saudades da campanha de final de ano na Cinelândia, VÁ AO TEATRO. Que fim levou?

O tempo está passando depressa demais, está devastando tudo. Por aqui onde tudo sempre foi tão difícil, agora está quase impossível.

Mas a arte sempre sobrevive, os livros estão se perdendo, mas a criação agora se faz muito mais fácil na internet, hoje podemos criar sem parar e o alcance é sem limites. Então não está tudo perdido, eu é que me perco nesse tempo de transição, sinto um pouco de saudades e ao mesmo tempo. não. Quando olho para trás, percebo quanto éramos primitivos, falando de orelhão, fumando cigarros, sem saber dos malefícios, lendo romances água com açúcar vendido nas bancas de jornal, pra falar a verdade, o passado não faz a menor falta!

Que venha o futuro com suas evoluções, que o passado seja apenas uma imagem velha desbotada num álbum de alguém.

Para quem viveu nos anos setenta, como eu, imaginar os anos dois mil era muito louco, parecia que tudo por aqui seria meio espacial, com carros voando, cidades futuristas, e até agora se olharmos bem a evolução humana não foi grande coisa, a educação continua capengando, a miséria continua ganhando, a desigualdade está ainda pior, a empatia, essa coitada está quase morrendo.

Sigamos, uma hora alguma coisa muda pra melho.