Outra do bruxo
Os dados precisos se perderam no meio das minhas anotações, e eu não consegui encontrar a página do livro na qual o fato é narrado. Mas, ainda sobre a leitura de "Machado de Assis -- Estudo crítico e biográfico", a autora, Lúcia Miguel Pereira, diz que, em certo momento da vida, quando o escritor já gozava de alguma fama entre os poucos letrados da Côrte, ele protagonizou uma cena burlesca, mas que revelara muito da sua personalidade: enquanto revisor de provas para um certo amigo editor -- esqueci o nome do homem, malditas anotações! --, Machado de Assis, ao perceber que deixara passar um erro, ajoelhou-se perante o editor, implorando para que a publicação fosse recolhida imediatamente! Ele chegou até mesmo a dizer que estava disposto a tirar do próprio bolso o montante referente às edições já vendidas. O editor ficou sem palavras e, talvez por um breve momento, sem reações também. Pudera. Machado, que sempre fora um tímido de pantufas, estava ali, de joelhos, implorando para ter a chance de corrigir um erro de Português. O editor, tocado pela sincera demonstração de amor do escritor pelo seu ofício, publicou uma errata. Esse episódio ilustra de modo perfeito o quanto Machado de Assis amava o que fazia. Só mesmo um escritor que amasse o seu ofício se colocaria assim, de joelhos, para implorar a oportunidade de se retratar com o leitor por um simples e inocente erro tipográfico -- de "digitação". Esta atitude, em outros escritores, talvez parecesse mera afetação, mas não com Machado. Sua obra, sobretudo o que ele produziu depois de 1879, depois de Brás Cubas, é um conjunto de provas definitivas que atestam seu talento e amor pelas letras.