Giordano Bruno - Uma vida marcada pela intolerância

(Francisco de Assis Góis)

 

...Alguns homens parecendo-se à toupeira de olhos baços, que, no momento que sentem em si o ar aberto dos céus, corre a meter-se de novo no buraco cavado na terra, desejam permanecer nas trevas nativas. Outros; como aqueles pássaros noturnos, devido à fraqueza dos olhos, retiram-se para os seus antros sombrios assim que vêem na claridade do oriente as bandas carmesins, embaixadoras do sol. Todas aquelas criaturas que não contemplarão a luz do céu, destinadas a habitar os escuros círculos da prisão de Plutão, abrem as asas e giram para longe em vôo rápido, em direção aos seus retiros. Mas os que nascem para ver o sol, repletos de agradecimento, quando chegam ao fim da noite aborrecível, se dispõem a receber no próprio centro do globo de cristal dos seus olhos os raios do glorioso sol, longamente esperados, e, com desacostumada alegria nos seus corações, levantam as suas mãos e vozes para adorar o oriente...

Giordano Bruno

1548 - 1600

 

Filho de Giovanni Bruno e Fraulissa Savolino, Filippo Giordano Bruno nasceu em 1548. Natural de Nola, pequena cidade junto ao Vesúvio, orgulhava-se de ser conhecido como “o nolano”, nascido sob o céu cordial de Nápoles e jamais perdeu os traços de sua origem napolitana.

A exemplo de Paracelso e Agrippa antes dele, podemos considera-lo o próprio arquétipo do mago do renascimento.

Entrou para a ordem dominicana em 1563, tornando-se interno do convento de Nápoles, mesmo lugar onde está sepultado Tomás de Aquino. Aos 17 anos, em 1565, recebe o hábito, em 1572 é ordenado sacerdote e conclui seus estudos teológicos em 1575. Lia sempre que podia todos e quaisquer comentários proibidos e discutia perigosamente, para sua época, as sutilezas teológicas e não raro aborrecia-se com a ignorância dos colegas de claustro.

Suas tendências heterodoxas acabaram provocando censuras e chamando a atenção da santa Inquisição em Nápoles. Em 1576, ao ser acusado de heresia, abandonou o hábito dominicano e fugiu. A partir daí, iniciou uma vida errante através da Europa.

Perambulou pelo norte da Itália por mais de um ano e em 1578, viajou para a Suíça. Na Genebra de Calvino - da qual não gostou e tampouco gostaram dele os calvinistas - ganhava a vida fazendo revisão de textos.

Talvez tenha abraçado o calvinismo, apenas por conveniência por se achar em um país calvinista, haja vista que logo publicou um escrito em que criticava um professor calvinista. Ele discordava da tese calvinista da justificação por meio da fé e não das obras, o que significa desvalorização e desprezo de toda caridade, misericórdia e justiça. A reação dos calvinistas foi dura. Bruno foi preso e excomungado, e para deixar a cidade não teve outra alternativa a não ser retratar-se.

Vai para a França, e, em Toulouse ficou dois anos (1579-1581), onde conseguiu nomeação para uma cátedra de filosofia. Lá tentou, sem sucesso, ser absolvido pela Igreja Católica. A esta altura é um homem sem pátria e sem Igreja.

Em suas primeiras leituras sobre a teoria luliana, quando professor na universidade de Toulouse, Bruno escreve o livro Clavis Magna ("A grande chave") sobre o assunto. De Toulouse foi para Paris, em 1581 onde começou a dar aulas de filosofia. Na época era comum eruditos vagarem de um lado a outro buscando alunos e protetores abastardos. Bruno fazia contactos facilmente e, com o fogo de suas ideias interessava todas as mentes abertas que encontrava.

Em Paris encontrou ambiente favorável para trabalhar e lecionar. Sua reputação chegou ao conhecimento de Henrique III, que ficou curioso para conhecer sua filosofia e descobrir se a arte de Bruno era de um mágico ou de um bruxo. Ele gozava da reputação de um mágico que podia dotar as pessoas de uma grande retenção de memória. No entanto, demonstrou ao rei que seu sistema era fundamentado em conhecimento organizado. Ele acabou encontrando em Henrique III um verdadeiro protetor.

