Conto real- Missa aos Domingos
Já estávamos em 1966.Eu já tinha quase dez anos de idade.Faltavam apenas dois anos para ter essa idade. Bom, mas venho reforçar que já estávamos instalados em nosso lar. Era simples mas era nosso, dos meus pais. E eles não deviam nada a ninguém. Mas infelizmente naquela época ainda existia,como existe até hoje , a preferência por filhos de gente rica. Quem chegasse na cidade, e não possuísse bens, dinheiro , riquezas era um João-ninguém. Automáticamente os meus pais eram e consequentemente nós também. Não adiantava ter um pouquinho de beleza e fosse bem criado, o que pra aquelas pessoas importavam eram os bens materiais. Vou atrás só um pouquinho, para lembrar a vocês que os meus pais se conheceram lá na fazenda do meu avô, não tenho conhecimento de fatos mais relevantes, mas acho que ele veio lá da cidade de Medina-Tuparecê, veio em comitiva a procura de trabalho na roça, ficaram sabendo de compras de terras pros lados da Itinga e pra lá ele foi. Então certamente se conheceram, apaixonaram, foi difícil para eles, por que pelo que eu sei, o meu avô não aprovava a união, mas eles não desistiram por nada e se casaram.Então , retomando o fio da meada, eita que fio longo , heim gente, não sei nem calcular os quilômetros desse fio que foi a minha vida. Só sei que aos oito anos de idade, já freqüentava a segunda série primária. Aliás , lembro muitos detalhes da minha segunda série até a quarta série primária. Além de me sentir discriminada pelo fato de não ser filha de pessoas ricas , me sentia rejeitada pelas turmas que eu ia freqüentando, já recebi vários apelidos, várias críticas quanto a profissão do meu pai, pelo meu modo de vestir, simples, rústico, mas bom, a tudo eu ia suportando com grandeza de espírito, pois tenho certeza,essa certeza que guardo em mim ,e nunca esquecerei disso,tenho convicção
absoluta, fui escolhida por Deus desde o ventre da minha mãe, ou mesmo , até mesmo antes de ser gerada Deus já existia em mim. A terra em que meu pai plantava era tão abençoada, tudo que ele plantava, nascia , e ele colhia. Falando um pouco da cana-de-açúcar, que era das plantações favoritas dele, despontavam as folhagens verdinhas, gomos bem grossos, bastante caldo, muito gostosas, a verdade é que descascava uma cana e ia pra debaixo de uma árvore chupá-la. Era uma distração muito gostosa. Mas só que meu pai resolver vender caldo de cana no mercado, conseguiu um engenho de moer, médio, e numa carrocinha lá ia ele com minha mãe para o mercado, para vender o bendito caldo, associado com um pouco de limão, gelo, que era recolhido na casa dos outros, pois não tínhamos geladeira,principalmente na casa dos compadres que eles iam arranjando, pois a medida que nascia um filho, já ganhava mais um casal de compadres. Era muito engraçado, de repente aparecia as comadres e os compadres em casa, para saber do afilhado. Essas pessoas até que pareciam de boa índole, mas vou falar pra vocês, a vizinhança era só pra bater com a língua, espionar o que estava acontecendo na nossa vida, falar da nossa pobreza dentro de casa, dos filhos que não tinham nem roupa direito, da ida dos meus pais ao mercado todo os sábados, fazia frio, calor, chuva ou seca, eles estavam lá, não perdiam. Nesse momento que escrevo, estou ouvindo uma música , Rotina, de Roberto Carlos, e por incrível que pareça, as lágrimas escorrem pelo meu rosto, ...tive que dar uma paradinha, para enxugar o meu rosto, não é por vergonha da minha vida, e sim pela tristeza, humilhação que meus pais passaram, e pela minha vida solitária, um vazio que me persegue até hoje.Não sei o motivo disso tudo,o por que nasci para passar por tantas