Minha história de Vida
Ismênia de Souza Nunes - Ismênia Nunes
Infância
Nasci em São Joaquim, na terra da maçã, no dia 29 de dezembro de 1968, vim para Florianópolis com aproximadamente dois anos de idade. Na época meu pai não tinha nem o segundo grau. Em São Joaquim ele era agricultor e depois trabalhou numa loja de secos e molhados de meu avô. Meu pai chama-se Sebastião Costa Nunes. Um dia ele teve num ímpeto de vir para a Capital estudar. E assim ele fez, trabalhava de dia, vendendo colchas de casa em casa, e estudava de noite. Para fazer o vestibular ele estudou sozinho em casa e foi assim que fez o segundo grau e o pré-vestibular e passou para direito na UFSC, não podia pagar um cursinho. Minha mãe quando solteira tocava piano e era do lar, nunca trabalhou fora, o nome dela: Anézia Salomé de Souza. Antes de ter este nome ela tinha sido adotada por uma família rica da cidade, mas com o casamento deixou de usar o nome deles. Aliás, a família não confirma, mas na verdade minha mãe foi deserdada de forma que parecesse que ela mesma pediu isto, visto que primeiro lhe deram a maioridade. Imagina se uma pessoa que tem posses iria pedir por ela mesma que perdesse a herança. Ela era muito infeliz na casa que morava e um dia resolveu casar-se, o que incitou os pais a deserdá-la. Afinal, o pretendente, meu pai era pobre e não tinha estudo na época. Com o casamento ela deixaria de ser a cinderela da casa. Quem iria fazer as tarefas da casa? Apesar de frequentar os melhores bailes da época, o Lira, tênis clube dentro de casa era mesmo tratada como empregada. Passei toda infância ouvindo a história. Antes de ser deserdada chamava-se Anézia Trompowski Taulois. Filha adotiva de Davi Trompowski Taulois e Alba Lucy Trompowski Taulois. O registro foi feito no dia 18 de abril de 1967 no Cartório Luz – 2º. Ofício de Notas, a tabeliã foi Hercília Luz (filha do ex-governador Hercílio Luz que deu nome a nossa ponte) e o oficial maior José Carlos Kinchescki.
Apesar de ser adotada por uma família de posses sempre viveu com simplicidade. Os belos trajes eram utilizados somente nos bailes do Lira ou em festas de aniversários. Anézia teve uma irmã nesta família de nome Iara Trompowski Ávila, filha de David, mas não de Lucy e que só soube este fato relacionado a maternidade depois da morte de quem tinha como mãe. Os irmãos de sangue de minha mãe, só vim a conhecer quando já era moça, não tive convívio com meus avós e tios maternos. Mas tinha um tio que acabei me sintonizando, era o tio Alcídio, chamávamos de Alcides, ele era bombeiro e era um tio muito legal. Este tio foi criado em um orfanato, meus avós paternos tiveram muitos filhos e não tinham condições de cria-los. Todos foram separados, este tio foi o primeiro que tivemos contato e o mais próximo. Mas não vive mais entre nós.
Meu pai era filho de Orgel Costa Nunes, registrado incorretamente como Orgel Rodrigues Costa, por isto meu pai e nós tivemos mudanças de nomes, tive um primeiro registro com o nome de Ismênia Rodrigues e depois Ismênia de Souza Nunes, mas gosto mesmo de Ismênia Nunes. Claro que o sobrenome francês Trompowski Taulois também era interessante, mas este nome nos foi negado muito antes de eu nascer.
