CARONTE: O BARQUEIRO DAS ALMAS
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Notas Biográficas
"Daqui, uma estrada leva às do Aqueronte¹ (...). Aqui, em meio a especo lodaçal e correntes profundas, um redemoinho regurgita, vomita areia no Cocito². Essas águas são guardadas por um barqueiro sisudo, esquálido – Caronte² – que tem no queixo um tufo de cabelos grisalhos, e olhos como globos em chamas; a capa suja lhe é presa ao ombro por um nó. Sozinho, com uma vara, ele impele o barco, iça as velas e, em seu ofício tenebroso, transporta os mortos – está velho, mas a velhice de um deus é intrépida, vigorosa. Para aqui corre a multidão, fluindo a estas margens; mães, homens, corpos de heróis de almas nobres, agora sem vida; meninos, jovens solteiras, filhos levados à pira diante dos olhos dos pais; são tantos quanto às folhas da floresta que, na primeira geada de outono, despregam-se e caem; tanto quanto os pássaros que, vindos do oceano, convergem para o litoral, quando o tempo frio os lança ao mar, em busca de terras ensolaradas. Lá estão, implorando preferência na travessia, braços estendidos, ansiando pela margem distante. Mas o barqueiro carrancudo escolhe a que transportar, empurrando os demais para longe da orla." Públio Virgílio Marão (70 a. C. – 19 a. C.); Eneida, Livro 6, p.p. 295 – 313.
NOTAS:
1. Aqueronte: Rio mitológico. Cujo nome pode ser traduzido como "rio do infortúnio" e acreditava-se que fosse um afluente do rio Styx, localizado no mundo dos mortos.
2. Caronte: barqueiro velho e esquálido, mas forte e vigoroso que recebia em seu barco. O severo barqueiro somente levava em seu barco as almas dos que receberam os devidos ritos fúnebres; os espíritos dos outros, que ficaram insepultos, não podem passar o rio, mas vagueiam cem anos abaixo e acima de sua margem, até que finalmente seja levado.
3. Na mitologia grega o rio Cócito (o rio das lamentações) é afluente do Estige³ que se limitava com o inferno. Suas águas eram formadas pelas lágrimas dos culpados.
4. Estige: Na mitologia grega, nome de um dos rios do inferno. Às suas margens se agrupavam as almas dos que haviam morrido sem receber honras fúnebres.
5. Na Divina Comédia de Dante Alighieri, o rio Cócito, na primeira parte da obra (Inferno, 9° Círculo): é um rio de gelo, onde estão os traidores. O rio Estige é um pântano, está no 5° Círculo, onde ficam os acusados de ira, inveja e soberba, batendo e se torturando; seu barqueiro é Flégias.
6. Flegetonte é o rio de fogo, que passa pelo Tártaro. Unindo-se ao Cócito formava o Aqueronte. Na Divina Comédia de Dante, o Flegetonte aparece no 7° Círculo do Inferno, no 1º Vale, onde estão os violentos, afogados no rio de sangue fervente. Quanto mais grave o crime, maior a parte imersa. ®Sérgio.
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Imagem: O Barco de Caronte. Óleo sobre tela de Lucas Giordano.
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