A corte francesa era dominada por uma facção de católicos tolerantes e a posição religiosa de Bruno afinava-se com esse grupo, motivo pelo qual foi bem aceito na corte recebendo a proteção de Henrique III. O rei concede-lhe uma renda especial, nomeando-o um de seus "Leitores reais". Foi nessa época que um de seus primeiros trabalhos foi publicado, o De Umbris Idearum, ("A sombra das idéias") logo seguido por Ars Memoriae ("Arte da memória"). Nestes livros ele sustentava que as idéias eram somente sombras da verdade.

No mesmo ano um terceiro livro surgiu: De architetura et commento artis Lulli ("Sobre a Arte de Lúlio e comentário"). Lúlio havia tentado provar os dogmas da Igreja por meio da razão. Bruno rechaça a ideia, argumentando que o Cristianismo é aceito somente pela fé e nunca pela razão e ainda; que o cristianismo radical contraria a filosofia e outras religiões e que a revelação não possui nenhuma sustentação científica.

No seu quarto trabalho Bruno escolhe a feiticeira de Homero, Circi, que mudava homens em bestas e faz Circi discutir com sua criada o tipo de erro que cada besta representa. O livro Cantus Circaeus (O Canto da Feiticeira Circe) mostra Bruno trabalhando com o princípio da associação de ideias, e continuamente questionando o valor dos métodos de conhecimentos tradicionais.

Em 1582, aos 34 anos, escreve uma comédia em italiano, Il Candelajo. O protagonista é um fabricante de velas que sai anunciando seus produtos com gritos e estardalhaço: "... as velas que fiz nascer, as quais iluminarão certas sombras de idéias... O tempo tudo dá e tudo toma, tudo muda, mas nada morre... Com esta filosofia meu espírito cresce, minha mente se expande. Por isso, apesar de quanto obscura a noite possa ser, eu espero o nascer do dia... Alegrem-se, portanto, e mantenham união, se puderem, e retribuam o amor com amor." Nessa peça ele faz uma representação da sociedade napolitana contemporânea, protestando contra a corrupção social e moral da época.

Seja por não poder mais sustentar sua popularidade, ou porque a cada dia se tornava mais aparente a ameaça de iminente guerra civil; em abril de 1583, mesmo com a cordial acolhida que lhe fora dispensada em Paris pelo rei e pelos espíritos desvinculados do aristotelismo, Bruno mudar-se para Londres com uma carta de apresentação de Henrique III para seu embaixador para as ilhas britânicas, Michel de Castelnau.

A rainha Isabel, filha de Henrique VIII e Ana Bolena, nasceu em 1533. Terceira na linha de sucessão de seu pai Henrique VIII, ela reinou de 1558 a 1603, depois de seu irmão doente Eduardo VI e depois de sua irmã mais velha Maria I, que foi casada com Felipe II de Espanha. Sob seu reinado a Inglaterra vivia um Renascimento tardio e, é provável que o brilho do período isabelino tenha atraído Giordano Bruno a este país.

No verão de 1583, Bruno pronunciou em Oxford uma série de conferencias expondo a teoria de Copérnico onde defendia a realidade do movimento da terra. Como as demais universidades europeias da época, Oxford cultivava a reverência escolástica pela autoridade de Aristóteles e Bruno pregava ser ilógico acreditar no que Aristóteles afirmara, quando a simples observação da natureza demonstrava o contrário. Com a recepção hostil de suas ideias pelos professores oxfordianos, ele volta para Londres como hospede do embaixador francês, Castelnau.

Frequentando a corte tornou-se ligado a figuras influentes tais como Sir Philip Sidney e Robert Dudley, o duque de Leicester. Em 1584 Fulke Greville, um membro do círculo de Sidney, convida-o a discutir sua teoria com alguns doutores de Oxford o que resulta em discórdias. Ao final do século XVI, ninguém ensinava o universo segundo Copérnico, exceto Giordano Bruno. Galileu apresentou suas provas no início do século seguinte, mas é obrigado a abjurar a teoria. Galileu nunca encontrou Bruno pessoalmente e não o menciona em seus trabalhos, provavelmente pelo fato de se citar um herege condenado, em suas obras seria suicídio.

