JOSÉ BONIFÁCIO - SEGUNDA PARTE
A Declaração de Independência

O príncipe regente, a 14/08/1822 partiu para São Paulo, cujo governo reacionário parecia querer desacatar José Bonifácio. Tivera antes sucesso em sua missão a Minas Gerais, pretendia repetir o êxito em São Paulo. Foi bem recebido e, "com a autoridade que suas estroinices e desmandos só mais tarde diminuiriam", pôs ordem no governo provincial. Em sua ausência ficara como regente sua mulher, a princesa Dona Leopoldina de Habsburgo, colaboradora da obra de José Bonifácio. Tinha poderes para, em Conselho de ministros, tomar com o mesmo as medidas necessárias "ao bem e à salvação do Estado".
No fim de agosto chegaram ao Rio de Janeiro três navios de Lisboa, com notícias de que as Cortes tinham decidido reduzir o príncipe a simples delegado temporário, e apenas nas províncias onde exercia autoridade, com ministros vindos de Lisboa; haviam anulado a convocação do Conselho de Procuradores e mandariam processar todos quantos tivessem procedido contra sua política. O visado era José Bonifácio, tido como o maior responsável pelos acontecimentos. Este recebeu, ao mesmo tempo, carta de seu irmão Antônio Carlos, que estava em Lisboa. E escreveu a 
Dom Pedro:

"O dado está lançado e de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A. quanto antes e decida-se, porque irresoluções e medidas d'água morna, à vista desse contrário que não nos poupa, para nada servem e um momento perdido é uma desgraça."
Com sua carta seguiram cartas de Dona Leopoldina, incitando o marido ao gesto, uma de Antônio Carlos, outra do inglês Neville Chamberlain.

O emissário, Paulo Emílio Bregaro, encontrou 
Dom Pedro que voltava de Santos, leu os papéis, demonstrou sua grande indignação, e, ao encontrar a Guarda de Honra que o esperava nas margens do Riacho Ipiranga, comunicou que as Cortes queriam "massacrar" o Brasil. Eram 16:30 hs do dia 07/09/1822, e o príncipe, num verdadeiro brado, exclamou:

"É tempo! Independência ou morte! Estamos separados de Portugal"

Aclamação de Dom Pedro I como Imperador do Brasil no Campo de Santana, no Rio de Janeiro
O Fim do Ano 1822: Aclamação e Tumultos

José Bonifácio, confirmado ministro do Interior e dos Negócios Estrangeiros, foi tomando providências no novo governo. Por decreto de 18/09/1822, descreveu as armas e a bandeira brasileira como se mantiveram até 1889. Por outro decreto, também de 18/09/1822, criou o tope nacional brasileiro, verde e amarelo. Noutro, concedia anistia geral para todas as passadas opiniões políticas - mas excluindo dos benefícios aqueles que se achassem presos e em processo. Pediu, pela primeira vez, demissão quando Gonçalves Ledo inspirou ao imperador um decreto mandando cessar a devassa em São Paulo.

Mas 
Dom Pedro, mesmo ligado a José Bonifácio, vinha sofrendo o assédio do grupo de Gonçalves Ledo, apontado como representante genuíno do sentimento popular. No dia de sua chegada de São Paulo, Dom Pedro foi tomar posse de seu cargo. Não desejava abandonar José Bonifácio, mas sim, tendo criado fé em seu destino, ganhara confiança em si mesmo e tinha o intento de ouvir outras opiniões.

Em setembro e outubro de 1822, 
Dom Pedro parecia ter oscilado mais que nunca, com seu temperamento nervoso, de um lado entre os patriotas, querendo tudo e disputando a primazia, e do outro, José Bonifácio, procurando chegar aos mesmos fins mas sem demagogia nem precipitações.