Aliás com relação ao meu nome Ismênia, foi-me dado em homenagem a uma tia que morreu antes mesmo de que eu tivesse nascido. Ela era casada com meu tio Ninias, irmão de meu pai, o nome dela era Ismênia Palma Ribeiro. Meu pai se formou em direito, quando eu tinha nove anos de idade. Ele mesmo arrumou o registro dos nomes. Porém antes de se formar teve o desprazer de ver sua casa pegando fogo, casa esta que nem tinha sido paga. Não sobrou nada, ficamos só com a roupa do corpo. Alguns dias antes do incêndio meu pai encontrou um envelope num determinado lugar, tinha uma boa quantia em dinheiro dentro. Mas em nenhum momento pensou em ficar com ele. Sabendo que aquele dinheiro iria fazer falta para quem o perdeu foi até a Rádio e disse que tinha encontrado o envelope e onde havia encontrado, não dizendo o que tinha em seu interior. Era uma quantia bem grande. Uma senhora idosa procurou a rádio e o envelope descrevendo em que situação tinha deixado, o que bateu com o que meu pai tinha visto. Informou inclusive o valor exato em seu interior. Foi logo depois disto que a casa queimou e o pessoal da rádio sabendo da história fez uma campanha para que ele conseguisse materiais para a reconstrução. Muitas pessoas doaram materiais, e também ajudaram com mão de obra. A casa tinha sido comprada com um adiantamento de salário, na verdade um verdadeiro empréstimo da empresa em que trabalhava. A empresa não era daqui, era de Caxias do Sul, mas isto não fez com que perdesse a vontade de trabalhar. A casa que queimou ficava no bairro Jardim Cidade de Florianópolis, no município de São José. Era o ano de 1974 aproximadamente. Eu tinha quatro anos e minha irmã Maria tinha dois anos de idade. E foi com a ajuda de pessoas que nem conhecíamos que reconstruímos a nossa casa. Na época também tínhamos uma cachorra, pastor alemã e que eu gostava muito, mas infelizmente ela morreu e eu fiquei muito triste, pois só tinha seis anos de idade. Na foto abaixo a casa reconstruída e eu sentada bem do lado da casa da Diana, era esse o nome dela.
Nas férias de verão lembro-me que sempre viajava para a cidade onde nasci São Joaquim no interior de Santa Catarina eu tinha uns seis ou sete anos de idade e recordo-me como era divertido. Afinal era lá que todos os primos e primas se reuniam, além é claro de rever todos os tios e tias que muito gostava, além de meus avós. Aliás minha avó também era minha madrinha, ela sempre pedia para chama-la de madrinha, mas tinha tanto costume de chamar de vô que era difícil acostumar. Foi a melhor época de minha vida, eu tinha mais três irmãs mais novas que eu, mas na pequena cidade de São Joaquim, cada uma escolhia a casa em que iria ficar. Normalmente eu escolhia ficar na casa de uma tia que chamávamos de Lurdinha a qual também tinha quatro filhos, dois meninos e duas meninas. Na foto abaixo estão os três filhos dela, o quarto da foto, o menor era um outro primo. Os três maiores eram os filhos da tia Lurdinha, eram eles: Iolanda Nunes Goulart, a mais velha e que eu mais brincava, eu e ela tínhamos a mesma idade.
As férias era uma época de muita alegria, pois era muito bom rever os primos e primas e podermos nos divertir no sítio que era um pouco afastado da cidade, algumas horas de viagem, não me recordo ao certo se umas três ou quatro horas, ficava num lugarejo chamado São João do Pelotas, pois que o rio de nome Pelotas lhe dera o nome. E foi neste lugar bem perto da natureza em que passei grande parte de minha infância a qual nunca esqueço. Foram dias felizes, às vezes de saudades da família, mas sempre com muitas brincadeiras divertidas.
E foi lá que ao ver tantas coisas bonitas, onde apreciava a natureza que estava em paz. Senti vontade de fazer meus desenhos pela primeira vez.
Agora já eram outras férias acredito que tinha meus doze anos o ano deveria ser 1979, pequei uma folha de papel em branco e sentei-me numa pedra bem em frente da fazenda de meu avô Orgel, sim Orgel Rodrigues Nunes. Ele era muito conhecido na cidade. E foi ali que comecei a traçar minhas primeiras linhas. Cada linha era feita com muita atenção e carinho.
O lugar me inspirava, e nem parecia uma criança que desenhava devido à perfeição dos traços. A cada novo dia eu sentava naquele mesmo lugar, na pedra e desenhava a lápis cada detalhe. Ao final de alguns dias ficou pronto, perfeito, um desenho digno de um desenhista profissional. Modéstia a parte sabia que era sim. Foi a primeira vez que tinha desenhado daquela maneira, guardei com muito carinho aquele desenho. Afinal além da perfeição era a lembrança do sítio de meu avô.
