Concurso de Miss

O ano era 1984 e estava com 23 anos. Os concursos de misses já não  eram tão glamourosos como havia sido  no passado.

 

Mas  ser "miss" ainda era o sonho de muitas moças e tinha seus encantos.

 

Eu era formada em Nutrição e trabalhava, mas buscava algo a mais. Só não sabia o quê.

 

Lembro que na adolescência, queria ser tudo:

Aeromoça , médica, violinista, bailarina, pintora, modelo, trabalhar em escritório, trabalhar no caixa das lojas Americanas.

 

Era tanta aspiração que me perdia. E no fim me atrapalhei nas minhas escolhas.

 

Eis que, casualmente, ouvi no rádio que estavam recrutando moças para serem Misses.

 

Isso mesmo: Miss. Nem sabia que podia se candidatar pra isso.

 

Achei que somente moças escolhidas a dedo, por governantes da cidade, podiam representar a cidade

 

Anotei o endereço, tomei um banho demorado, escovei os cabelos.

 

Naquela época não tinha essa de ser loira com luzes, reflexos.

 

O único recurso para quem não nasceu loira e queria se tornar, era “oxigenar” os cabelos.

 

Mas daí ficava aquele cabelo sem vida, meio amarelo esbranquiçado.

 

Então ser naturalmente loira era algo que chamava a atenção.  E era alta e magra.

 

O problema é que eu tinha os seios grandes. Grandes mesmo.

 

Na época o bonito era ser “tábua”. Ter bem pouquinho. Mas, fazer o quê. Tentava  “achatar”, usava soutien apertado. Disfarçava um pouco.

 

Então coloquei salto, uma roupa elegante, maquiagem leve e fui para o endereço indicado.

 

Falei para a secretária, meio sem jeito, que tinha vindo para me candidatar a miss.

 

Ela me olhou de cima a baixo e encaminhou para o diretor:

 

- Sr Danilo D’Ávila, um empresário na área de eventos e concursos de beleza.

 

Não demorou nem 3 minutos de conversa e eu saí como candidata a miss de uma cidade do Paraná, que por razões que desconheço, não tinha escolhido sua candidata em tempo.

Assinei uns papéis e tudo certo!

 

Saí de lá radiante. Mas meio envergonhada.

 

Como iria falar para as pessoas que tinha me oferecido pra ser miss?

 

Não fazia sentido. Resolvi não contar pra quase ninguém. Nem pra família.

 

Aos poucos que comentei ao longo dos dias, disse algo meio vago.

 

Tipo: - Me chamaram pra ser miss.

- Quem chamou?

- Onde que te encontraram?

 

Tratava logo de desviar a conversa e mudava de assunto

 

Falar que eu tinha ido com as minhas próprias pernas em um escritório me candidatar. Nem pensar. 

 

O concurso seria em poucos dias e a primeira etapa seria em Paranaguá.

 

Resolvi ligar para o prefeito da cidade que iria representar e perguntar se ele poderia pagar o aluguel de um vestido de gala para o desfile.

Aluguei na Veridiane.

 

Tudo certo! Um acessor me atendeu e acertou o valor.

 

A parte mais difícil foi aprender a desfilar. Com aquele salto 12 ou 15 da sandália. E ainda fazer a voltinha.

 

Tinha um namorado na época que me ajudou.

 

Achou engraçado essa história de ser miss e resolveu dar umas dicas.

 

Com uma enciclopédia na cabeça e os saltos bem altos, ficava desfilando na sala.

 

Lembro que na hora da voltinha, me embananava e ele ia na frente me mostrando como colocar o pé direito na frente, rodopiar o corpo 180 graus e sair novamente com o pé direito.

 

Tudo isso sem olhar pro chão, encolhendo a barriga, empinando o bumbum, costas retas, sorrindo e sem cair na gargalhada.

 

Com certeza ele levava mais jeito do que eu para a coisa.

 

Após dias de ensaio já estava melhorzinha. Ou talvez, menos ruim.

 

Mas minha falta de auto confiança para entrar na passarela era paralisante. Tinha pânico só de pensar em ter que desfilar. E essa sensação só piorava. Pensei até em desistir. Abandonar tudo.
 

Mas a essa altura eu estava enrolada com o compromisso  até o pescoço.

 

No dia anterior ao concurso, eu e todas as misses representantes das cidades do Paraná nos encontramos e saímos em um ônibus fretado.  
 

Ao chegar no hotel, em Paranaguá, deixamos as malas e visitamos pontos turísticos.

 

À noite jantamos em um restaurante, com muitas fotos e várias pessoas curiosas nos observando.

 

Me senti uma celebridade.

 

No dia seguinte foram horas de arrumação, bobes, escovas, maquiagem e o maiô Catalina preto com o salto alto.

 

Tudo isso até era fácil.

 

Mais difícil para  mim era a passarela.

Ficava o tempo todo com frio na barriga pensando em errar a voltinha.

 

E se tivesse entrevista?

Meu medo também era também das perguntas. E se eu não soubesse responder?

 

 

Os apresentadores eram a Susi Rêgo e o Marquinhos Moura. Famosos na época.

 

Ela tinha sido Miss Brasil há pouco tempo. Era linda e simpática.

 

Auditório cheio. Meu irmão e minha mãe foram até lá assistir nessa primeira etapa, em Paranaguá.

 

Passou na Tv e não contei para amigas e nem parentes.

 

Teve os que ficaram sabendo depois, minha avó, por exemplo, porque uma tia assistiu na TV e contou pra ela.

 

Classificaram 12 moças para a segunda seleção, que seria em Campo Mourão, em pouco menos de um mês.

 

Fiquei entre as 12. Acho que porque não houve entrevista, (por sorte), e não tropecei nem caí lá de cima.

 

Confesso que estava tão apavorada que na hora H fiquei meio anestesiada. Saí andando e fui. Só parei quando voltei para o meu lugar no palco

 

Para a segunda etapa, segui ainda desacreditada. Não conseguia superar aquele pavor da passarela.

 

Se tivesse investido em desenvoltura, postura, técnicas de desfile, talvez tivesse mais chances. Mas sempre fui mais de brincadeira de guri, correr, trepar, andar de bicicleta.

 

Não ganhei nem classifiquei.

 

Acho que os juízes perceberam que para miss faltava muito.

 

O mais perto que cheguei é ser chamada de Miss Batavo. Alguém gritou alto e eu escutei.

 

Talvez por ser representante de Castro que é um municipio conhecido como grande produtor de  leite no nosso estado.

 

Mas na minha cabeça, acho que foi por outra razão:

 

Viram uma certa semelhança com aquelas vacas holandesas que são ordenhadas diariamente. 

Karin Romanó
Enviado por Karin Romanó em 28/08/2022
Reeditado em 31/08/2022
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