provações, acho que Deus teve e tem um propósito na minha vida, não sei o que, mas se não for nesta vida, será um embalo eterno nos seus braços, ah...isso tenho certeza.Uma pessoa não pode passar por tanta coisa assim, sem um dia , seja aqui ou em outro plano, e não ter uma recompensa.Mas cada coisa no seu tempo, estou aqui esperando pelo encaixe das minhas andanças aqui na terra.Bem, o motivo das idas ao mercado , vendendo o caldo, as bananas, as laranjas, o fumo,outros frutos que eram colhidos no quintal, como jacas, jambo ,mangas etc era para comprar o que faltava em casa para completar a nossa alimentação. Realmente foi um tempo muito difícil, às vezes eu pegava os meus pais conversando, como se reclamassem das dificuldades da vida, mas são palavras que ficaram soltas ao vento. Não me lembro mais. O que muito me admirava neles era também que todos os Domingos, eles saíam abraçadinhos para a igreja, e de lá voltavam também abraçadinhos. È uma das lembranças que trago com muito orgulho. Eles vinham da missa, ela de vestido florado,chinelos tipo rasteirinha, delicada,ele, com seu terno azul –marinho, calça e paletó, camisa clara por baixo,já um pouco careca,era uma imagem linda demais, muito emocionante, os meus pais eram católicos, e passavam a crença deles piamente para nós , e nós, ainda crianças também, íamos à missa aos Domingos pela manhã, no repicar dos sinos na Catedral Nossa Senhora dos Anjos, que é a padroeira da cidade, não faltávamos também nenhum Domingo como era de se esperar.Mas fica aí essa minha lembrança guardada em meu coração e registrada aqui neste conto real. Prometo que voltarei para mais um episódio. Me desculpem pelo choro. Foi emoção demais. Até breve.
Autora: Margareth Rafael
Em tempo:foto do meu primeiro casamento. o noivo não está por que não é mais meu esposo. o meu objetivo é mostrar os meus pais.
Já estávamos em 1966.Eu já tinha quase dez anos de idade.Faltavam apenas dois anos para ter essa idade. Bom, mas venho reforçar que já estávamos instalados em nosso lar. Era simples mas era nosso, dos meus pais. E eles não deviam nada a ninguém. Mas infelizmente naquela época ainda existia,como existe até hoje , a preferência por filhos de gente rica. Quem chegasse na cidade, e não possuísse bens, dinheiro , riquezas era um João-ninguém. Automáticamente os meus pais eram e consequentemente nós também. Não adiantava ter um pouquinho de beleza e fosse bem criado, o que pra aquelas pessoas importavam eram os bens materiais. Vou atrás só um pouquinho, para lembrar a vocês que os meus pais se conheceram lá na fazenda do meu avô, não tenho conhecimento de fatos mais relevantes, mas acho que ele veio lá da cidade de Medina-Tuparecê, veio em comitiva a procura de trabalho na roça, ficaram sabendo de compras de terras pros lados da Itinga e pra lá ele foi. Então certamente se conheceram, apaixonaram, foi difícil para eles, por que pelo que eu sei, o meu avô não aprovava a união, mas eles não desistiram por nada e se casaram.Então , retomando o fio da meada, eita que fio longo , heim gente, não sei nem calcular os quilômetros desse fio que foi a minha vida. Só sei que aos oito anos de idade, já freqüentava a segunda série primária. Aliás , lembro muitos detalhes da minha segunda série até a quarta série primária. Além de me sentir discriminada pelo fato de não ser filha de pessoas ricas , me sentia rejeitada pelas turmas que eu ia freqüentando, já recebi vários apelidos, várias críticas quanto a profissão do meu pai, pelo meu modo de vestir, simples, rústico, mas bom, a tudo eu ia suportando com grandeza de espírito, pois tenho certeza,essa certeza que guardo em mim ,e nunca esquecerei disso,tenho convicção