Começa a escrever o que constitui a primeira exposição sistemática de sua filosofia: Seus seis diálogos italianos, sendo três cosmológicos - sobre a teoria do universo - e três sobre moral.

Na Cena de Le Ceneri (1584: "A Ceia da Quarta Feira de Cinzas"), com local simulado em Paris e Veneza, ele, além de reafirmar a realidade da teoria heliocêntrica, ainda sugere que o universo é infinito, constituído de inumeráveis mundos substancialmente similares ao do sistema solar. É a história de um jantar de que participam convivas ingleses, e nele Bruno difunde a teoria de Copérnico, a qual ainda era objeto de riso e, de descrença por não coincidir com os ensinamentos de Aristóteles.

Ao contrário da teoria Aristotélica, Bruno afirmava que não havia posição absoluta no espaço, mas que a posição de um corpo "era relativa à dos outros corpos. “Ocorre, por todo o universo, mudanças relativas de posição, e o observador está sempre no centro das coisas". Ele vai além de Copérnico: O movimento dos astros não seria esférico como este havia apresentado. Bruno suprime a esfera das estrelas fixas conservada por Copérnico e alarga o universo ao infinito. O mundo não tem limites nem referência absoluta e, portanto, as várias imagens dele são relativas: qualquer ponto é centro e periferia. Infinidade e relatividade.

Os astros giram também sobre seu próprio eixo para perpetuar em si a vida, para expor sucessivamente todas as suas partes ao sol, como seres que tem vida - animismo. Afirmações ousadas em uma época em que o pensamento teológico filosófico medieval era predominante, e tinha como uma de suas peças básicas a astronomia de Ptolomeu, que afirmava ser a Terra, um ponto imóvel privilegiado e centro do movimento circular de todos os corpos celestes, teoria consistente tanto com os textos bíblicos, quanto com o pensamento racional aristotélico que a escolástica integrava num todo unitário.

Motivados por deduções tipicamente aristotélicas, os mestres escolásticos afirmavam que, se a terra se movesse, as nuvens seriam deixadas para trás, as folhas mortas voariam sempre no mesmo sentido; uma pedra solta do alto de uma torre se afastaria do pé da torre. Juntava-se a esse pensamento a concepção de que, excetuando-se o movimento circular uniforme, impresso por Deus aos corpos celestes, todos os demais movimentos são imperfeições, constituindo transgressões ou reparações de transgressões da ordem divina. A refutação de Bruno a esse argumento, em "O Banquete das Cinzas", é que a terra e tudo que nela se encontra formam um sistema. Os objetos de um navio se movem com ele. Do mesmo modo, as nuvens, os pássaros, as pedras, são levados com a terra. No mesmo diálogo ele se antecipa ao seu colega italiano o astrônomo Galileu Galilei sustentando que a Bíblia devia ser seguida pelos seus ensinamentos morais e não por suas implicações astronômicas. Ele também criticou fortemente os costumes da sociedade inglesa e o pedantismo dos doutores de Oxford.

Em De la causa, principio e uno (também de 1584) ele elabora a teoria física na qual se baseava sua concepção do universo: "Forma" e "matéria" estão intimamente unidas e constituem o "Uno". Assim o tradicional dualismo dos físicos aristotélicos foi reduzido por ele a uma concepção monística do mundo, implicando a unidade básica de todas as substâncias e a coincidência dos opostos na unidade infinita do Ser. Bruno era animista. Em sua filosofia o universo é um sistema em permanente transformação, um todo no qual nada permanece imóvel. Não apenas um movimento mecânico e passivo, segundo as leis da física, mas um movimento anímico que o faz transformar-se permanentemente. Tudo que existe estaria reduzido a uma única essência material provida de animação espiritual.