Este grupo preparou outra ação política importante, a da 
Aclamação de Dom Pedro I, a 12/10/1822, como imperador constitucional do Brasil. Estipulava-se uma cláusula do juramento prévio que o novo imperador deveria prestar à Constituição, a ser redigida por uma Assembleia Constituinte. A essa cláusula, José Bonifácio se opôs terminantemente, e foi ela a razão de seu rompimento com o grupo deGonçalves Ledo. Mas, depois que Dom Pedro dissolveu a Constituinte, passou a exibir uma concubina, criou tribunais de exceção, fez morrer patriotas na forca, exilou e manteve José Bonifácio no exílio durante seis anos e, mais do que tudo para os "democratas", outorgou uma Constituição que não cumpriu. Gonçalves Ledo não figurou entre os liberais que se opuseram ao imperador.

 

O Primeiro Passo para a Independência da Bahia
A Independência na Bahia

O momento era grave, pois a Bahia, o Maranhão e o Pará continuavam fora da comunidade nacional, e havia perigo de uma reação armada de Portugal. José Bonifácio queria a aclamação de Dom Pedro como imperador, mas queria também um Poder Executivo forte, que assegurasse a ordem, e terminasse a tarefa de unir as províncias. Temia as assembleias constituintes. Na véspera da aclamação,José Bonifácio já teria retomado seu ascendente sobre Dom Pedro e, a 12/10/1822, Dom Pedro I foi aclamado imperador constitucional do Brasil em meio a grandes festas, mas sem a cláusula do juramento prévio.

A apreciação de numerosos historiadores é que, sem ele no governo, a unidade do Império teria sido preservada com dificuldades muito maiores, e o Brasil, dividido e dilacerado, não escaparia provavelmente aos transes do caudilhismo e da tirania militar. Mas houve choques com os irmãos Andrada, a 28/10/1822, 
Dom Pedro organizou novo gabinete, em que José Bonifácio foi substituído por José Egídio Álvares de Almeida, o Barão de Santo Amaro, seu velho companheiro em Coimbra na secretaria do Império e Estrangeiros, e Martim Francisco foi substituído na Fazenda pelo desembargador João Inácio da Cunha.

José Joaquim da Rocha iniciou um movimento pela volta dos Andradas ao poder, com intenso trabalho de propaganda, sessões tumultuosas no Senado da Câmara, manifestações populares - e José Bonifácio voltou, sendo reintegrado em seu posto por decreto de 30/10/1822. Tomou medidas rigorosas, como os exílios. Partiram para o Havre, em 20/12/1822, José Clemente Pereira, o cônego JanuárioPereira da NóbregaGonçalves Ledo conseguiu fugir para Buenos Aires. Chamou-os todos, em portaria de 11 de novembro, de "furiosos demagogos e anarquistas".

José Bonifácio, ministro do Império, a quem cabia portanto dirigir a política interna, e Ministro dos Estrangeiros, ainda foi o responsável pela criação de uma Marinha de Guerra. Caldeira Brant enviou-lhe de Londres cerca de 400 marinheiros e oficiais ingleses, postos à disposição de Thomas Cochrane, ávido e experiente lobo-do-mar sem muitos escrúpulos, Conde de Dundonald, feito mais tarde Marquês do Maranhão e que se encontrava no Chile, a cuja marinha servia.

Thomas Cochrane foi contratado pelo governo imperial para fazer guerra no mar aos portugueses e às Juntas Governativas das províncias do Piauí, Maranhão e do Grão-Pará até então refratárias à separação. O governo da Província Cisplatina capitulava, por Álvaro da Costa, em 18/11/1823. No final deste ano todas as províncias estavam integradas politicamente no novo império.

Medida de guerra foi ainda o decreto de 11/12/1822, em que José Bonifácioordenou o sequestro de todas as mercadorias nas alfândegas do Império de propriedade de portugueses, as que estivessem em mãos destes, os prédios rústicos e urbanos, as embarcações pertencentes a súditos de Portugal. Outro decreto, de 30/12/1822, elevou para 24% os direitos de importação de mercadorias portuguesas, equiparadas assim às dos demais países do mundo, salvo as da Inglaterra que, por força do tratado de 1810, continuavam a pagar 15%.