absoluta, fui escolhida por Deus desde o ventre da minha mãe, ou mesmo , até mesmo antes de ser gerada Deus já existia em mim. A terra em que meu pai plantava era tão abençoada, tudo que ele plantava, nascia , e ele colhia. Falando um pouco da cana-de-açúcar, que era das plantações favoritas dele, despontavam as folhagens verdinhas, gomos bem grossos, bastante caldo, muito gostosas, a verdade é que descascava uma cana e ia pra debaixo de uma árvore chupá-la. Era uma distração muito gostosa. Mas só que meu pai resolver vender caldo de cana no mercado, conseguiu um engenho de moer, médio, e numa carrocinha lá ia ele com minha mãe para o mercado, para vender o bendito caldo, associado com um pouco de limão, gelo, que era recolhido na casa dos outros, pois não tínhamos geladeira,principalmente na casa dos compadres que eles iam arranjando, pois a medida que nascia um filho, já ganhava mais um casal de compadres. Era muito engraçado, de repente aparecia as comadres e os compadres em casa, para saber do afilhado. Essas pessoas até que pareciam de boa índole, mas vou falar pra vocês, a vizinhança era só pra bater com a língua, espionar o que estava acontecendo na nossa vida, falar da nossa pobreza dentro de casa, dos filhos que não tinham nem roupa direito, da ida dos meus pais ao mercado todo os sábados, fazia frio, calor, chuva ou seca, eles estavam lá, não perdiam. Nesse momento que escrevo, estou ouvindo uma música , Rotina, de Roberto Carlos, e por incrível que pareça, as lágrimas escorrem pelo meu rosto, ...tive que dar uma paradinha, para enxugar o meu rosto, não é por vergonha da minha vida, e sim pela tristeza, humilhação que meus pais passaram, e pela minha vida solitária, um vazio que me persegue até hoje.Não sei o motivo disso tudo,o por que nasci para passar por tantas provações, acho que Deus teve e tem um propósito na minha vida, não sei o que, mas se não for nesta vida, será um embalo eterno nos seus braços, ah...isso tenho certeza.Uma pessoa não pode passar por tanta coisa assim, sem um dia , seja aqui ou em outro plano, e não ter uma recompensa.Mas cada coisa no seu tempo, estou aqui esperando pelo encaixe das minhas andanças aqui na terra.Bem, o motivo das idas ao mercado , vendendo o caldo, as bananas, as laranjas, o fumo,outros frutos que eram colhidos no quintal, como jacas, jambo ,mangas etc era para comprar o que faltava em casa para completar a nossa alimentação. Realmente foi um tempo muito difícil, às vezes eu pegava os meus pais conversando, como se reclamassem das dificuldades da vida, mas são palavras que ficaram soltas ao vento. Não me lembro mais. O que muito me admirava neles era também que todos os Domingos, eles saíam abraçadinhos para a igreja, e de lá voltavam também abraçadinhos. È uma das lembranças que trago com muito orgulho. Eles vinham da missa, ela de vestido florado,chinelos tipo rasteirinha, delicada,ele, com seu terno azul –marinho, calça e paletó, camisa clara por baixo,já um pouco careca,era uma imagem linda demais, muito emocionante, os meus pais eram católicos, e passavam a crença deles piamente para nós , e nós, ainda crianças também, íamos à missa aos Domingos pela manhã, no repicar dos sinos na Catedral Nossa Senhora dos Anjos, que é a padroeira da cidade, não faltávamos também nenhum Domingo como era de se esperar.Mas fica aí essa minha lembrança guardada em meu coração e registrada aqui neste conto real. Prometo que voltarei para mais um episódio. Me desculpem pelo choro. Foi emoção demais. Até breve.
Autora: Margareth Rafael
Em tempo:foto do meu primeiro casamento. o noivo não está por que não é mais meu esposo. o meu objetivo é mostrar os meus pais.