Seu universo não é finito e limitado como o da concepção medieval, mas infinito e ilimitado. O universo não é apenas o nosso mundo, mas um sistema de mundos infinitos que nascem e decaem movidos pela divina força universal. Existiriam possivelmente inumeráveis mundos habitados. - Sendo Deus, criador do universo, necessariamente um ser infinito; seria contraditório que a uma causa infinita não correspondesse um efeito infinito. O universo, portanto, como efeito de uma causa infinita tem que ser também infinito.

No De l infinito universo e mondi ("Sobre o Infinito, Universo e Mundos") ele desenvolve sua teoria cosmológica criticando sistematicamente os físicos aristotélicos. Argumenta que o universo é infinito e contém um número infinito de mundos, e que estes seriam todos habitados por seres inteligentes. Ele também formula sua visão averroísta da relação entre filosofia e religião, de acordo com a qual existe a religião dos ignorantes e a religião dos doutos. A primeira é um meio para instruir e governar o povo ignorante. É um conjunto de superstições contrárias à razão e a natureza, "útil para governar os povos incultos", que só é válido enquanto a humanidade não atingir um grau superior de evolução. A religião dos doutos ou dos teólogos, que o processo histórico enriquece, é esclarecida, na qual se integra a filosofia como a disciplina dos eleitos que estão aptos a se controlar e governar os outros.

O Espaccio de la bestia trionfante ("Expulsão da besta triunfante") o primeiro diálogo da sua trilogia moral, é uma sátira sobre os vícios e superstições de sua época, e ao o pedantismo que encontra na cultura Católica e Protestante. Nele faz dura crítica da ética Cristã - particularmente o princípio calvinista da salvação exclusivamente pela fé, à qual Bruno opunha uma visão exaltada da dignidade de todas as atividades humanas.

A Cabala del cavallo Pegaseo ("Cabala do cavalo Pégaso"), de 1585, e seu anexo "O asno cilênico", é semelhante aos anteriores, porém mais pessimista, incluindo a discussão sobre a relação da alma humana e a alma universal, concluindo com a negação da individualidade absoluta do primeiro. Nele ele faz da religião uma sátira amarga, apresentando-a como "santa ignorância" que condena a curiosidade ímpia da pesquisa, preferindo fechar os olhos, reprovar qualquer pensamento humano e renegar todo sentimento natural, acusando-a de renúncia e proibição do livre exercício do pensamento e da investigação filosófica. É uma discussão irônica das pretensões da superstição. O "asno", diz Bruno, pode ser encontrado em toda parte, não apenas na Igreja, mas das cortes de justiça até as universidades.

No De gli eroici furori ("Dos heróicos furores"), também de 1585, Bruno, usando a simbologia neoplatônica, trata da obtenção da união com o infinito Uno pela alma humana e exorta o homem à conquista da virtude e da verdade.

No entanto, Suas críticas atraíram a antipatia dos mestres ingleses ainda fiéis à teoria de Aristóteles. Bruno se vê, então, obrigado a acompanhar Castelnau de volta quando este é chamado pelo Rei à França em 1585. No caminho ambos são roubados de tudo que possuíam.

Em Paris encontra uma atmosfera política mudada. Henrique III havia revogado o edito de pacificação com os protestantes, e o Rei de Navarra havia sido excomungado. Ao invés de adotar um comportamento cauteloso, Bruno entrou em polêmica com um protegido do partido católico, o matemático Fabrizio Mordente, a quem ridicularizou em quatro Dialogi.

Em maio de 1586 ele ousou atacar Aristóteles publicamente através de seu Cento e vinti articuli de natura et mundo adversos Peripatetiso ("120 artigos sobre a natureza e o mundo contra os peripatéticos") proclamadas em junho por seu discípulo João Hennequin em desafio aos doutores da Universidade de Paris. O desafio audaz provoca um tumulto grande e violento. Os católicos moderados com os quais, outrora, mantinha boas relações, o desautorizaram. Ameaçado de graves perigos, se vê obrigado a sair logo da França.

