QUEM FOI FRANCISCO DE MONTEZUMA?
Artigo publicado na revista do
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros (Volume IX).
Rio Pardo de Minas e São Romão foram os primeiros e únicos municípios criados na região norte-mineira por Decreto Regencial no dia 13 de outubro de 1831, primeira metade do século XIX. O Decreto Regencial foi assinado por José Lino Coutinho, Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império. Até então, toda a região norte-mineira pertencia à Comarca do Serro Frio. O período regencial durou dez anos entre 1831 e 1841, entre a abdicação de D. Pedro I (1831) e a coroação de D. Pedro II (1841), quando teve sua maioridade proclamada.
Em sua monumental obra literária sobre a história da região de Rio Pardo, ÂNGELIS (1973: 71-72) descreve a Resolução de 13 de outubro de 1831 que criou as duas vilas:
“A Regência, em nome do Imperador o Senhor D. Pedro II, Há por bem Sancionar e Mandar que se execute a seguinte Resolução da Assembléia Geral Legislativa, tomada sobre outra do Conselho Geral da Província de Minas Gerais:
Art. 1º. – Ficam creadas villas na província de Minas Geraes as seguintes povoações:
(...);
4ª. – A povoação do Rio pardo, compreendendo no seu termo a freguesia do mesmo nome, e a de S. Miguel de Jequitinhonha;
5ª. – A povoação de S. Romão, compreendendo no seu termo o julgado do mesmo nome, e do Desemboque;
(...).”
Art. 1º. – Ficam creadas villas na província de Minas Geraes as seguintes povoações:
(...);
4ª. – A povoação do Rio pardo, compreendendo no seu termo a freguesia do mesmo nome, e a de S. Miguel de Jequitinhonha;
5ª. – A povoação de S. Romão, compreendendo no seu termo o julgado do mesmo nome, e do Desemboque;
(...).”
Quase dois anos depois, no dia 24 de agosto de 1833 é instalada a Primeira Câmara Municipal da Vila do Rio Pardo, para o período de 1833 a 1836, com a posse dos primeiros vereados eleitos: Manoel Zeferino Ribeiro (presidente), João Nepomuceno Moreira de Pinho (vice-presidente), José Teodoro de Sá, Donato Francisco Mendes, José Cardoso de Araújo, Plácio José Ferreira e Henrique Manuel de Almeida. A instalação e posse foi em sessão presidida pelo padre Carlos Pereira Freire de Moura (posteriormente eleito Bispo de Mariana), presidente da Câmara Municipal da Vila de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Minas Novas do Arassuahi (atual município de Minas Novas), Comarca do Serro Frio, de onde o território da nova vila foi emancipado (ÂNGELIS, 1973: 199-201).
O território da Vila do Rio Pardo foi dividido nos seguintes distritos: Rio Pardo (sede), Rio Preto, São João, Nossa Senhora de Oliveira, Santo Antônio de Salinas, Santo Antônio da Barra de Itinga e Arraial da Sétima Divisão (São Miguel).
O que pouca gente sabe é a circunstância em que foi criada a Vila do Rio Pardo. Pode-se afirmar que foi ao acaso em razão da passagem de um baiano no povoado em 1831 com o nome de Francisco Gê Acayaba de Montezuma. Procedente de Salvador e com destino ao Rio de Janeiro, Francisco Montezuma utilizara aquela rota à cavalo.
Ao passar pelo povoado de Rio Pardo ali ficou por alguns dias para descansar e seguir viagem. Com isso teve algum contato com algumas pessoas, principalmente com o líder local Conrado Gomes da Silva, filho de João Gomes da Silva e Thereza de Jesus Caldeira, e sobrinho do terceiro contratador de diamantes, Felisberto Caldeira Brant. As pessoas simples do povoado logo ficaram sabendo que aquele visitante era deputado e possuía alto prestígio junto a Alta Corte Regencial (1831-1840) no Rio de Janeiro.
Agradecido pela boa recepção do povo local se colocou à disposição do povoado para atender qualquer solicitação ao seu alcance. Localizado em um ponto distante do sertão norte-mineiro, com uma economia primitiva, refém da exploração decadente dos diamantes e sem qualquer tipo de influência política, os rio-pardenses vislumbraram naquele homem a possibilidade de pleitear na Corte a elevação do povoado à categoria de Vila (equivalente a município atualmente), uma antiga aspiração local. Este, comovido com a recepção e dos apelos e justificativas, principalmente de Conrado Gomes da Silva, se colocou à disposição para ser porta-voz junto à Corte.