Anos depois, quando fiz quinze anos fui trabalhar com meu pai como secretária em seu escritório de advocacia em Florianópolis, naquele tempo ainda se utilizava a máquina de escrever e eu já tinha feito o curso e devido olhar as letras repeti-o mais duas vezes até conseguir escrever para não mais olhar e escrever rápido, mas isto aconteceu com doze e treze anos de idade, aos quinze já digitava com agilidade e sem olhar para o teclado. O escritório ficava na Rua Visconde de Ouro Preto no centro da cidade de Florianópolis, bem perto do Hotel Flop. Mais ou menos um ano se passou e tive uma grande vontade de desenhar uma casa antiga que eu via pela janela do quarto andar do escritório de meu pai. Já tinha dezesseis anos agora, havia saído do Colégio Henrique Stodieck na Rua Esteves Júnior e entrei para o Instituto Estadual de Educação na Mauro Ramos, também no centro da cidade de Florianópolis. Foi mais ou menos nessa época em que meus pais se separam daqui para frente cada irmã foi morar numa casa, em cidades diferentes. Eu logo casei. Depois dali não convivi com minhas irmãs.
Nesta escola, o Instituto, também conhecido como IEE, um dia observei um homem negro que desenhava numa das salas da escola, acredito que era o desenhista de lá. Falei de minha aptidão para o desenho, ele pediu que eu levasse os tais desenhos para que ele pudesse ver e avaliar. Assim eu fiz, peguei meus desenhos e mostrei a ele. Ao ver os desenhos aquele homem que era profissional olhou e disse-me: - Você desenha muito bem, você fez algum curso de desenho? Respondi negativamente. Ele então disse: - O tipo de desenho que você faz são desenhos acadêmicos, você tem riqueza de detalhes. Foi então que ele me disse que haveria uma exposição na escola e pediu que eu participasse, deixei os desenhos com ele sem ter feito qualquer inscrição, sem pegar qualquer comprovante. E para meu azar não preciso nem dizer que nunca mais vi os tais desenhos. Dias depois procurei por ele, e este disse-me que já tinha me entregado os desenhos e que eu não lembrava. Sabia que não tinha pego, voltei mas o homem não estava mais na sala. Perguntei na escola, na direção ou na secretaria, não me recordo exatamente. Informaram-me que ele não trabalhava mais na escola. Eu não sabia nada daquele homem, era mais ou menos o ano de 1985/86, nem sabia seu nome, nada. Senti um grande aperto no peito quando lembro-me que perdi aqueles desenhos únicos e que tanto significavam para mim, eles faziam parte de minha vida, de minha infância, de minha adolescência.
Hoje já tenho mais de quarenta anos, fiz alguns poucos desenhos, um deles da ponte Hercílio Luz, mas nunca mais tive vontade de desenhar como antes. Achei que nada podia fazer para recuperá-los, na verdade nem sei se os desenhos ainda existem. Depois destes acontecimentos só fiz o desenho da Ponte Hercílio Luz, na verdade existem três desenhos originais pois que só o fiz a pedido de amigos. Um deles está comigo, outro com meu amigo Gerson L. Tavares que é um grande amigo da família e que nos momentos difíceis tem auxiliado a mim e meus filhos. Além dele uma amiga também tem sido muito presente, e nos tem auxiliado em muitas coisas. Ela é a Liliam M. Beltrão Campos, muito tenho a agradecer a estes amigos.
Ainda falando dos desenhos, o primeiro retratava a fazenda de meu avô, já o segundo uma casa antiga, a casa que tinha abrigado o Banco do Brasil nos anos 80 localizada na frente do Flop e que hoje abriga as instalações do Badesc – Banco de desenvolvimento do Estado de Santa Catarina. O desenho, ao qual me refiro tinha cada detalhe da casa. Desenhava por inspiração e não me sinto mais inspirada a desenhar. Depois dali comecei a escrever, a escrita me acompanha desde 1984, na verdade antes de deixar de desenhar já tinha iniciado a escrita com alguns poemas, tenho muitos poemas e contos, o que dá pra fazer alguns livros. É claro que tudo que escrevo registro na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, afinal com isto garanto meus direitos autorais.
