Retratos em preto-e-branco
Retratista da cidade era o Lavanca. Cidade e distritos, que não eram poucos, nem bonitos. Lavanca era apelido que pegou, feito chicletes no cabelo. O nome era Antônio, com o chapeuzinho circunflexo, e o chapelão para amansar aqueles cabelos revoltos, até mais bastos do que os de Ferreira, Gullar - e angular.
Nunca perguntei pela razão desse apelido. Mas um dia, observando-o na sua compunção na igreja matriz - antes que o acesso de tosse o atacasse, o que era freqüente - passou-me pela cabeça que aquele homenzarrão poderia bem ter engolido uma alavanca, e ficado com aquela postura incomum. Suposição só, numa casa de oração.
Apesar do conforto da falta de concorrência na pacata urbe, o
Lavanca vivia numa pobreza de dar dó. Usava seu terno claro,
com visíveis sinais dos tempos e o que escarrava durante uma
missa seria suficiente para preencher lenços em todos os bolsos daquela fatiota. Mas lenço parecia ter um só, ao invés dum lençol...
Vez por outra pintava na cidade ou cercanias um retratista da
capital. Um deles era o Zazá. Devia vir da capital pois tinha pose - e tino para os negócios. Nem me lembra se usava um tripé daqueles antigos feito o Lavanca. Mas tudo no Zazá era mais ágil.
E sua chegada era celebrada - e aproveitada. Assim como um
bom sol de estalar entremeando dias de chuva, pra se botar a
roupa enxombrada a secar. E Dona Zezé não hesitava: pegava a perrada toda, alguns até com os pés empoeirados ou cabelos despenteados e os reunia frente às lentes de Zazá. E zapt zupt! Não eram os retratos convencionais com poses e quetais, mas parece que duram mais.