CENAS DE VINGANÇA
Dizem que vingança é um prato comido frio, vagarosamente e pelas bordas, mas têm umas criaturas que trocam os pés pelas mãos. Outras não têm mãos, metem a cabeça por completo na arapuca. E no final, fica um tremendo vazio, e uma sensação de perda de tempo, de dinheiro e de vida com qualidade. A vingança é uma fruta podre que o individuo deixa na fruteira contaminando todas as outras. Dizem que se você quer que uma fruta amadureça, coloque-a perto de uma madura. Com laranjas, por exemplo, a facilidade de apodrecerem é fantástica. Pois, qual o motivo desse preâmbulo? Vou contar a seguir.
Já falei de Maria Amélia de Castro casada com Daniel Gomes da Nóbrega, meus bisavos. Tenho outra história pra contar e dessa vez, a vingança foi dela.
Segundo relato da minha família que o conheceu, contam que Daniel era um homem muito bonito. Era alto, louro, olhos azuis, uma barba loura com pelos lisos, ou seja, cobiçado pelas mulheres. Sabia-se bonito e tirava partido como podia.
Certa feita estava conversando na frente do armazém de alguém de sua família. Não sei precisar quantos, sei apenas que eram parentes. A cena a seguir foi a aproximação de uma “mulher a toa” parar em frente do grupo e perguntar: “qual de vocês pagaria um pedaço de queijo para uma mulher bonita?” Nenhum deles disse nada, mas Daniel metido a conquistador prontificou-se e pagou o queijo para a dita cuja.
Para o azar dela, Daniel e Amélia tinham um empregado que tinha pertencido a um bando desses que era comum no Nordeste e acabou empregado na sua fazenda. A nota aqui, é que ele era fiel escudeiro da minha bisa Maria Amélia. Não deu outra. Ele foi para casa e relatou o que havia acontecido. Dona Maria Amélia era extremamente ciumenta. Mandou que ele a seguisse, e ao chegar a sua casa, desse-lhe um surra, cortasse a orelha e raspasse sua cabeça.
Acreditem, ele cumpriu o que ela ordenou. Trouxe um pacote com a prova e lhe entregou. Amélia guardou o pacote e esperou a ocasião certa para apresentar sua arte. Quinze dias após esses acontecimentos, seria o aniversário de Daniel. Amélia preparou um almoço, um cozido no estilo pernambucano. Convidou todos os irmãos, só não chamou sua mãe, pois sabia que se ela estivesse presente, receberia uma surra e tanto.
No dia do aniversario, após o término, durante a sobremesa, Maria Amélia propôs um brinde, e mandou o empregado trazer-lhe o presente. Pediu o empregado que colocasse-o em cima da mesa, e pediu a Daniel que abrisse. Vocês podem imaginar a cena de horror? Daniel colocou as mãos na cabeça e disse: “você enlouqueceu, porque você fez isso?”
A história termina ai. Dizem que a policia andou atrás da orelha para costurar, mas ninguém nunca descobriu quem foi. Pelo menos, minha bisa nunca respondeu por esse crime. Sim, porque foi um crime, e merecia ser punida adequadamente. Quem merecia ter a orelha cortada era Daniel e a surra também. Aliás ele a chamava de “capota choca”.