José Bonifácio, que não usava escravos em suas propriedades, escrevera ao mesmo Caldeira Brant desde outubro de 1822, pedindo para o Brasil trabalhadores rurais ingleses, para estabelecê-los no Brasil. Vieram cerca de 250, como a 16/01/1823 comunicou Caldeira Brant, inicialmente pelo navio Lawpin.

 
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A Assembleia Constituinte: 1823

1823 foi o grande ano da Constituinte. Um decreto de 14/04/1823 fixou para 17/04/1823 a primeira reunião preparatória e, a 03/05/1823, a abertura definitiva. A opinião de José Bonifácio estava expressa na frase que Dom Pedro I pronunciou em sua coroação, na cerimônia pomposa e teatral em 01/12/1822:

"Com a minha espada defenderei a pátria, a nação e a Constituição, se for digna do Brasil e de mim!"
Era a advertência aos deputados, como o resto de sua fala, a que não perpetrassem apenas uma obra de teóricos e sonhadores. Para José Bonifácio, o mandato dos constituintes não era irrestrito, a forma de governo fora predeterminada: uma monarquia constitucional.

 
Num Brasil com um milhão de escravos numa população total inferior a quatro milhões, mal saído da opressão colonial, sem escolas, sem universidades, em que até 15 anos atrás não se admitia a existência de um prelo, de um jornal, a assembleia congregava muitos homens de valor - mas todos inexperientes em assuntos de técnica parlamentar e legislativa. A posição do governo se tornou menos cômoda. Surgiram logo os protestos liberais, o governo mantinha gente nas prisões sem culpa formada, ordenava deportações, coagia a imprensa. Formou-se na Constituinte uma oposição aguerrida, e José Bonifácio não possuía os dons necessários de convencimento, era mau orador, com timbre de voz antipático, não se preocupava em ser amável, não disfarçava certo tom arrogante. "Por não ser mais sereno, carrega hoje culpas que não lhe cabem", concluiu Octávio Tarquínio de Sousa, como o atentado de que foi vítima o jornalista Luís Augusto May. Enquanto isso, Dom Pedro passou a acreditar em todos os elogios, em todos os louvores, acreditando-se o herói único, autor exclusivo da independência.
 
José Bonifácio caiu após um episódio que envolveu o padre Francisco Muniz Tavares, deputado por Pernambuco, sobre a situação dos portugueses no Brasil. O projeto de deportação não vingou, mas deu ensejo a que se dissesse o que não deveria ter sido dito. O imperador decidiu afastar seu ministro e demiti-lo por uma questiúncula de política regional paulista. José Bonifácio se considerou demitido na noite de 15/07/1823. Seu substituto foi José Joaquim Carneiro de Campos, depois Marquês de Caravelas. Solidária, demitiu-se também sua irmã Maria Flora Ribeiro de Andrada das funções de camareira-mor da imperatriz.

Sobre este episódio comenta Maria Graham:

"...a renúncia de José Bonifácio é certa, e não menos certa a de seu irmão Martim Francisco, cuja honestidade irrepreensível à frente do Tesouro não será facilmente substituída. (…) A ideia mais geral é a de que os Andradas foram sobrepujados por um partido republicano da Assembleia. (…) Entrementes José Joaquim Carneiro de Campos é o primeiro-ministro e Manuel Jacinto Nogueira da Gama está à testa do Tesouro; homem bastante rico para ficar acima de qualquer tentação cujo caráter, quanto à integridade, está escassamente abaixo de seu predecessor."
Em uma entrevista dada em 05/09/1823 a O Tamoyo, jornal por ele fundado em agosto de 1823 após sua demissão do governo, e que só viveu três meses, ele explicou suas ideias, abriu seu coração. O homem público estava intacto, cheio de interesse pela política. Não podia afastar-se da Corte, pois era deputado à Constituinte, mas lutaria contra o que não lhe agradava. A 01/09/1823 foi lido o projeto de Constituição, com 272 artigos, do qual Antônio Carlos, seu irmão, era o relator e autor principal. Era francamente liberal, e criava um poder executivo forte, delegado ao imperador. Mas havia no seio da assembleia quatro ou cinco grupos. E, em Portugal, um golpe absolutista contra as desastradas Cortes investira novamente Dom João VI na plenitude dos poderes do Estado. Portugueses e reacionários começavam no Brasil a levantar a cabeça.
 
