PADRE ANTÔNIO VIEIRA E OS LADRÕES
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Notas Biográficas
Padre Antônio Vieira (1608 – 1697) escreveu muitos sermões, dentre os quais se destacam: Sermão da Sexagésima, sobre a arte de pregar; Sermão de Santo Antônio aos Peixes, em que trata da escravidão do indígena; Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contras as de Holanda, que proferiu por ocasião do cerco dos holandeses à cidade da Bahia; Sermão do Bom Ladrão, que escolhi para retirar alguns trechos, pois apresenta uma visão crítica sobre a corrupção e o comportamento imoral da nobreza da época, e nos leva a refletir sobre a atual corrupção no Brasil.
Navegava Alexandre Magno em uma poderosa armada pelo Mar Vermelho, com o intuito de conquistar a Índia, quando em uma das aldeias conquistadas, trouxeram à sua presença um pirata, que por ali andava roubando os pescadores. Alexandre o repreendeu com severidade por andar em tão mau ofício; porém, o pirata, que não era medroso, nem lerdo, assim respondeu:
— Basta, Senhor! Porque eu roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador?
Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza. O roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres. Mas Sêneca, que sabia bem distinguir as qualidades e interpretar as significações, a uns e outros definiu com o mesmo nome: Se o Rei de Macedônia, ou qualquer outro, fizer o que faz o ladrão e o pirata, o ladrão, o pirata e o rei, todos têm o mesmo lugar, e merecem o mesmo nome.
O ladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno; os que não só vão, mas levam, de que eu falo, são outros ladrões de maior calibre e da mais alta esfera; os quais debaixo do mesmo nome e do mesmo calibre distingue muito bem São Basílio Magno. Não só são ladrões, diz o santo, os que cortam bolsas, ou espreitam os que vão se banhar para lhes colher a roupa; os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem lhes é dado o governo dos estados, ou a administração das cidades, ou ainda a representação do povo; os quais, com astúcia e malícia, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam países e cidades; os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor nem perigo; os outros se furtam são enforcados; estes furtam e enforcam.
Diógenes, que tudo via com mais aguda vista que os outros homens, viu uma grande tropa de políticos e ministros da justiça levar uns ladrões para a forca, e começou a bradar: Lá vão os ladrões grandes a enforcar os pequenos! Afortunada Grécia que tinha tal pregador! E mais afortunadas as outras nações, se nelas não sofre a justiça as mesmas afrontas. Quantas vezes se viu em Roma, enforcarem um ladrão por ter roubado um carneiro; e no mesmo dia ser levado em triunfo um cônsul, ou ditador, por ter roubado um país. E quantos ladrões teriam enforcado estes mesmos ladrões triunfantes? De um, chamado Seronato, disse com discreta contraposição Sidônio Apolinar:
— Seronato está sempre ocupado em duas coisas: em castigar furtos, e em fazê-los. — Isto não era zelo de justiça, senão inveja. Queria tirar os ladrões do mundo, para roubar ele só.
Embora a época do Barroco tenha passado, a produção de textos críticos e religiosos não parou. Escritores contemporâneos têm se ocupado com os dilemas do ser humano quanto à existência ou não de Deus, quanto ao destino do homem depois da morte e quanto ao comportamento ético político e religioso. ®Sérgio.
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Nota: Fiz algumas adaptações no original, para melhor situá-lo no vernáculo de nossos dias.
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