Mãe e filhos
Agora, em 2012 faço o curso de jornalismo (bolsa) e já escrevi vários estilos de textos. Desde crônicas, contos, artigos, poemas etc. Também tenho dois romances que ainda não pude publicar. Falta fazer a correção e o projeto, sem falar que a publicação em si é muito dificultosa e cara, principalmente por ter dificuldade financeira. Mesmo com as leis de apoio à cultura, preciso fazer o projeto, coisa que acredito que iriei aprender no curso ainda. Além do mais, tenho dois filhos que criei sozinha, sou mãe e pai, a vida nunca foi muito fácil e tenho feito o possível para que ela possa ser melhor para meus filhos, infelizmente nunca contei com o pai deles. Aliás, este só me trouxe problemas. Fui casada com o pai das crianças por quatorze anos e tive que me separar dele quando meu filho ainda tinha dois anos de idade, ou era isso ou não sei o que seria de mim e de meus filhos, pois o homem tratava-me muito mal, com desprezo e ameaças, além de ser indiferente ao meu amor, resolvi então que seria melhor seguir minha vida sozinha com meus dois filhos, mesmo com dificuldades. E foi assim que fiz. Depois de algum tempo ele casou-se novamente, eu estava desempregada e havia um programa do governo chamado bolsa família e quando fui cadastrar-me descobri que a mulher de meu ex-marido havia cadastrado meus dois filhos no nome dela tendo declarado que eles residiam com eles, a senhora que fez o cadastro ainda disse, coitadinha das crianças morando com a madrasta. Uma mentira que ela inventou para pegar o auxílio. Quando descobri tentei reverter o caso mas, para que isto fosse feito teria que ir até Brasília, era todo um processo, assim foi feito, e enquanto isso fiquei sem receber o auxilio do governo e sem trabalho. Movi um processo contra a esposa de meu ex-marido o mesmo foi suspenso com a condição de que ela não viajasse e que pagasse um valor para uma instituição de caridade. Depois disto os dois não me deixaram mais em paz. E para sustentar meus filhos, fazia faxinas; e foi assim por muitos anos, eu já tinha mais de trinta e cinco anos e conseguir emprego fixo não era tão fácil. Anos depois consegui um trabalho como vendedora externa, mas não tinha hora, trabalhávamos até tarde, sábado e domingo e feriado. Afinal, quanto mais trabalhasse mais ganhava, consegui ser campeã de vendas. Algum tempo depois a empresa estava quase falida e toda equipe de vendedores foi despedida. A empresa manteve apenas alguns funcionários de telemarketing. Mais uma vez, fiquei sem trabalho. E a dificuldade de conseguir outro com a idade de quase quarenta anos foi aumentando. Em casa também capinava e plantava no quintal, por sorte que tinha ajuda de meu filho.
Trabalho pesado
A faxina foi minha única alternativa. Minha coluna e minhas mãos começaram a sentir o resultado de tanto trabalho, às vezes dependendo da cliente chegava à trabalhar doze horas. Mas tinha uma pessoa em especial, uma que eu tinha gosto e amor em trabalhar, ela era amável, amiga e sempre que podia me auxiliava. Chamava-se Beatriz, Beatriz Goulart, aliás, o mesmo sobrenome da tinha Lurdinha, mas a dona Beatriz não era parente. Apesar de não ser parente, tratava-me como uma filha, de igual para igual. Eu era como da família, sentava-me a mesa com a família dela, ela se importava com minha vida e com meus filhos. Apesar de já ter certa idade ela sempre trabalhou em causas sociais e religiosas. Nos primeiros dias fiquei surpresa ao vê-la tocando violão tinha quase setenta anos, mas era uma mulher superativa. Ajudava na igreja, dava catequese, cantava e tocava violão muito bem. Participava todo ano das missões na Bahia, ela ia a pé casa por casa fazendo trabalhos voluntários a favor dos pobres. Visitava prisão e tinha um trabalho no São Lucas. Uma verdadeira cristã. Quando estava na casa dela, eu não era a faxineira, não era assim que me tratava. Era sim, uma verdadeira amiga, uma mulher nobre, que se importava com as pessoas. Não era a faxineira que almoçava à mesa com ela. Era uma pessoa, uma pessoa que tinha seus problemas e dificuldades para cuidar de seus filhos. Por que um dia ela também ficou viúva com seus quatro filhos pequenos e sabia que a vida não era fácil para uma mulher sozinha. Ela era conselheira e amiga. Quando ia embora, se despedia de mim com um beijo e um abraço. Família? Eu tinha, mas havia ficado na infância.