O imperador ia aos poucos cedendo, e o elemento militar luso ia-se infiltrando no exército, tornando-se perigoso e insolente. A campanha dos que se intitulavam os patriotas continuava, nacionalista e anti-portuguesa. Houve discursos de grande exaltação em novembro de 1823, depois do episódio com o boticário Davi Pamplona Corte Real. O imperador refez então seu gabinete com gente incolor ou reacionária. Francisco Vilela Barbosa, depois Marquês de Paranaguá, chegado há pouco de Portugal, foi escolhido novo ministro do Império. A tropa passou a exigir restrições à liberdade de imprensa e a expulsão dos Andradas da Assembleia. A dissolução da Constituinte tornou-se inevitável.

Segundo Maria Graham "a verdadeira causa do desprestígio de José Bonifácio estava na amante do Imperador e no Plácido. Suponho que estão vendidos ao partido português, afirma - sendo eles próprios pés de chumbo." (…) Quando osAndradas foram deportados, foi uma inglesa, Mrs. Chamberlain, senhora do cônsul inglês no Rio de Janeiro, que obteve licença para que suas esposas pudessem acompanhá-los.

José Bonifácio foi preso em casa e levado para a Fortaleza da Laje, após o golpe de força da dissolução da Assembleia pelo imperador, em 12/11/1823. Não haveria nova Constituinte - 
Dom Pedro I outorgaria uma Constituição a 24/03/1824, sendo esta uma adaptação do ante-projeto de Antônio Carlos, em curso na Assembleia Constituinte dissolvida.

Condenado ao exílio, deixou o Rio de Janeiro numa velha charrua, chamada Lucônia, a 20/11/1823, comandada pelo português Joaquim Estanislau Barbosa, com destino ao Havre. Após um motim durante a viagem, pararam em Vigo, na Espanha, a 12/02/1823, e quase foram apresados por navios portugueses, escapando graças à intervenção do cônsul da Inglaterra, que o procurou a bordo. Seguiram por terra para Corunha, e de barco para Bordéus, onde desembarcaram a 05/07/1823.

 
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Exílio e Retorno

Banido, José Bonifácio foi residir em Talence, a quatro quilômetros de Bordéus, com sua família. Viveria no exílio dos 61 aos 66 anos. Martim Francisco e Antônio Carlos moravam também em Bordéus. Neste período renasceu nele o trabalhador intelectual, o homem de estudos. E a "solidão do campo", como escreveu a amigos, lhe trouxe "a mania antiga de poeta". Traduziu Virgílio e Píndaro, compôs, e em 1825, sob o pseudônimo arcádico de Américo Elísio, publicou em Bordéus as "Poesias Avulsas", gastando nisso 500 francos. Não era bom poeta, nem poeta original.

As notícias do Brasil não o podiam deixar contente. 
Dom Pedro I, a 25/03/1824, outorgada a Carta Constitucional, fora implacável ao abafar o movimento revolucionário do Nordeste, conhecido como Confederação do Equador, nascido da dissolução da Assembleia.

"O partido português havia assumido tal importância em setembro de 1824 que o mais leve sinal de inteligência num ministro brasileiro o derrubaria. Todos os oficiais do palácio, as mulheres inclusive são portugueses ou franco-lusitanos."
Preocupavam-no sobretudo as negociações para o reconhecimento da independência, com Portugal e a Inglaterra, que se arrastaram até agosto de 1825. O fato de o Brasil aceitar pagar dois milhões de esterlinas a Portugal lhe pareceu mais uma "carta de alforria" do que o reconhecimento. Foi impiedoso com Dom João VI, a quem chamou de "João Burro", e com Dom Pedro, a quem comparou aPedro Malasartes. Considerava um insulto que Dom Pedro tivesse outorgado a sua amante Domitília de Castro e Canto Melo o título de Viscondessa de Santos, justamente a cidade em que nascera.

