Breve síntese biográfica de um matuto ousado parte 1

Sou matuto sou roceiro

Me criei nos cafundó

Sou sertanejo da gema

Lá das banda dos moco

Lá quando o Sol tá a pino

Castiga o coro sem dó

Campeei gado nas brenha

R a n q u e i t o c o fui carreiro

Morei nin casa de taipa

A d i s p o i s fui ser o l e r o

Fiz tijolo até fiz teia

Pás galinha fiz p u l e r o

Num fiz teia cu'ma aranha

Mas pá c u b r i r os c e l e r o

Donde guardava os provento

T r a b a i o d'um ano i n t e r o

T o m b é m pá fazer tapera

Qui'abrigava us c u m p a n h e r o

Seu m i n i n o se'eu li conto

O c e d i f i c e acredita

A vida de sertanejo

Até parece desdita

Mai juro q'era assim mermo

Quem viu de perto acredita

Nos tempo de t r u v u a d a

As g o t e r a p r e t u b a v a

Pingava pá toda banda

Nos cantinho n o i s ficava

I n c u i d o tá quá pinto

In riba dos moi de fava

Nos tempo de verão brabo

Nas catinga eu mim' fiava

Meu pai c u n 'a i s t r o v e n g a

Ar macambira cortava

F a c h e r o m a n d a c a r u

Era o qui a gente i n c o n t r a v a

Fazia grandes coivara

E os i s p i n h o queimava

Pá mode o gado c u m e r

A p o i s a fome era braba

Antes de 'o fogo apagar

No m e i daquelas coivara

O rebanho i n b o c a v a

Os b i c h i n c u m i a tanto

Qui as veis i n t é se babava

Pá num vê aquelas cena

Meu pai de lá se 'arrancou

Trazendo c'um ele n o i s

Conselhos do nosso avô

Pá mode a gente i s t u d a r

A p o i s se a sorte ajudasse

Uns pudia ser doutor

I s c o l a num tinha lá

Naquelas brenha esquecida

Meu pai juntou toda t r e n h a

Vendeu pá buscar guarida

Vinhemo então pá cidade

Pá recomeçar a vida

Eu já era m u l e c o t e

C'uns doze anos de 'idade

I s t r a n h e i q u i n é m a gota

A vida aqui na Cidade

Mermo assim fui me ajeitando

Pegando capacidade

Mar né q i i s t u d e i poco

Pois p' r u c e eu já t a l u d i n

Vi tanta m u i r f a c e r a

Qui min g r a c e i de verdade

P o q u i n aprendi a ler

Essa 'é a pura verdade

É p u r i s s o qui li conto

Qui é essa minha sina

Sou o avesso do avesso

O raio da c i l i b r i n a

Correndo atras de gado

Me criei la nas campina

Cedo peguei no arado

C a r p i n a v a tangi boi

Assim minha infância foi

Nas brenha lá do cerrado

Amansei cavalo brado

Correndo no m e i do gado

T o m b e m a m a n c e i jumento

Burro, carneiro pá mode

Cambitá tijolo e teia

Pois lá naquelas aldeia

Quando a coisa tava feia

Cambitava i n t e n i n bode

Passava no m e i das guerra

Qui a m u l e c a d a fazia

De badoque e de peteca

Qui durava i n t é um dia

Pedra c u m i a no centro

Mermo assim eu num c u r r i a

Escanchado n'um jumento

Qui nem mermo sela tinha

Me sentia importante

Pois o jegue era 'afamado

Num perdia pá ninguém

Correndo atrás de gado

Pastorei carneiro e cabra

Ovelha vaca e peru

Quando o Sol tava queimando

Logo eu ia m' i m c o s t a n d o

C a r mão cacimba cavando

Na sombra de' um mulungu

Pá poder encontra água

A p o i s a sede era braba

Lá naquela região

Da donde a gente morava

Era assim lá no sertão

Qui a vida n o i s levava

Minha infância assim foi

Labutei desde menino

E mesmo sendo franzino

Topava qualquer parada

Pernoitava nas estrada

Acordava madrugada

Pensamento indo ao léu

Divagava sem limite

Sempre fui contra o alvitre

De quem machucava gente

Do sertão trago a semente

Na cabeça q u i n é m véu

Da macambira e facheiro

Levei muitas s i p u a da

Da casca do pau pereiro

Trago comigo o amargo

Nunca conheci moleza

Do bem bom passei de largo

O sertanejo é assim

Inventa sua destreza

Dá murro in ponta de faca

Pra ele n'um tem surpresa

Aprende cá Natureza

A não aguentar agravo

Pu r'isso as tantas tronchura

Qui rabisquei nesses verso

Mai achei qui era bom

Contá pá todo Universo

Qui a vida de sertanejo

É assim eu atesto.