Agora era cada um por si. Com a separação, a casa tinha ficado comigo, mas ainda faltava colocar em meu nome. Era uma casa de madeira velha. Mesmo assim, foi motivo de muitas brigas e disputas em família e nestas brigas o aperto no peito por saber que a casa era mais importante do que o amor que tínhamos entre irmãs. Cada vez que eu tentava falar do assunto para que pudesse colocar em meu nome já que era presente de casamento, sempre havia discussões, os finais de anos viravam motivos para brigas, choros e tristezas. Até que um dia resolvi que não mais iria me reunir com a família, desta forma não precisava mais me angustiar com tantas discussões. As brigas me causavam angustias e insônias. Faz pelo menos quinze anos que vivo sem este convívio de irmãs, de pai e de mãe. Na verdade acredito que faz mais tempo. Às vezes até falo com meu pai, mas em sua correria, em seu trabalho não tem tempo para parar para uma visita, se o faz é correndo. Duas irmãs moram em Curitiba, e uma outra aqui, mas esta, não fala comigo por que não deixei que viesse morar ela e os dois filhos comigo. Na época estava também sem trabalho e faltava tudo. Depois morava sozinha a anos, a casa tinha seus horários e regras e que ela já tinha deixado claro que teríamos que rever, um dois filhos já era adulto, vinte anos, claro que minha casa não seria mais minha, perderia o que tinha conquistado nos vinte quatro anos que aqui vivi. Como ela não poderia compreender isto. Mas ela não me pediu para morar comigo por não ter casa, muito pelo contrario, tinha a dela, mas queria que virasse renda aluguel, enquanto eu teria que perder minha liberdade e dividir minha casa com mais três pessoas, uma casa super pequena e caindo, o telhado estava podre, o chão também.
Minha vida passou a ser somente eu e meus filhos. Tivesse pão ou não, sabia que não podia contar nem com o pai deles, nem com a família, cada qual estava envolvida com seus problemas. Quando fazia faxina na casa de D. Beatriz e que conversávamos sempre dizia a ela que um dia voltaria a estudar, que queria fazer faculdade, queria fazer jornalismo. Demorou, mas eu consegui. Agora estou estudando, minha vida ainda não mudou consideravelmente, ainda está difícil, mas mudou muito. Antes de entrar, estudei muito sozinha e passei no Enem, ganhei bolsa. No momento me dedico somente aos estudos, ainda não trabalho. Procuro por estágio, mas como faço muitas aulas em horários diferentes não é muito fácil fechar.
Na época tinha um moço que eu gostava, namoramos por cinco anos, mas o amor que eu sentia por ele não era correspondido. Consegui um trabalho sem registro trabalhando com empréstimos consignados. Como tudo em casa já era velho precisei comprar: fogão, geladeira e computador para trabalhar com os empréstimos. O trabalho estava indo bem, e estava confiante que tudo iria melhorar. Mas como alegria de pobre dura pouco, não demorou que fosse tudo por água abaixo. O trabalho com os empréstimos dependia do governo que cortou as margens dos funcionários públicos, mas havia uma esperança de que a margem voltasse, aguardei por três meses. Na época a pessoa que estava comigo já tinha ido trabalhar em São Paulo, para ele também a vida não estava fácil. O tempo passava e nada do governo liberar as margens, e para não deixar de pagar minhas contas pedi um empréstimo ao banco. Afinal tinha um depósito razoável devido aquele trabalho. Depois daquele empréstimo, outro para pagar o empréstimo anterior, sempre confiante que as coisas iriam voltar ao que era antes. Depois, outro e outro. O tempo ia passando e nada. Tinha perdido tudo, o trabalho, o marido, aliás, este nunca tive. Ademais, o ex-marido não foi exatamente uma perda. Pois que nunca foi um marido de verdade. E nem quando me deixou com os dois filhos pequenos soube ser correto, deixando-se com todas as dívidas: Luz, água, telefone, etc.
Depois perdi o namorado, o homem que amava. E não podia esperar que voltasse. Ficou bem claro que iria definitivamente para São Paulo em busca de uma melhor situação de vida, antes de ir auxiliei-o com o empréstimo que havia contraído, ao que não me pagou. Isto antes de minha situação piorar é claro. Quando amamos, não buscamos recompensa, fazemos por amor. Mais de um ano já havia se passado a situação não melhorou.
