Voz e memórias
Meu avô,
Ressequido como a casca da aroeira.
Firme como o tronco do angico.
Cheiroso...
Confortável e confortante,
Como o tronco da imburana.
Minha avó,
Pequena, frágil e leve.
Como a delicada siriema.
Leve, esperta e ágil,
Semelhante à uma raposa.
Minha mãe,
Sopro de juventude.
Voz fresca,
Naquela casa de velhos.
Bela. Ela é a casa e o aconchego.
Eco de todas as conversas,
Que por lá ocorriam.
Naquele tempo,
Naquele espaço.
Lá, falava-se tudo e de tudo.
A conversa corrente era a regra.
Não havia tempo ou assunto certo.
O certo era a conversa.
Conversar sobre...
..À seca,
À fome – ameaça incessante.
A fé – esperança constante.
Regra de bem-viver.
Conversa que ensina,
Encaminha,
(des)caminha,
Para encaminhar novamente.
As nossas conversas...
Era a cultura.
Era o poder.
Era a política.
Era a moda.
Era a malidiscência.
Era o fuxico.
Era a fofoca.
Era a raiva.
Era... Era...
Era o medo da ameaça da seca,
E suas consequências.
Mas...
Sobretudo era amor,
De compromisso feito.
De responsabilidade vivenciada.
De partilha.
De união.
Nós...
Juntos tecidos.
Juntos vividos.
Juntos morridos.
Assim...
Não há o que (nos) separe.
Pois...
Eles se foram e aqui estão.
Eu...
Estou aqui – certamente me indo,
E estou com eles.
E eles estão em mim.
Se foram e, aqui permanecem,
Não só por lembranças,
Mas, ausências presenças
Espacialmente, memórias Vivas,
[...] a me dizer (a nos dizer),
As regras de bem-viver.
A (re)contar as nossas (minhas) histórias,
Memórias.
Continuidades,
Existência,
Um dia tecidas unidas.
Jamais separadas,
Pois o sopro de juventude daquela época.
Hoje é Voz do tempo.
A me dizer o que bem fazer.