DE JORNALEIRO A JORNALISTA - uma história de vida (THEOMÁRIO PINTO DA COSTA/DULCE PINTO DA COSTA - PAIS ADOTIVOS)
THEOMÁRIO PINTO DA COSTA / DULCE PINTO DA COSTA
Eu tinha onze anos e pesava pouco mais de 30 quilos quando passei a morar com o casal Theomário Pinto da Costa e Dulce Fernandes Neves Pinto da Costa.
Fui apresentado a eles pelo pedreiro José Campos da Silva, que tinha uma micrempresa de construção e para quem datilografava os recibos. José Campos fazia uma obra na casa dos Costa
Passei a ser criado como filho. Ele não tinha filho homem, só tinha um de criação, Luiz Augusto, filho de uma cunhada dele, irmã da esposa. Tinha, também, uma filha, Thelma Fernandes Pinto da Costa que, depois, pelo casamento, passou a se chamar Thelma Castelo Branco.
Moravam na casa, além dos outros: uma índia chamada Mercedes, conhecida como “Maricota”, Maria Meirelles, cozinheira que, depois de estudar foi ser professora no município de Autazes. Reinaldo Fernandes Neves Filho, o “Nadinho”, filho do primeiro Governador do então Terri-tório de Roraima, o Carlos Alberto, o “Cacau” e a Eliane, hoje uma con-ceituada médica pediátrica, casada com o Francinete Teixeira, filho da tradicional família do Sr. José Leite.
Havia também a dona Zizi, também baiana, mãe de Dulce Fernandes Neves Pinto da Costa, a esposa do Dr. Theomário. Dona Zizi, como eu me acostumei a chamá-la, era uma pessoa incrível. Foi quem me deu o primeiro presente que ganhei na vida – um cavalinho feito todo em cou-ro. Contudo, para merecê-lo, tinha que mostrar, diariamente, minhas notas da escola primária “Adalberto Valle”. Quando ela encontrava al-guma nota abaixo de 10, aconselhava-me a estudar mais um pouco para tirar notas melhores porque eu era “inteligente e tinha potencial”.
O Dr. Theomário, que também era professor da Faculdade de Medi-cina e já tinha sido deputado estadual e Secretário de Estado da Saúde, aos sábados, sempre de bermuda branca e sandálias da mesma cor, espe-rava-me acordar – o que sempre era cedo, e mandava-me comprar cartei-ra de cigarros “Carlton” – ele fumava muito, por isso talvez tenha faleci-do vítima de câncer nos pulmões.
Depois que eu voltava da compra, olhava de soslaio para o carro Cor-cel I, da Ford, amarelo, que ele usava e dizia para mim:
- Acho que meu carro está um pouco sujo na lateral. Isso era o sinal para eu pegar água, escova e ir lavá-lo. Nem sempre estava sujo, mas eu tinha que bater os tapetes também. Era um ritual de todos os sábados. Depois disso, tinha que passar cera vermelha num imenso pátio que divi-dia a casa principal de uma segunda casa aos fundos, onde todos comiam juntos - menos eu, que comia antes para poder ir à escola. Durante a semana, semana, dava banho na cachorra “Leika”. Aos finais de semana, terminadas as tarefas, eu recebia meu dinheiro para ir ao cinema.
O Luiz Augusto, adolescente, seperava a comida no prato e era chato para fazer suas refeições. A Dra. Dulce chegou do seu consultório tra-zendo um embrulho nas mãos e perguntou para a Maria Meirelles:
- O que a senhora fez para o almoço de hoje?
- Quiabada, como a senhora pediu!
O Luiz Augusto, já sabendo o que teria para o almoço naquele dia, foi chamado para comer:
- Estou sem fome, “dinha”, diminutivo carinhoso de madrinha.
- Venha, Luiz, a comida está muito gostosa.
Ele sentou-se à mesa. A Dra. Dulce colocou a comida no prato, e ele ficou olhando com cara de nojo.
- Coma, Luiz, a comida está muito gostosa!
Ele começou a comer. Logo entrou no banheiro que havia embaixo da escada e levava ao andar superior dos fundos da casa.
- Luiz, tome um pouco desse remédio que eu trouxe para você!
O Luiz tomou o remédio e começou a provocar.
- Agora, Luiz, volte para a mesa e coma mais um pouco!
Depois desse dia, o Luiz Augusto nunca mais separou comida no pra-to.
A casa dos Costa era sempre farta de comida, mas ninguém podia es-tragar.
Depois de assistir a um show em Manaus, do Festival de Wodkstok, que protestava contra a guerra americana no Vietnã e implantou a moda hippie no mundo, o Carlos Alberto entra em casa, usando tamanco de madeira, o cabelo todo penteado para cima, com escova de pregos, can-tando a música de Tony Tornado, BR-3. Achei engraçado o jeito dele.
Essa convivência mudou a minha vida para sempre!