O Noivo
Conheci uma pessoa que me pareceu uma boa pessoa e nos apaixonamos. Percebi que ele seria um bom homem para cuidar de mim e de meus filhos, sentia-me só, sem família, sem ninguém. Apostei tudo naquela relação. Ele me pediu em casamento, por muito tempo nos comunicamos. Ele não era de minha cidade, morávamos muito longe um do outro. Mas eu precisava acreditar em algo, em alguém e tentar ser feliz. Tempos depois, marcamos o casamento e como ele tinha uma grande família e eu não mais convivia e nem contava com a minha, fui até o encontro dele para casarmos. Tínhamos nos conhecido na internet. Ainda tinha crédito no banco o que foi suficiente para dar uma entrada na passagem e parcelar o restante. Quando nós voltássemos casados ele que era mecânico abriria um negócio aqui com meu auxilio e iriamos trabalhar juntos, eu atendendo os clientes e ele arrumando os carros. Por nove meses combinamos tudo e continuamos a nos falar pela internet. Na época eu não quis falar para minha família do assunto, afinal se eu não podia contar com ninguém para sustentar meus filhos, se vivia só, se tinha trabalho ou não ninguém se importava mesmo. Depois minha família era por demais tradicional e não me compreenderia. Era um risco que teria que correr. Porque teria que pedir opinião quando resolvi que iria casar-me novamente? O moço não era do Brasil, eu sabia que minha família não iria apoiar-me, mas que diferença faria? Afinal até aqui tinha sido eu e meus filhos. Eles já estavam grandes. Agora com uns 10 e 12 anos. Ele seria o pai que meu ex-marido não havia sido pois tinha sido sempre um pai ausente e inconsequente, era uma dificuldade para pagar a pensão. Meu noivo falava muito dos filhos que tinha e cuidava também sozinho.
Já o pai de meus filhos, não se importava se estavam bem ou não, se precisavam de algo, se tinham comida, remédio, material escolar, etc. Tinha que pedir sempre aos conhecidos o material escolar, aliás aos amigos, porque conhecido não fazia o que eles faziam por mim, amigos mais que irmãos.
Aliás, o pai havia até se afastado por dois anos dos filhos com a desculpa que eu havia proibido a visita, a desculpa era somente para me processar. Depois desses dois anos ele voltou a ver as crianças, que já tinham sofrido muito com sua ausência. Aliás a filha principalmente que muito chorava com saudades do pai. Algumas vezes até tentei ligar para ele, mas não adiantava, ele desligava, tudo a mando da mulher que ele vivia. Ela mesmo havia mandado mensagens em meu celular dizendo-me que não era para ligar para ele pois que ele não atenderia. Era para as crianças, mas o egoísmo era maior que tudo. Uma atitude desumana em que nada parecia com atitude de pai, aliás atitude de pai ele nunca teve. Um dia quem sabe cai a ficha. Deus não dorme.
Voltando a história do casamento, comprei a passagem, o passaporte e deixei meus filhos na casa da avó. É claro que não disse que iria para o exterior, e sim para São Paulo, o que não foi em todo inverdade, afinal eu passaria por lá. Mas os avós não entenderiam e não apoiariam minha resolução. Não podia dizer que iria para fora do país, somente minha irmã sabia. Quem sabe era minha chance de ser feliz. De ter uma família. Precisava fazer o que era melhor para mim e meus filhos.
Uma grande amiga me ajudou com dinheiro pra viagem a Claudinete, a qual sou muito grata, e também nutro um enorme carinho. Ela também me levou ao aeroporto. Eu estava muito confiante e feliz. A viagem saiu de Florianópolis até São Paulo, Congonhas e teve escala na Guatemala. Em todos os voos ia conversando com alguma pessoa, entre elas Paraguaias, Bolivianas, casais de brasileiros e a todos contava que estava indo para me casar na República Dominicana, e que ainda tinha dois filhos e que voltaríamos para viver no Brasil. Antes da viagem tive que providenciar uma certidão de casamento com tradução juramentada. A viagem foi tranquila. Foram doze horas de voo até a República Dominicana. E a cada troca de avião era uma emoção, era a primeira vez que viajava de avião. Sabia que meu pai e meus familiares iriam achar uma loucura essa minha decisão, mas era minha vida e eu já havia sofrido muito, tinha o direito de ser feliz e fazer algo por mim, mesmo que para isto tivesse que viajar para tão longe e encontrar o homem que iria amar a mim e a meus filhos. Afinal o que eu tinha tido de felicidade até aqui? Só dificuldades e sofrimento, se não desse certo, pelo menos eu tentei, pelo menos arrisquei e não iria ficar me lamentando por nem haver tentado. Além disso, valeria pelo passeio. Brasileiro ou estrangeiro, qualquer casamento poderia dar certo ou não. O pai de meus filhos já havia negado os mesmo com um pedido de DNA, e nunca teve motivo para duvidar de minha honestidade, aliás naquele tempo, em 87 casava-se virgem, e eu casei, hoje isto não tem valor, mas naquela época tinha muito. Posteriormente saiu o resultado que comprovou a paternidade, mas o que ele queria na verdade era um motivo para não pagar a pensão. Agora eu tinha direito de ser feliz. Era o ano de 2009 e eu já estava com meus 39 anos, e muito tempo já havia passado desde meu casamento aos 18 anos de idade.
