Carmo Perrone (o Avô)
 
Luiz Carlos Pais
 
 
Entre os professores do ensino secundário de São Sebastião do Paraíso, MG, do início do século XX, estava Carmo Perrone, um imigrante italiano cujo nome está na história da cidade. Mas, esse educador que ministrava aulas particulares não deve ser confundido com o ilustre professor de Matemática, Carmo Perrone Naves, seu neto, cuja trajetória no magistério começou no final da década de 1920, no Ginásio Paraisense. No início do século XX, não havia curso ginasial regular na cidade, que começava a expandir sua importante produção e exportação de café. Havia carência de professores com formação suficiente para ministrar aulas avulsas de nível secundário. Assim, as aulas particulares tinham uma função social muito relevante, mesmo que estivessem restritas a uma pequena parcela da sociedade. Essas aulas abriam as portas para jovens que tinham condições de frequentar um curso superior ou queriam preparar-se para prestar um concurso, que geralmente exigia exames de Aritmética, Português e Redação.
 
A memória coletiva preservou a imagem de que Carmo Perrone tinha ampla cultura geral e um método de ensino diferenciado na maneira de proferir suas lições num estabelecimento particular denominado Colégio “Espírito Santo”. O mestre conhecia Latim, falava Francês com fluência, conhecia a prática das “Partidas Dobradas” (contabilidade) e conhecia literatura clássica romana. Era músico e, juntamente com Abílio Perrone, participou da “Filarmônica Cajuruense”, uma orquestra de bailes cuja trajetória está na história da cidade paulista de Cajuru. Depois de residir alguns anos nesta cidade paulista e na vizinha Santo Antônio da Alegria, Carmo Perrone fixou residência em São Sebastião do Paraíso, lá pelos idos de 1900 ou um pouco antes da virada do século, de acordo com notícias publicadas no Almanak Laemmert do Rio de Janeiro.
 
Para registrar traços da memória desse mestre pioneiro que participou da história da educação em São Sebastião do Paraíso, recorremos a diferentes edições do referido periódico, da primeira década do século XX. Foi possível constatar que o avô do “nosso” querido e saudoso professor de matemática ministrava lições particulares, mesmo antes da inauguração do Ginásio Paraisense, em 1907. Além do mais, as notícias publicadas no referido periódico conferem com o registro histórico elaborado pelo advogado e escritor José de Souza Soares, que destaca a atuação do professor Carmo Perrone, desde os últimos anos do século XIX. Conforme confirma o referido autor, este mestre dirigia um estabelecimento frequentado por um bom número de meninos. Na mesma época, funcionava outro estabelecimento particular, o Colégio “Filhas de Hebe”, onde a professora Infantina Valverde ministrava aulas para meninas.
 
Além de exercer o magistério particular, Carmo Perrone também exercia as funções de amanuense na Câmara Municipal de São Sebastião do Paraíso. O amanuense era um funcionário qualificado com cultura suficiente para redigir com autonomia, sem ser preciso que outra pessoa “letrada” lhe ditasse o texto. Além dessa competência, ainda dominava a arte da caligrafia. Quando o uso das antigas máquinas de escrever ainda era muito restrito, quase todos dos documentos públicos precisavam ser escritos à mão, com clareza e redação correta, justificando a importância desse profissional.
 
As competências exigidas no exercício das atividades de amanuense correspondiam à cultura escolar em nível secundário. Desse modo, esse profissional geralmente ministrava aulas em nível secundário, sobretudo, em se tratando de conteúdos de Latim e Língua Portuguesa, entre outras matérias literárias e humanas. Entretanto, conforme pesquisas da história da educação, quase sempre, o amanuense tinha também domínio dos conteúdos elementares de ciências exatas. Em outros termos, geralmente, o amanuense também exercia o magistério particular, como ocorria em diferentes partes do país e em São Sebastião do Paraíso não era diferente.
 
Além das duas citadas atividades (amanuense e professor), consta que o mestre também trabalhou como Guarda-Livros, termo usado, até os meados do século XX, para qualificar os profissionais contadores, quando os registros contábeis eram feitos em livros escritos à mão. Finalmente, para concluir essa crônica, quanto às dificuldades de acesso ao ensino secundário, no final do século XIX, José de Souza Soares menciona dois dos primeiros paraisenses que ingressaram no ensino superior, recebendo aulas particulares na própria cidade. Um deles foi o advogado Francisco Soares Netto e o outro foi o médico Aramim de Almeida, filho de João Antônio de Almeida, um dos fundadores da Loja Maçônica Estrella Sul de Minas.