Pouco tempo depois de sua passagem pelo povoado de Rio Pardo, foi publicado Decreto Regencial elevando a povoação à categoria de Vila no dia 13 de outubro de 1831. E, mais, Conrado Gomes da Silva foi nomeado Tenente-Coronel da Guarda Nacional.
Comovido e grato, o povo de Rio Pardo rebatizou o nome do povoado de Água Quente para Montezuma em sua homenagem. O lugar é muito famoso por suas fontes termais e possui grande potencial turístico.
Mas, quem foi esse homem responsável pela criação da Vila do Rio Pardo em 1831, que desencadeou processo de surgimento de novas vilas a partir de então?
Francisco Gê Acayaba de Montezuma nasceu em Salvador, Bahia, no dia 23 de março de 1794 com o nome de batismo de Francisco Gomes Brandão, filho do comerciante português Manoel Gomes Brandão e da mestiça brasileira Narcisa Teresa de Jesus Barreto.
Ainda jovem, tentou a carreira militar, mas foi obstado pela sua família que se opôs. Estimulado pela família, em 1816 foi para Portugal estudar na tradicional Universidade de Coimbra onde se formou na Faculdade de Ciências Jurídicas e Filosóficas em 1821. Retornando para a Bahia torna-se defensor ardoroso da independência.
Proclamada a Independência em 1822, abandona o nome de batismo passando a se chamar Francisco Gê Acayaba de Montezuma como forma de se opor ao colonialismo lusitano. Como prêmio por sua participação nas lutas, o Imperador D. Pedro I concede a Francisco Montezuma o título de Barão de Cachoeira, que foi recusado, porém aceitou ser agraciado comendador da Imperial Ordem do Cruzeiro.
Francisco Montezuma ingressa na política em 1823 e eleito deputado pela Bahia indo para a Corte. Ali exerce ferrenha oposição ao Ministro da Guerra. É preso e exilado na França por oito anos.
No seu retorno ao Brasil é eleito para a Assembleia Geral Constituinte de 1831. Torna-se o primeiro deputado brasileiro a levantar bandeira contra o tráfico negreiro se colocando como um dos pioneiros do movimento abolicionista.
Em 1837 é nomeado Ministro da justiça e dos Estrangeiros. Ocupou, ainda, o cargo de Ministro Plenipotenciário (diplomata) junto ao Império Britânico.
Em 1850 foi nomeado Conselheiro de Estado, e em 1851 se elege Senador por seu estado natal, Bahia.
Foi fundador e primeiro presidente do Instituto dos Advogados do Brasil e um dos membros-fundadores do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil.
Recebeu o título de Visconde com Grandeza (Grande do Império) com o Decreto Imperial de 2 de dezembro de 1854. Foi ainda comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e condecorado com a medalha da Guerra da Independência.
Francisco Gê Acayaba de Montezuma teve lugar de destaque na história da Maçonaria do Brasil. Em 12 de março de 1829, então no exílio, recebe do Supremo Conselho dos Países Baixos, hoje Bélgica, uma carta de autorização para instalar um Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito no Brasil. De volta ao Brasil, instala o Supremo Conselho, usando a autorização do Supremo Conselho da Bélgica em 12 de novembro de 1832.
Figura polêmica e contraditória, Francisco Gê Acayaba de Montezuma foi pessoa importante durante o Segundo Reinado. Faleceu no Rio de Janeiro no dia 15 de fevereiro de 1870, aos 76 anos.
Sua breve passagem por Rio Pardo em 1831 foi um marco histórico para a região do Alto Rio Pardo, hoje compreendida como microrregião de Salinas, e região norte-mineira. Culminou com o início de mudança na geopolítica da região com o surgimento de novas vilas e termos. Atualmente, a microrregião de Salinas é composta por dezessete municípios e área geográfica de 17,8 mil quilômetros quadrados. A população é de 209,2 mil habitantes (Censo IBGE, 2010). O povo da região deve render a Francisco Gê Acayaba de Montezuma todas as homenagens.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ÂNGELIS, Newton Cônego. Efemérides Riopardenses. Salinas: R & S Arte
Gráfica, 1973.
NEVES, Antonino da Silva. Corografia do Município do Rio Pardo. Montes Claros,
2008 (edição especial em homenagem aos 100 anos de nascimento do Autor).
PIRES, Simeão Ribeiro. Serra Geral: Diamantes, Garimpeiros e Escravos. Belo
Horizonte: Cuatiara, 2001.
SITE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Francisco_J%C3%AA_Acaiaba_de_Montezuma.
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