BIOGRAFIA INOCÊNCIO NASCIMENTO DOS SANTOS

INOCÊNCIO NASCIMENTO DOS SANTOS

*05/12/1936

Inocêncio Nascimento dos Santos partiu de trem de ferro de sua cidade natal, Conceição de Feira, para Brumado, em 28/10/1956, a convite de Expedito Guedes – Canetão –. O apelido lhe fora colocado devido ao comprimento de suas pernas. Expedito, que também era conceiçoense e atuava em Brumado, como goleiro do Real Atlético Futebol – RAF –, fizera o convite a Inocêncio com a finalidade de colocá-lo para jogar no seu time, por ser excelente futebolista.

Àquela época, nas décadas de 1950-70, a cidade de Brumado vivia o auge de uma etapa gloriosa do futebol de campo. Jogadores de destaque de outras cidades, a exemplo de Inocêncio, Chunguinha, Nilo de Caculé, Idalino Ribeiro (Condeúba), Mário Codorna, Ensopado, Rosildo Schitini, Nardo, Pracinha, Teleco, Carlinhos, Babalaô, o beque de área Bengala, famoso pela defesa que fazia com a cabeça nas bolas altas, e tantos outros que prestigiaram suas agremiações foram recrutados para defenderem os times contratantes e se juntaram aos jogadores locais como Gilberto Cardoso, Edmundo Pereira, Jaci, Milton chefe, Gessé, Quipa etc., formando um grupo de craques famosos como poucos.

Havia uma disputa renhida entre os clubes Real e Portuguesa. Outros clubes compunham o campeonato municipal: Magnesita, Talmag, Vasco da Gama da Magnesita, Flamengo, Arsenal, Santa Cruz (time comandado por seu Albertino) e Fluminense do São Felix (são os times de que me lembro). A maior rivalidade da cidade era entre o Real e a Portuguesa. Muitos desses jogadores ádvenas foram trazidos por Oflávio Torres (Flavinho da Portuguesa), um apaixonado pelo futebol de campo. Carlinhos e Teleco eram mantidos pelo Real com a ajuda do senhor Mário Trindade e outros componentes da diretoria.

Para relembrar, atuaram pelo Real: Dr. Délio Meira, Wilson Farani (goleiro) Érico Dias Lima, Odetino Meira, Pedro, Waldemar, Zuzu Ribeiro, Juarez e Antônio Dualte.

Foi de grande destaque, como incentivador participativo do futebol de campo, o senhor Wilson Gonçalves, contador da Magnesita S.A., entusiasta dessa modalidade de esporte. Ele, inclusive, trouxe alguns jogadores para reforçarem os clubes da Magnesita, oferecendo-lhes emprego com essa finalidade. Pelo seu envolvimento e participação no futebol brumadense, também merece homenagem.

Para a manutenção desses jogadores e outras despesas com o time, a Portuguesa criou o “Bolão da Portuguesa”, por meio do qual os assinantes prognosticavam o placar do clube de sua preferência, sendo esse clube local ou não, além de poder optar pelo empate. Da renda do bolão, era tirada uma porcentagem para o clube patrocinador do jogo. Não havendo acertador do escore, o montante ficava acumulado. As concentrações eram feitas no Hotel São Jorge, de propriedade do senhor Pedro Reis, reconhecido torcedor da Portuguesa, e no Hotel Dois Irmãos, de propriedade de Dona Aurinha, esposa do senhor João Gualberto de Souza, seu Diúta. O público vibrava, prestigiava e defendia as suas agremiações com fervor e entusiasmo. Comentavam-se os resultados em vários lugares, e os fanáticos faziam resenhas pertinentes, com acusações variadas, principalmente contra o árbitro.

Uma particularidade: os árbitros de futebol eram escolhidos entre os jogadores de destaque dos times, em comum acordo com os clubes, para apitarem os jogos do campeonato, desde que não envolvessem as suas agremiações em campo. Dentre esses jogadores, Érico Lima, Valdinho (goleiro da Magnesita) e, mais para a frente, o próprio Inocêncio foram atletas que desempenharam, também, o papel de juiz de futebol naquela época.

Atualmente, o futebol de campo em Brumado está esquecido, abandonado e relegado a segundo plano. Não há incentivo nem apoio para essa modalidade de esporte. Em homenagem merecida a Gilberto Cardoso, falecido em 31/08/2010, brumadense que se destacou por seu talento futebolista, a Câmara de Vereadores de Brumado redenominou, em 18/11/2010, o Estádio dos Prazeres, passando a chamar-se Estádio de Futebol Gilberto Cardoso – “O GILBERTÃO” – o que contou com a aprovação de Inocêncio.

Em Conceição de Feira, Inocêncio vivia com a mãe Silvina Nascimento dos Santos, em companhia de mais três irmãos. Trabalhava num armazém de fumo, um produto da região, utilizado para fabricação de charutos, cigarrilhas etc., mas o que lhe agradava mesmo era uma “pelada”. Praticava o futebol com competência e prazer. Era uma obstinação, havia nascido para isso. Desde menino, mostrou-se interessado pelo futebol.

