Minha Vida com um Homem Mais Velho: Crônicas de uma Via Dolorosa.

Conheci o Pedro* em 2019, antes da pandemia. Eu estava com 28 anos, ele, com 54. Era professor universitário na UNICAMP. Eu tinha acabado de terminar um noivado de 10 anos com um homem que amei muito: o *Carlos. Até hoje, porém, sinto enorme arrependimento de ter deixado aquele rapaz que estava dentro da minha faixa etária, e que ainda acabara de arranjar um bom trabalho numa multinacional. Eu, por imaturidade, me achei péssima: pensei que ele iria me trocar por alguém de seu nível, dentro da empresa, em algum happy hour qualquer da vida. Como paciente bipolar, estava na fase depressiva... Enfim, preferi ir do que esperar que ele me deixasse. Foi uma maneira radical de lidar com a dor: emendar uma bebedeira na outra, ou seja, um relacionamento colado no outro.

O Pedro era galanteador, vinha de um casamento desfeito, e passou dois meses flertando (veja, estou usando o jargão dele :- ( ). No início era bom desabafar sobre os problemas do meu ex. Tudo era motivo para falar mal do coitado: desatento, grosseiro, egocêntrico, operário de firma, pobretão... Eu achei 1000 defeitos e os aumentei até o limite do inimaginável. Pedro achou ótimo: durante dois meses éramos amantes em intrigas constantes contra o Carlos... Bem, ele de nada sabia, e o que não se vê, não sente o coração! Um belo dia liguei e pedi para terminar o noivado; já o vinha tratando com desdém, apesar das insistências, também por recomendação do Pedro, que tinha caído de amores por mim... Armamos tudo, em nossa infidelidade agradável, para que ele se fosse e o caminho ficasse livre.

Lembro bem: Carlos mudou o tom já ao telefone; a amargura na respiração era visível, "Mas por que?"... Já era tarde. Eu simplesmente estava engolfada de tudo. E esse foi meu maior erro... O engolfamento, o tédio... Carlos já prometera mudar, e nada mudara. O engolfamento de tantas promessas era triste, porém a novidade era muito mais radiante.

Já o havia traído com este cavalheiro grisalho que se apresentava tão diferente. Uma novidade! Em pouco tempo estava morando com ele em seu apartamento espaçoso na Vila Madalena, em um condomínio privado belíssimo. Eram novos ares e pareciam tão frescos. Pedro tinha traumas do passado com sua ex-esposa, afinal, com 54 anos, era sorte que não tivesse uma família completa cheia de filhos para nos assombrar. Foi aí que começaram os problemas. A família materna numerosa me olhava torto, os meus distúrbios de comportamento agravaram-se muito, até porque Pedro insistira que eu cortasse os remédios, que seriam "gaslight" para me "tirar de louca" por parte do Carlos (de fato, sou bipolar e esse foi um erro gravíssimo). Apesar do seu amor, muitas situações difíceis ocorreram: tive de sair de eventos familiares aos prantos por ter sido destratada pelos parentes dele e os fantasmas do Carlos, muito amargurado, voltaram em forma de paranoia: será que ele vai se vingar? Vai falar mal de mim? Enquanto era eu quem vivia atirando cobras e lagartos!

O Carlos realmente passou a nutrir um ódio implacável e contido e, pra piorar, eu cometi erros bem complicados: postava muito do nosso relacionamento em Redes Sociais com o professor da UNICAMP no campus. Um Status! Isso acabou com meu ex-noivo. Em relacionamentos, os recém-apaixonados cometem o pior erro de todos: querem contar a todo mundo que estão juntos e isso abre comportas para vários falatórios e ressentimentos. Discrição, a chave do sucesso, infelizmente não é a norma.

Nos primeiros 3 meses, minha vida naquele apartamento espaçoso na Vila Madalena foi "maravilhosa": eu saia para fazer compras, frequentávamos os barzinhos descolados que Carlos detestava (porque também não tinha dinheiro), fazíamos vários programas juntos, tudo que ocorria, tinha de ser com ele. A cola era constante. Mas o fato é que eu nunca o amei. Eu nunca amei o Pedro. Eu amava a perspectiva de segurança que ele passava: casamento, noivado, uma casa.

Por ser muito mais velho, o seu corpo já não era o mesmo e as rugas eram muitas, apesar de se cuidar em academia, mas eu tentei não ser fútil, porém era um impacto em relação ao Carlos, meu namoro de juventude, que tinha a pele rígida e uma aparência bem melhor. Mas eu relevei: uma mulher deve saber o que é prioridade. Prioridade é segurança! Aparência é futilidade e imediatismo.

Começaram os ciúmes... Extremamente ciumento e possessivo, Pedro me isolou em seu mundinho na Vila Madalena. Eu já não vivia com minha mãe, que entristeceu-se, já não cuidava de minhas sobrinhas e sobrinho. Estava totalmente imersa nos hobbies, trejeitos, gírias e hábitos ruins e bons do Pedro. Não era mais Ana. Era uma marionete do mundo dele. Pedro me isolou do Carlos. Tentou apagar toda e qualquer lembrança que eu tivesse do namorado e noivo de minha juventude. Carlos nunca fizera isso. Ele acreditava que o passado não podia ser mudado. Era um fluxo de lembranças num cristal.