Muda-se para Praga - Reino da Boêmia, hoje Checoslováquia onde freqüenta a corte do rei Rodolfo II, filho de Maximilian II e Maria, filha de Carlos V, Imperador do Sacro Império de 1576 a 1612. Encontra um ambiente propício a suas pesquisas matemáticas e astronômicas. Mas Praga não lhe convém muito. De lá Bruno vai para a Alemanha, onde perambulando de uma cidade universitária para outra, consegue ser professor em Wittenberg (1588).

Ensinou e publicou uma variedade de trabalhos menores, incluindo o Articuli centum et sexatinta ("160 Artigos") contra os filósofos e matemáticos contemporâneos, no qual ele expôs sua concepção de religião - uma teoria da coexistência pacífica de todas as religiões baseada no conhecimento mútuo e liberdade recíproca de discussão. É uma crítica contra a intolerância e o sectarismo religioso, que diz contrariar a lei divina do amor. Faz uma reivindicação da dignidade própria da liberdade espiritual humana. Sem liberdade não haveria essa dignidade. Muda-se para Helmstadt, onde o Duque Henrique Júlio dispensa-lhe uma acolhida favorável e cordial.

Escreve a que considera sua maior obra: De imaginum signorum et idearum compositione ("Sobre a Associação de imagens, os signos e as idéias") sobre mnemônica. Mas os calvinistas não toleram sua doutrina e em Janeiro de 1589 é excomungado pela Igreja Luterana local. Permanece em Helmstadt até a primavera, completando trabalhos em mágica natural e matemática – que só foi publicado postumamente - e trabalho em três poemas latinos - De minimo, De monade, e De innumerabilibus sive de immenso, os quais relembravam as teorias expostas nos diálogos italianos e desenvolvia o conceito de uma base atômica da matéria e do ser.

Em Frankfurt um editor veneziano lhe transmite o convite de um patrício, João Mocenigo, que desejava aprender suas técnicas mnemônicas. Bruno ainda estava procurando por um posto acadêmico do qual pudesse expor suas teorias, e devia saber que a cadeira de matemática da Universidade de Pádua estava vaga. Acreditando na independência da República Veneziana e saudoso de sua terra, aceita o convite e regressa à Itália em agosto de 1591. Esse ato, acredito, se tornaria seu maior erro.

Seguiu imediatamente para Pádua e durante o verão de 1591 iniciou uma série de cursos privados para estudantes alemães e escreveu o Praelectiones geometricae e Ars deformationum. No início do inverno, quando soube que não receberia a cátedra, que foi oferecida a Galileu em 1592, retornou a Veneza como hóspede de Mocenigo. Participou das discussões dos aristocratas venezianos progressistas que, como ele, defendia a investigação filosófica, independentemente de suas implicações teológicas.

Em maio de 1592 havia terminado outro trabalho e preparava-se para viajar a Frankfurt para publicá-lo, quando foi preso por Mocenigo no sótão de sua casa. Desapontado com as lições privadas de Bruno sobre as técnicas mnemônicas que em nada ajudaram sua medíocre memória, Mocenigo considerava-se atraiçoado por não conseguir o milagre esperado. Mocenigo ficou também ressentido por Bruno querer voltar a Frankfurt para publicar seu novo trabalho. Depois de prendê-lo, denunciou-o à Inquisição Veneziana por suas teorias heréticas.

Levado pelo Santo Ofício, Bruno defendeu-se admitindo alguns erros teológicos menores, defendendo, no entanto, seus postulados básicos. O julgamento veneziano parecia favorável a Bruno, quando a Inquisição Romana pede sua extradição por ordem do Papa, a esse ponto, curioso sobre a personalidade de Bruno e o conteúdo do processo com respeito a suas ideias. O tribunal de Veneza encaminha, então, o prisioneiro para Roma e em janeiro de 1593 Bruno entrou na cadeia do palácio romano do Santo Ofício. Lá um frade, Celestino de Verona, junta novos testemunhos acusadores.

