UM PARAIBANO DE CAICÓ

RAMALHO LEITE

UM PARAIBANO DE CAICÓ

O menino nasceu em Caicó, no vizinho estado do Rio Grande do Norte, pelos idos de 1923, em um dia 13, desafiando a data aziaga. Antes dele, morreram dois irmãos com o mesmo nome. Ele escapou depois de ultrapassar o primeiro ano de vida, sendo o quinto, de uma prole de nove nascidos da união de Francisquinho com Besinha, apelido de Isabel. O pai poderia ser encontrado com o sobrenome de Saldanha ou Sapateiro. Era um liberal, febre que costumava atingir os trabalhadores autônomos. Esse Saldanha tinha origem na Paraíba e fez de Francisquinho um voluntário contra os rebeldes de Zé Pereira que ameaçavam invadir Brejo do Cruz. Na resistência organizada pelos Saldanhas e Maias, lá estava Francisquinho ficando suas raízes paraibanas. Veio para a Capital e nunca mais voltou ao Caicó.

Seu filho, que se chamaria Joacil de Brito Pereira, escreveria muitos anos mais tarde que sua família fugira do ódio e a seca. “Não éramos retirantes, flagelados, pois tínhamos alguns haveres, mas éramos emigrantes fugidos de dois flagelos”. Em João Pessoa, já com essa denominação, passaram a morar em Jaguaribe, onde o pai estabeleceu-se com uma pequena loja de sapatos e miudezas, enquanto a mãe complementava a receita domestica com a fabricação de doces e salgadinhos que eram vendidos por um agregado que os acompanhara desde o Caicó. Educar essa filharada era a missão maior desses abnegados pais. “Que mãe extraordinária, era a minha”, diria o filho.

Pensava em participar da Segunda Grande Guerra e ser um Expedicionário nos campos da Itália. Não passou de Natal onde os americanos instalaram o Trampolim da Vitória. Um grave incidente no quartel o afastou do Exército tornando-o hóspede de Fernando de Noronha. Injuriado e agredido injustamente, enfermo e não reconhecido, revidou a agressão de um coronel perante o qual fora levado, por perseguição de um sargento. Tentou justificar-se e não foi ouvido. A partir de então, formou-se no seu caráter a firme decisão de enfrentar a injustiça e lutar pelos valores democráticos. Voltou à Paraíba são e salvo. Perdera a patente de cabo telefonista.

Desde o movimento estudantil na Faculdade de Direito do Recife, de cuja turma de 1950 foi orador e aluno destacado, aos comícios em regozijo pela queda da ditadura Vargas, Joacil esteve presente e com participação elogiada. Em evento na Lagoa, falando perante José Américo, recebeu dele o convite para ingressar na UDN e disputar o mandato de deputado estadual. Pretendia o grande paraibano incentivar novas lideranças. O clima do pós guerra recomendava isso, com o país querendo dar novos passos em direção à democracia. O sangue derramado no front pelos pracinhas brasileiros, reclamava novos tempos.

A advocacia lhe deu fama e, sua inteligência e capacidade de articulador político, lhe deram asas. O Parlamento estadual e o federal lhe reservaram cadeiras em vários mandatos. Como secretário de Estado de vários governos, demonstrou sua eficiência como executivo. Foi simpatizante do comunismo nos arroubos da mocidade mas, no golpe contra João Goulart, já podia ser identificado como o líder civil do movimento entre nós. Agitou a reação contra os militantes de esquerda, ajudou a cassar mandatos e, dentro em pouco passou a combater os excessos dos novos “donatários da capitania”. Diante da injustiça, era em Joacil Pereira que se encontrava arrego.

Quando a política passou a depender mais de dinheiro do que de vocação, abandonou-a. Mas continuou a lutar pelo seu estado e pela cidade que escolheu por moradia. “Nela expandi alegrias e chorei tristezas”. Outros fóruns reclamaram sua presença. A Academia de Letras, o Instituto Histórico e inúmeras outras entidades passaram a receber o concurso da sua capacidade criadora. Teve o meu voto como candidato ao Senado. Não perdi o voto. O Senado é que perdeu!

( PUBLICADO EM HOMENAGEM AO CENTENÁRIO DE JOACIL PEREIRA.)