Em maio de 1826 foi instalada a primeira Assembleia Legislativa brasileira. 
Dom Pedro I não agiu imparcialmente na escolha dos senadores, nem se deveria esperar isso dele. Morreu o rei Dom João VI e Dom Pedro lhe sucedera no trono português. Porém, ele outorgou uma Carta, decretando anistia geral e abdicando em favor de sua filha Dona Maria da Glória, futura Dona Maria II.

Enquanto isso, a devassa aberta contra os Andradas se eternizava em São Paulo, avançando até 1828, e José Bonifácio permanecia em Bordéus. Neste período foi duas vezes votado como deputado pela Bahia. Antônio Carlos e Martim Franciscoconseguiram autorização para o regresso e deixaram Bordéus a 26/04/1828, sendo recolhidos à Fortaleza da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, a 04/07/1828, e a 06/09/1828 lograram absolvição e liberdade.

Em 1829 foi permitido a José Bonifácio retornar ao Brasil. Chegou ao Rio de Janeiro a 23/07/1829, carregando o cadáver da esposa, morta na viagem. O ministro do Império era seu adversário José Clemente Pereira, e o dos Estrangeiros o Marquês de Aracati, seu companheiro no governo provisório de São Paulo e depois também adversário.

A situação política não era das melhores, pois o imperador não se entendia com o Poder Legislativo, não escolhia ministros que desfrutassem do apoio dos deputados, entre os quais havia quem quisesse estabelecer o parlamentarismo à inglesa. O Primeiro Reinado vinha se caracterizando por uma constante instabilidade política e social. José Bonifácio teria grandes dúvidas sobre a campanha liberal dirigida por Bernardo Pereira de VasconcelosEvaristo da Veigae outros.

Generoso, perdoava ao que chamava por vezes "O Rapazinho", e 
Dom Pedro o recebeu com alegria. Com o Marquês de Barbacena, que desembarcara no Rio de Janeiro em 16/10/1829 trazendo a nova imperatriz Dona Amélia de Leuchtenberg, sempre se entendera bem. Mas seus inimigos não o deixavam descansar e, já em março de 1830, foi acusado de estar metido em uma conspiração republicana, como insinuou o Diário Fluminense. Vivia então retirado na ilha de Paquetá.

 
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Dom Pedro II aos 12 anos de idade vestindo o uniforme imperial de gala, 1838
Tutor dos Príncipes

Com a abdicação de Dom Pedro I em 07/04/1831, José Bonifácio foi por ele nomeado tutor de seu filho de cinco anos, o futuro Dom Pedro II. Mau marido, o imperador foi um pai dedicado e enternecido - e de todos os filhos, legítimos ou não.

O imperador assinou um decreto em que nomeava "tutor dos meus amados e prezados filhos ao muito probo, honrado e patriótico cidadão José Bonifácio de Andrada e Silva, meu verdadeiro amigo". No dia 8 de abril, José Bonifácio foi ao palácio da Boa Vista visitar os pupilos. Tinha 68 anos e seu temperamento e seu feitio não prometiam um tutor ideal. Ainda apareceria na Câmara dos Deputados, pois era suplente de Honorato José de Barros Paim.

Prestou juramento perante o Senado como tutor eleito pela Assembleia a 19/08/1831. A lei de 12/08/1831 regulava suas funções, e não lhe cabia senão nomear mestres e mordomos. Manteve Luís Aleixo Boulanger para lhes ensinar escrita, primeiras letras e geografia; o cônego Renato Pedro Boiret para mestre de francês; Simplício Rodrigues de Sá, de desenho; Lourenço Lacombe, de dança;Fortunato Mazzioti, de música. Acabou brigando com Dona Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho, a quem os príncipes consideravam uma segunda mãe, e que não teria pequena parte na campanha movida contra ele.