Inicia-se um novo processo em 1593, este mais sério, acompanhado de torturas, e que haveria de prolongar-se por sete anos. O papa Clemente VIII (1592-1605) viria a ter papel decisivo no seu processo. Durante o julgamento romano, Bruno a princípio desenvolveu sua linha defensiva prévia, negando qualquer interesse particular em questões teológicas e reafirmando o caráter filosófico de suas especulações. Essa distinção não satisfez os inquisidores, que pediram uma retratação incondicional de suas teorias.

Em determinado ponto do processo, lhe foram dados quarenta dias para reconsiderar sua posição. Bruno então fez uma tentativa desesperada de demonstrar que seus pontos de vista não eram incompatíveis com a concepção cristã de Deus. Então conseguiu mais quarenta dias para deliberar, porém não conseguiu convencer o papa e a inquisição.

Bruno foca sua defesa na tentativa de convencer os inquisidores da legitimidade das suas ideias filosóficas e da possibilidade de conciliá-las com a revelação religiosa.

Ele alega que a acusação descontextualiza seu trabalho tomando peças isoladas do mesmo, e que não sabe sobre o que se retratar.

Finalmente declarou que não tinha nada para se retratar e que ele nem sabia do que se esperava que o fizesse.

Os inquisidores rejeitaram seus argumentos e exigiram dele uma retratação formal. Com a recusa de Bruno o Papa Clemente VIII ordenou que ele fosse sentenciado como um impenitente e herege pertinaz. A 20 de janeiro de 1600 ele é condenado. A oito de fevereiro é levado ao palácio do Grande Inquisidor para ouvir sua sentença de joelhos, diante dos acólitos assistentes e do governador da cidade. Após a sentença de morte dirigindo-se aos juízes ele lhes diz:

"Talvez vocês, meus juízes, pronunciem esta sentença contra mim com maior medo que eu em recebê-la." Lhe deram mais oito dias para que se arrependesse, mas ele não cedeu.

Ao contrário de Galileu Galilei, que, alquebrado pela tortura, alguns anos mais tarde abjurou a teoria de Copérnico, Giordano Bruno, após sete anos nos calabouços da Inquisição, sofrendo todos os tipos de torturas, não pôde ser convencido pelos representantes religiosos a abjurar as suas teorias.

Estas não se resumiam apenas na defesa do sistema de Copérnico, que tanto irritava a Igreja, mas incluíam também a sua opinião de que o universo não era limitado por um invólucro, mas sim formado por uma quantidade infinita de estrelas, sendo incomensuravelmente grande. Num tal Universo, onde caberia lugar para a existência do Deus imposto pela igreja?

Giordano Bruno não via a teoria copernicana apenas como um sistema astronômico matemático, mas como um sistema divino. Ele acreditava encontrar Deus nas suas criaturas. Acreditava que Ele se fundia com elas – um pensamento incrível, que para as autoridades religiosas parecia ser mais perigoso do que a afirmação de que a Terra giraria em torno do Sol.

No dia 17 de fevereiro de 1600, com uma mordaça na boca para não blasfemar, é levado ao Campo di Fiore, em Roma, onde se cumpre a triste sentença:

Filippo Giordano Bruno, o ex-monge dominicano, agora com 52 anos de idade, é queimado vivo publicamente por suas ideias “heréticas” e por não se curvar diante a inquisição romana, recusando-se a abjurar suas crenças e convicções.

Suas obras foram proibidas pela igreja e só em 1948 foram tiradas do seu índex de proibições. Porém, tudo isso não foi o suficiente para calar a sua voz. Seus pensamentos ecoaram através dos séculos, influenciando mentes abertas e inquiridoras, pois a força do pensamento é uma semente imortal e indestrutível. Mesmo enterrada no mais árido chão, basta uma gota de chuva para ela brotar e crescer novamente adaptando-se ao seu novo meio.

 

Bibliografia:

Giordano Bruno e a Tradição Hermética – Frances Yates

A Arte da Memória – Frances Yates

Astronomia – Joachim Herrmann

Pesquisa de documentos diversos via WEB.

 

ChicoDeGois
Enviado por ChicoDeGois em 24/04/2019
Reeditado em 17/01/2024
Código do texto: T6631129
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