Meus surtos pioraram muito, mas Pedro sempre tinha um modo de me acalmar e me manipular. Eu comecei a pensar muito que tinha traído o Carlos, mas o Pedro sempre dizia que ele não prestava e tinha recebido o que mereceu. Os ciúmes de um homem mais velho temeroso de ficar só, eram imensos. Não conversava com meu ex por nada. De tão mal que falei dele, minha família passou a odiá-lo, marcando um dos objetivos do Pedro: me fazer, e a minha família, odiarem o Carlos como se fosse um Demônio.

Após 6 meses de um relacionamento onde eu já não existia e não tinha um décimo da liberdade de antes, Pedro vivia tomado de ciúmes e eu como uma Amélia encantada na Vila Madalena. Veio então a Pandemia de C-19. Pedro estava no grupo de risco, um homem com 54 anos e diabético... Infelizmente adoeceu em meados de julho de 2020. Essa doença traiçoeira, com tantas facetas, mostrou a pior: Pedro teve falência de 2/4 da capacidade dos pulmões e precisou ser colocado em respiração artificial no hospital Ignácio Proença, mas não foi entubado, pelo menos.

O pior veio após a alta: amargurado e com muitas sequelas, Pedro tornou-se dependente e eu passei a cuidar dele para tudo, pois não tinha fôlego para nada: almoço, café, janta, higiene. A condição de um enfermeira tomada de amor, era minha realidade. Eu já não tinha mais vida, pois sua família vivia achando que eu queria seus bens após sua morte, por mais que eu me doasse: aliás, doar-me era o que os fazia pensar assim! A irmã dele chegou a me dizer isso cara a cara: "Daqui, você só vai levar desaforo!". "Nós cuidamos do Pedro", "Vai embora".

Quando melhorou um pouco, foram tornando-se cada vez mais comuns os maus hábitos dele: beber, fumar e outras coisas que não convém falar e das quais participei... Em março de 2021, seu coraçãozinho não suportou e ele faleceu subitamente. Foi muito estranho e triste, porque já estava melhor, mas as sequelas da Covid danificaram suas válvulas cardíacas e ele morreu enquanto dormia. Eu caí em profundo luto, mas sua família sequer deixou-me ir ao velório: achavam que estava com advogado pleiteando uma herança.

Saindo da Vila Madalena para a casa da minha mãe, em Pinheiros, após o luto, eu comecei a sentir um vazio: "eu tinha feito o que podia por ele", estava em paz. E os ciúmes e possessividades tinham-se ido embora, enquanto redescobria uma carcaça vazia de tudo: um corpo inerte cuja existência era preenchida por ele e no qual só restava um saco de pele. Era hora de ser eu mesma e nada no mundo conseguia me consolar. Saí da vida do Pedro sem amor, nada. Somente o ódio dos seus familiares. Me perdi simulando sua vida boemia de cantorias nos bares da Vila Madalena, que parecia fenomenal no começo, e suas aulas como professor universitário eloquente, que eram excitantes de se assistir como aluna convidada.

Na casa de mamãe, algumas semanas de após o luto, pensei em ligar para o Carlos, mas como ele me receberia? Ele teria todo o direito de me odiar. Minha mãe o odiava, depois de tanta lavagem cerebral do Pedro e minha. Mas eu engoli a seco e fiz. O Carlos descarregou tudo, coisas que eu nem imaginava que ele sabia. Dizem que o bom mentiroso só engana a si mesmo e eu só enganava a mim. Eu chorei horrores. Alguns dias depois, liguei novamente, insisti e consegui marcar um encontro com ele no Guarita Bar.

Quando ele me viu, o mundo ruiu, começou a chorar muito. Disse que tinha tido outras mulheres e nenhuma preenchia de longe o vazio que eu havia deixado. Choramos tanto que os demais ao redor do barzinho ficaram de olho, curiosos. Era início de junho e a garoa caía inclemente em São Paulo. Eu senti tanta culpa, muita culpa mesmo... Foi muito difícil nosso novo começo, pois não existe recomeço e sim um novo início. Recomeçar é repetir os erros. Mas diferente do Pedro, Carlos construiu uma vida comigo naquele segundo semestre de 2021. Hoje eu tenho minha liberdade, personalidade e o meu amor da juventude voltou. Eu jamais teria sido feliz cercada de tanto ódio da família do Pedro. Tive que desfazer todo o ódio que disseminei contra o Carlos, mas finalmente minha mãe o aceitou de volta.

E esse é o meu relato, tendo vivido com um homem bem mais velho... Pode não ser igual para todas: Há (poucas) mulheres felizes, sobretudo no começo, a grande parte vive uma ilusão de conforto. Mas alguns elementos existem e sei que a infidelidade inicial para mandar o Carlos embora, uma traição tão profunda, foi a maior responsável pelo fracasso do meu relacionamento. Os familiares do Pedro também foram meus carrascos executores. Eu nunca levei um centavo daquele professor universitário, mas até hoje guardam essa visão de mim. Infelizmente.

*Os nomes foram trocados para preservar as pessoas envolvidas.

Ana Bela Altair
Enviado por Ana Bela Altair em 14/01/2023
Reeditado em 15/01/2023
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