Logo se tornou suspeito ao governo. O ministro da Justiça Diogo Antônio Feijó, que abafara dois graves levantes armados no Rio de Janeiro em 1831 e 1832, se convenceu de que José Bonifácio tivera parte no último, e o acusou formalmente.

Em 1833, o grande temor era a volta de 
Dom Pedro I, a restauração, um golpe"caramuru"Antônio Carlos fora mesmo à Europa para convencê-lo a retornar. A Aurora Fluminense, de Evaristo da Veiga, acusava o tutor de falta de compostura, comentando dois bailes dados no paço. Finalmente, José Bonifácio foi suspenso do cargo pelo decreto de 14/12/1833, por ato cujo verdadeiro autor era o Ministro da Justiça Aureliano Coutinho, depois Visconde de Sepetiba, que escreveu à Dona Mariana de Verna"Parabéns, minha senhora. Custou, mas demos com o colosso em terra".

 
Eles estavam enganados. José Bonifácio resistiu, com energia a diversos juízes de paz que foram ao paço levar seu decreto de suspensão, pois não o considerava legal. E escreveu ao Ministro do Império: "Cederei à força, que não a tenho".

Para arrancá-lo, mobilizou-se a tropa e foi lavrada contra ele ordem de prisão. O governo prendeu-o em casa, na ilha de Paquetá. Em seu lugar foi nomeado 
Manuel Inácio de Andrade Souto Maior Pinto Coelho, o Marquês de Itanhaém.

 
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Perfil e o Fim

Segundo Maria Graham, uma inglesa contemporânea, não havia lugar em que se pudesse passar meia hora com mais prazer e proveito do que na família "deste ex-ministro".

"Sua mulher é de origem irlandesa, uma O'Leary, senhora da maior amabilidade e gentileza, realmente admiradora do valor e do talento do marido. (…) Mas é o próprio José Bonifácio que me desperta maior interesse. É um homem pequeno, de rosto magro e pálido. Suas maneiras e sua conversa impressionam logo o interlocutor com a ideia daquela atividade incansável e que mais parece consumir o corpo em que habita. (…) via-se logo que era muito popular entre a gente pequena. Para comigo, como estrangeira, foi da maior cerimônia ainda que delicadamente polido, e conversou sobre todos os assuntos e de todos os países."
 
José Bonifácio abandonou a vida política e passou o restante de seus dias em reclusão, em sua casa na ilha de Paquetá, dentro da Baía de Guanabara. Morreu ali perto, em Niterói, aos 74 anos, no dia 06/04/1838.

Seu cadáver, embalsamado, foi levado três dias depois para o Rio de Janeiro, depositado na Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, onde ficou exposto até o dia 25/04/1838. Nessa data, sua filha Dona Gabriela Frederica Ribeiro de Andrada o levou para Santos, sepultando-o na capela-mor da Igreja Nossa Senhora do Carmo, segundo disposição testamentária.

José Bonifácio deixou poucos bens. Foi e continuava a ser homem pobre, mas sua biblioteca contava com seis mil volumes.

Atualmente, os seus restos mortais jazem ao lado dos despojos de seus ilustres irmãos, Antônio CarlosMartim Francisco e o padre Patrício Manuel, num monumento situado em Santos, na Praça Barão do Rio Branco 16, denominadoPanteão dos Andradas, inaugurado no dia 07/09/1923.


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Gabriela Frederica, uma das três filhas de José Bonifácio, casou com Martim Francisco, seu tio.
Casamento e Posteridade

José Bonifácio casou em Lisboa em 31/01/1790, na igreja de Nossa Senhora da Lapa, com uma senhora irlandesa, Narcisa Emília O'Leary, que lhe deu duas filhas.

Carlota Emília, que casou com Alexandre Antônio Vandelli, auxiliar do sogro desde 1813 na Intendência-Geral das Minas e Metais e na Academia das Ciências.

Gabriela Frederica Ribeiro de Andarda que, em 15/11/1820, casou em Santos com seu tio, Martim Francisco Ribeiro de Andrada. Voltando ao Brasil trouxe uma filha bastarda, Narcisa Cândida, assim batizada em homenagem à esposa.

