O susto do velho bruxo
A sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras fora realizada no dia 20 de junho de 1897, Machado de Assis, que passou a vida alimentando o sonho de ver as letras nacionais assim congregadas em uma instituição promotora, estava realizado. Contudo, a vida é uma velha avarenta: quando dá uma alegria, cobra logo com usura os juros da dor. Lucia Miguel Pereira diz que, em novembro daquele mesmo ano, as diretorias-gerais de Viação e Obras Públicas foram reunidas em uma só. Machado, que sempre fora exemplar servidor público, testemunhou com frieza -- e talvez com tristeza -- a instauração da República. No ano do golpe, 1889, fora nomeado pela Princesa Isabel diretor da Diretoria-Geral de Comércio, cargo que mudou de nome com a chegada dos republicanos ao poder. O novo governo, já esbanjando suas convicções positivistas, julgou que o cargo deveria ser exercido por um técnico, por isso, considerou o velho Machado adido, isto é, incapaz. Seu amigo, Mário de Alencar, exprimiu bem o espírito da época: "A lei era um embaraço; mas as leis fazem-na os homens para as ocasiões, quase sempre com pretexto de servirem aos outros, e com o fim secreto do proveito próprio. E assim foi que com a lei tiraram-lhe o que a lei lhe garantia!". Mas, o escritor não permaneceu injustiçado por muito tempo. Em 1902, Rodrigues Alves assumiu a presidência da República e, na chefia do Ministério da Viação, estava Lauro Müller. Um dos primeiros atos do novo governo foi chamar o bruxo do Cosme Velho de volta à atividade de diretor-geral de Contabilidade do Ministério da Viação, cargo que exerceria até morrer. Foi um susto pelo qual passou o escritor nessa última fase de sua vida.