Viagem ao Caribe
Mas voltando a viagem. Eu já não via mais a hora de chegar e conhecer aquele país do Caribe e as pessoas que me aguardavam, conhecia toda família dele pela cam, a mãe, o irmão, os primos, os tios e até os amigos. Todos com semblante de alegria por me conhecer... Ao falarmos pela cam todos manifestavam muito contentamento com o casamento. Pela câmera observava-os cantando e dançando mesmo sentado, o povo caribenho era um povo muito alegre, maior parte da população era negra. Não tinha preconceito quanto a isso, acredito mesmo que: a bondade, a honestidade e as qualidades de uma pessoa não está na cor de sua pele.
Lembro-me da chegada ao aeroporto. O avião ia baixando e pude ver o verde lá em baixo. Por um momento fechei os olhos e vi claramente meu noivo que me esperava, Ramon se chamava, era uma imagem clara, como que um Flesch, voltei a mim como que eu tivesse saído do corpo, avistado ele e voltado num sobressalto. O avião pousou, ouvia em espanhol o anuncio de sua chegada. Quando deixei o avião tive que passar por vários guichês até poder sair e me dirigir para o saguão. Quando liberada senti uma alegria muito grande por poder ir ao encontro de meu noivo que sabia, me aguardava. O caminho era extenso e a ansiedade era grande. Estava eu com um carrinho enorme e pesado me dirigindo até o local onde todos esperam os que haviam chegado de viagem.
A porta se abriu e passei. Fui andando e podia observar uma multidão dos dois lados, esperavam os que chegavam. Quando de repente avistei meu noivo, sim porque não era só de nome, já usávamos alianças mesmo estando longe. E respeitávamos um ao outro mesmo com a distância de milhares de quilômetros. Ao avistá-lo abri um grande sorriso e fui em sua direção, ao nos aproximarmos nos beijamos era uma alegria por estarmos ali, parecia que já nos conhecíamos a anos. Era nosso primeiro contato físico. Muitos chamariam de loucura, pode ser, mas nunca podemos abrir mão da felicidade por medo de tentar, ou por que nos importamos com o que os outros vão pensar ou dizer. Ali também estava seu primo-irmão. O primo que conversava comigo ainda antes dele e que nos apresentou, era universitário. Fomos em direção a Pick Up para então irmos conhecer seus pais pessoalmente. Ramon pega o telefone e liga para a família. Todos querem receber minha visita. É uma grande alegria quando chego e sou apresentada, primeiro ao pai, depois a mãe e a filha dele. Sim ele tinha uma menina de doze anos, que tinha a mesma idade de minha filha. Senti-me em família, aliás, o povo daquele lugar dá muito valor a família, e isto me aproximou ainda mais deles, afinal não tinha este mesmo tipo de família presente e unida. Foram dias visitando tios, primos, tias, etc. Aquelas pessoas eram alegres, unidas. Senti que gostaram muito de me conhecer. Estava mesmo em família. Sentia-me em família. A música fazia parte dos dias daquelas pessoas. Era um povo muito pobre, mas alegre e hospitaleiro.
Conheci algumas praias, praia como Punta Cana e até um lugar onde havia grandes cavernas.
Mas isto já é outra história, o resto, aliás, tudo o que aconteceu está escrito no livro que ainda não foi editado o nome do livro não poderia ser outro: “Duas Ilhas e um Amor.” Além deste também escrevi outro “O Segredo de Norberto”, não publicado. O segundo não perde para o primeiro. Ambos baseados em fatos reais.
(Você poderá ver este e outros textos também no meu blog, lá ele estará com ilustrações e fotos, acesse http://blogismenianunes.blogspot.com)
Ismênia Nunes