 
Curiosidades

O Imperador Dom Pedro II, por ocasião dos festejos do cinquentenário da independência, quis outorgar à Gabriela Frederica Ribeiro de Andarda, filha deJosé Bonifácio, o título de Viscondessa do Ipiranga, o que foi delicadamente recusado alegando que seu pai e tios nunca aceitaram honrarias e títulos semelhantes pelos serviços que haviam prestado ao país.

Certa vez, José Bonifácio recebeu um envelope contendo seus vencimentos de ministro e os colocou dentro do chapéu. Ao sair, deixou-o na cadeira do teatro e esqueceu que o dinheiro estava ali. Chegando em casa, lembrou-se do dinheiro e não mais o encontrou. De alguma forma, o Imperador soube do fato e ordenou aMartim Francisco, então Ministro da Fazenda, que pagasse novamente a José Bonifácio o salário do mês, ao que o Ministro da Fazenda se recusou dizendo que"O Estado não é responsável pela displicência de seus empregados", e continuou:"O máximo que posso fazer é dividir meu pagamento com ele". E assim foi feito.

José Bonifácio morreu pobre e esquecido. Um amigo que o conheceu nos tempos de glória soube que estava doente e foi visitá-lo em Niterói. O amigo ficou impressionado com a modéstia da casa e mais ainda com os remendos no lençol que o cobria.

- Não repare - disse José Bonifácio, passando a mão pelo lençol.
- O que enfeia esses bordados é apenas a irregularidade do desenho…
 
O amigo ficou sem saber se era um disfarce, uma ironia ou um pedido de desculpas.
 
Atividades Maçônicas

José Bonifácio teve lugar de destaque na história da Maçonaria do Brasil como um dos principais fundadores. Foi o primeiro Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil sendo empossado em 19/07/1822, cargo o qual exerceu por duas oportunidades. Exerceu ainda o cargo de Soberano Grande Comendador do Supremo Conselho que é a mais alta hierarquia, responsável pelos maiores graus da Ordem Maçônica.

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O Monumento a José Bonifácio atualmente, quase na esquina da Rua 40 Oeste - New York
Representações e Homenagens

Na Cultura
 
  • José Bonifácio já foi retratado como personagem no cinema e na televisão, interpretado por Dionísio Azevedo no filme "Independência ou Morte" (1972)
  • Leonardo Villar, na telenovela "Marquesa de Santos" (1984)
  • Paulo Goulart, na minissérie "O Quinto dos Infernos" (2002).
 
Nas Artes:
 
  • A cidade de Pelotas, no Rio Grande do Sul, mantém uma praça com seu nome, em frente à Catedral São Francisco de Paula, com um monumento central em sua homenagem.
  • Pantheon dos Andradas em Santos, São Paulo - No centro histórico de Santos, onde estão os seus restos mortais. Na câmara principal tem uma estátua projetada por Rodolfo Bernardelli.
  • Estátua no Bryant Park, New York - Um presente do Governo Brasileiro aos Estados Unidos, obra de José Otávio Correia Lima inaugurada em 22/04/1955 no primeiro local em que foi instalada (na Sexta Avenida esquina com a Rua 42 oeste) na presença do prefeito Roberto F. Wagner e o embaixador brasileiro nos Estados Unidos João Carlos Muniz. Muitos anos depois, porém, o monumento mudaria de lugar para o Bryant Park.
  • Estátua no Largo de São Francisco, Rio de Janeiro - Homenagem do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, obra de Louis Rochetinaugurada na presença de Dom Pedro II, no cinquentenário da Independência.
  • Retrato de José Bonifácio - Pintura a óleo, no Salão de Honra do Museu Paulista, obra de Oscar Pereira da Silva.
 