Fora apresentado por Expedito ao presidente do Real, Mário Trindade, que lhe deu emprego de ajudante de pedreiro, e a Érico Dias Lima, jogador e um dos dirigentes da equipe, com a qual Inocêncio se entrosou rapidamente. Posteriormente, por diligência e necessidade, aprendeu e exerceu a profissão de pedreiro, trabalhando para diversas firmas e para particulares.

Jogou em vários times de futebol, inicialmente no Real, tendo como presidente Mário Trindade, Érico Dias Lima como um dos dirigentes e jogador e a outros componentes da diretoria, entre eles o senhor Edmir Edvar Lobo. Depois, defendeu a Associação Atlética Portuguesa, que foi dirigida pelos presidentes, dentre outros, José Rizério de Carvalho (Juca), Oflávio Silveira Torres (Flavinho), técnico e diretor Neuton Carvalho Torres (Neutinho) e diretores Olavo da Silva Leite, Geonísio Viana (gráficos), Vicente (estatística IBGE) e outros.

Defendeu a seleção de futebol de Brumado, considerada imbatível pelo seu plantel de jogadores experientes. Em razão do seu futebol atraente e por suas duras jogadas de zagueiro viril, Inocêncio foi convidado para jogar no Corinthians de Vitória da Conquista, onde morou por alguns anos. Por todas essas agremiações foi campeão, segundo suas informações.

Inocêncio esteve em outras cidades, como Caculé, Montes Claros e Teófilo Ottoni, mas foi em Brumado que fixou residência, casou-se e teve dez filhos. Hoje, está aposentado por idade e vive esquecido, tendo a fama de outrora como lembrança dos tempos áureos em que brilhou como futebolista.

Além de pedreiro, Inocêncio desempenhou outras funções: foi árbitro da Liga Brumadense de Futebol, guarda-noturno, vigilante da prefeitura no período de 1983 a 2002 e carcereiro na delegacia, por indicação do delegado Gilberto Brito, além de ter prestado serviços afins a outras pessoas.

Conta-se que Inocêncio fora contratado para vigia noturno de uma determinada casa pertencente a pessoa de expressão política da cidade. O vizinho, ao tomar conhecimento desse serviço, solicitou a Inocêncio que também vigiasse a sua residência mediante pagamento combinado. O vigia levava um rádio para se distrair e escutar os programas da emissora Globo, especialmente a irradiação de jogos e as resenhas de futebol, a sua verdadeira praia. Certa feita, estava sendo transmitido um jogo entre Flamengo e Vasco da Gama, times rivais do Rio de Janeiro. A agremiação do dito vizinho, fanático torcedor, estava sendo derrotada. Irritado e contrariado, foi procurar Inocêncio para mudar de estação, pois o placar do jogo estava incomodando-o.

Zé de Braga (apelido que lhe colocaram Gilson Brito, Ronaldo Carvalho, Santos e Ézio Azevedo, frequentadores e amantes do futebol de campo), como sempre fazia, ligava o rádio, colocava-o em um ponto estratégico (nessa época, não havia ladrões como hoje) e saía para um bate-papo descontraído no point da cidade. Só voltava bem mais tarde para o seu posto de vigia.

Ao ouvir o ruído do rádio e não encontrando o vigilante, desligou o aparelho e ficou à espreita, esperando até que ele aparecesse. Ao chegar, o vigia inventou uma desculpa que não convenceu o contratante. Este, aborrecido, desfez o compromisso, alegando que não pagaria para ser enganado. Inocêncio, sabedor de que o vizinho estava furibundo com a derrota de seu clube, ainda tentou acalmá-lo.

Depoimento de Napoleão Barbosa, amigo de Inocêncio e um grande esportista em Brumado, aficionado pelo futebol de campo e um dos presidentes da Liga Brumadense de Futebol: “A vida de Inocêncio é rica em coisas boas. São várias as facetas que pontilharam a sua existência. Tive a honra de conhecê-lo logo que cheguei aqui em Brumado, no ano de 1963, daí para cá, sempre nos demos muito bem. É portador de qualidades que só as têm as grandes figuras humanas. O que sempre pautou a vida de Inocêncio: a fidelidade e o respeito para com os seus amigos. Eu não tenho palavras para enumerar todas as façanhas de Inocêncio quando jogador de bola, contudo, vale dizer que, se fosse hoje, seria um dos maiores craques do futebol baiano”.

Inocêncio defendia as cores do time a que pertencia com a competência de um excelente jogador de defesa e vibrava com as vitórias, escarnecendo os adversários. Usava o esporte-arte visando a um emprego que lhe desse segurança e sustento. Assim, emprestou o seu talento futebolístico e, porquanto o esporte interiorano era amador, dispensava as contratações e os pagamentos formais dos profissionais de hoje.

Fontes:

Erico Dias Lima;

Dagvaldo (Fiapo) Silva Melo;

Entrevista com Inocêncio Nascimento dos Santos.

Antonio Novais Torres

antorres@terra.com.br

Brumado, em 30 de abril de 2012.

Antonio Novais Torres
Enviado por Antonio Novais Torres em 01/10/2014
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