CICLOS DE MARIA
Os nomes que eventualmente aparecerem nessa história serão fictícios porque não quero expor ninguém e evito um futuro processo.😉
Ciclo II
(De dois a cinco anos)
Com dois anos a pequena Maria não era pequena...era uma criança gorda,que não conseguia andar direito mas mesmo assim dizem que era calma,não mexia nas coisas que não devia mexer.
Não era traquinas e nem rabujenta,era muito obediente...uma criança tranquila e muito tímida.
Dizem que não falava muito,estava sempre quieta observando a vida que a rodeava e ainda diziam que era bem inteligente.
A pequena menina...que não era pequena via anjos e conversava com eles,sua imaginação era fértil,ela tinha certeza que aqueles anjos eram reais e eram seus amigos.
Maria era a caçula...mimada pela avó materna que morou muito tempo com a família e que também era Maria.
Seu irmão Mario tem sete anos a mais que ela,seu irmão Josué seis anos a mais e Lidia três anos e meio.
Seu pai trabalhava nas pedreiras cortando pedras e sua mãe era costureira e trabalhava em casa.
Nessa época Maria era chamada de Dida...apelido que a acompanhou até os seis anos e meio quando se transformou em Rizo na escola.
Na memória da menina seus irmãos sempre a trataram bem,com cuidado pra que ela nunca se machucasse...na verdade ela era uma manteiga derretida que chorava a toa.
Quando abria a boca no mundo não tinha o que a fizesse calar.
Seus pais buscando uma vida melhor sairam de Pernambuco e vieram pra São Paulo e fixaram moradia no alto de uma serra numa tapera de pau a pique.
Era a serra pra lá da Pedra do Elefante,no bairro da Quarta Divisão em uma pequena cidade chamada Ribeirão Pires.
A cama onde Dida,Lídia seu pai e sua mãe dormiam era feita de varas e o colchão era cheio de capim.
Vida difícil de retirantes...vida sofrida.
Na serra era comum encontrar cobras,dizem que também existiam lobo guará e onça...não posso dizer porque não vi e não lembro.
Seus pais sofreram nessa serra mais de um ano,mas com ajuda dos tios Anacleto e Marília seus pais conseguiram uma chácara para mudar.
A mudança foi pra melhor.
Nessa chácara onde eram caseiros a vida foi melhorando para os pais de Dida,seu pai Frederico continuava cortando pedras e sua mãe D.Odete conseguiu comprar uma máquina de de costura e arrumou um serviço que podia trabalhar em casa.
Era perfeito...a vida ia melhorar.
Os patrões da costura eram D.Violete e S.Robério eram muito bons e compreensivos,D.Odete costurava com maestria jaquetas...
Jaquetas pesadas,forradas...bonitas.
Dida começa com mais de três anos a ser gente que pensa e começa a guardar suas primeiras lembranças.
Os donos da chácara onde moram ,S. Gui e D. Edilia eram muito humanos e logo se encantaram com aquela garotinha gorda do pé torto e resolveram ajudar.
Tiraram um molde do pé da pequena menina que não era pequena e financiaram uma consulta a distância com ortopedista.
Nesse tempo tudo era muito difícil...
Conseguir um médico era difícil e as condiçoes financeiras não favoreciam.
S.Gui e D.Edilia se comprometeram a bancar o tratamento da menina,trouxeram sua primeira botinha ortopédica e aí começaram as dores dela.
Seu pezinho esquerdo seria forçado a virar pra frente por intermédio de ferros e palmilhas também de ferro em sua botinha.
Como Dida sofria...como doía...
Nesse tempo ficou marcado em seu coração a presença dos donos da chácara que toda vez que vinham chamavam Dida pra pegar balinhas no porta treco do carro(era na verdade um tipo de bolso na porta do veículo).
As balinhas de caramelo com um creminho dentro ela guarda na memória até hoje.
Dida lembra nessa mesma época a alegria de receber sua avó materna em casa...sua avó tinha ficado em Pernambuco quando vieram morar em São Paulo na serra.
Nesse momento,com pouco mais de quatro anos Dida deixa de ser nordestina raiz...por mais que seus pais conservem as tradições da sua terra,Dida começa aos poucos a se identificar com o jeito paulista de ser,com o jeito paulista de comer...a menina sempre foi chata pra comer e ao longo dos dias ia ficando mais chata.
Dida inicia sua vida como humana que pensa e começa a dar sinais que ali no futuro vai ter uma personalidade "forte".
Apesar de ser manca e gorda Dida é uma garota extremamente feliz.
Ela conviveu com muitos cães que se perderam na memória...mais ou menos dessa época lembra de Pluto,Veludo e Amigo.
Amigo não tinha nada de amigo,apenas seu irmão Josué podia acaricia-lo.
Amigo era super estressado e vivia abocanhando ouriços.
Um pouco antes de completar cinco anos seu irmão Josué começou a ensinar Dida a contar e escrever números e letras...começou aí um problema...
Sua mãe tinha com a máquina de costura Vigorelli novinha,com uma mesa novinha ...
Dida pegou uma tesoura(sem ninguém ver) e entalhou na mesa da máquina a letra D perfeita...linda...era o D de Dida.
Quando sua mãe viu quase teve um treco...sua mãe sempre foi muito nervosa.
Esbravejou,gritou prometeu bater em quem estragou a mesa da máquina.
Sua irmã Lídia a dedurou:
Foi Dida!
"A letra era bonita,perfeita...só quem sabia escrever podia ter feito aquilo"...palavras da sua mãe...
A única que não podia ter estragado a máquina era Dida já que sua mãe não tinha percebido ainda que Dida já sabia escrever os números e o alfabeto inteiro.
Dida nesse momento calou e essa deve ter sido essa sua pior travessura.
A menina pequena que não era pequena e nem burra ficou magoada porque sua mãe não acreditava que ela já sabia escrever.
Dida tinha cinco anos e sabia que não adiantava dizer a verdade...
Dida era uma criança gorda e manca...invisível...chata!
Dida não era capaz de fazer nada,Dida era ninguém...
Talvez esse tenha sido o primeiro momento em que a pequena e doce menina sentiu o peso de um sentimento negativo.
Dida foi pro quarto e chorou...era uma manteiga derretida mimada...
Chorou até adormecer...
O maior problema é que ela era uma criança gorda,manca,amável mas que ninguém via e nem ouvia...
Quando Dida chorava ela imaginava anjos...e conversava com eles.
Os Anjos a ouviam , viam e entendiam.
Foi primeira vez que Dida se sentiu muito invisível...
Mas isso não ia ficar assim...