Belonaves:
 
A Marinha o considera o seu fundador e deu o seu nome a três de suas belonaves:
 
  • Iate José Bonifácio, incorporado à esquadra em 1915 para servir a Presidência da República. Em 1923 ainda estava em operação.
  • Cruzador José Bonifácio ou Cruzador Andrada, incorporado à esquadra em 1894. Esteve em operação até 1913.
  • Navio Hidrográfico/Auxiliar José Bonifácio, incorporado em 1932. Operou até 1963, quando esteve em Santos, participando das comemorações do bicentenário do nascimento do Patriarca da Independência José Bonifácio de Andrada e Silva.
 
Memória
 
 
  • Seu nome foi inserido no Livro dos Heróis da Pátria, em 21/04/2007, dentre as comemorações do quadragésimo sétimo aniversário de Brasília.
  • O Senado Federal instituiu a Medalha José Bonifácio, em sua homenagem.
  • A Universidade de Coimbra deu seu nome a uma das galerias do seu Museu Mineralógico e Geológico.
  • O Presidente Itamar Franco e o Ministro da Ciência e Tecnologia, José Israel Vargas, instituíram a Medalha Nacional do Mérito Científico que tem a efígie de José Bonifácio de Andrada e Silva através do decreto nº 772 de 16/03/1993, depois revogado e alterado pelo decreto nº 4.115 de 06/02/2002.
  • A Sociedade Brasileira de Geologia instituiu em 1958 a Medalha de Ouro José Bonifácio de Andrada e Silva com o objetivo de homenagear profissionais das Geociências, associados da Sociedade Brasileira de Geologia, que tenham contribuído para o desenvolvimento e avanço do conhecimento geológico.
  • O município de Santos instituiu a Medalha e o Diploma do Mérito José Bonifácio.
  • O município de José Bonifácio recebeu este nome em sua homenagem.
  • A Rua José Bonifácio no bairro de São Domingos na cidade de Niterói recebeu este nome em sua homenagem. É justamente a rua onde residiu nos seus últimos anos de vida.
  • O governo do Estado de São Paulo instituiu a "Semana do Patriarca da Independência" em sua homenagem.
  • A um mineral do grupo da granadas foi dado o nome de andradita, em sua homenagem.
 
Obras
 
  • 1813 - "Sobre As Minas De Carvão-de-Pedra Em Portugal", publicado no Patriota, Rio de Janeiro.
  • 1813 - "Há Terrenos Que Pelo Arado Não Dão Fruto, Mas Sendo Cavados Com o Picão Sustentam Mais Do Que Se Fossem Férteis", memória, publicada no Patriota, Rio de Janeiro.
  • 1814 - "Experiências Químicas Sobre a Quina do Rio de Janeiro, Comparada Com Outras"
  • 1814-1815 - "Memória Minerográfica da Serra Que Decorre de Santa Justa até Santa Comba e Suas Vizinhanças na Província do Minho", Museu Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc. 290.
  • 1815 - "Sobre a Necessidade e Utilidade do Plantio de Novos Bosques em Portugal, Particularmente de Pinhais Nos Areais de Beira-Mar; Seu Método de Sementeira, Custeamento e Administração"
  • 1815 - "A Primavera"
  • 1817 - "Memória Sobre a Nova Mina de Ouro da Outra Banda do Tejo, Chamada Príncipe Regente"
  • 1818 - "Memória Sobre as Pesquisas e Lavra dos Veios de Chumbo de Chacim, Souto, Ventozello, e Villar de Rey na Província de Trás-os-Montes"
  • 1818 - "História da Academia Real das Ciências de Lisboa, Para o Ano de 1818", discurso histórico recitado na sessão de 24/06/1818".
  • 1820 - "Memória Econômica e Metalúrgica", sobre a fábrica de ferro em Sorocaba, que visitaria pela segunda vez em 1821, com duras críticas à"má administração antiga e nova", aos "abusos e ladroeiras", o que iria suscitar a má vontade, a ira e a vingança do filho do diretor, o historiador Varnhagen.
  • 1825 - Poesias Avulsas
  • S/D - "Memória Minerográfica Sobre o Distrito Metalífero Entre os Rios Alva e Zêzere", Museu Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc. 291.