ORIDES FONTELA
ORIDES FONTELA
No do lançamento de meu livro, Memórias de um descasado, na cidade Paulista de São João da Boa Vista, na livraria Papyrus, estava tentando vender meu peixe, quando o artista plástico José Marcondes, me faz um pedido: - dá para falar um pouco de sua prima, Orides?
Pego assim de surpresa, inverti a incumbência. Pedi a ele que falasse alguma coisa, visto que foram colegas de escola. Ele repetiu a história que tantas vezes ouvi de meu pai: - Era um gênio. Sabia mais do que os professores em todas as matérias. Estava ano-luz das aulas.
Acordo no dia seguinte lendo o artigo do Chico Lopes, no Jornal da Cidade, sobre Orides, ode ele informa ao leitor sobre o meu parentesco com o gênio da literatura.
Na verdade, conheci muito pouco a prima. Apenas por três vezes estive com ela e pouco conversamos. Em minha casa ela ia direto para a estante de livros. Folheava com avidez. As letras lhe importavam mais do que as pessoas.
Nascida em São João da Boa Vista, em 21.04.40, escrevia versos ainda na infância e os publicava em jornais locais. Mudou-se para São Paulo na década de 60 e estudou filosofia na USP. Paupérrima. Sempre em grandes dificuldades. Nervos à flor da pele. Briguenta. Boêmia. Depressiva. Tentou suicídio várias vezes. Apesar disso, era admirada por intelectuais do porte de Antônio Cândido, Marilena Chauí e Davi Arrigucci Jr.
Suas obras; Transposição (1960), Helianto (1973), Alba (1983), Rosácea (1986) e Teia (1996). Com Alba, ganhou o prêmio Jaboti. Os quatro primeiros livros foram reunidos no volume Trevo, que faz parte da coleção Claro Enigma, da Editora Duas Cidades. Na França, os poemas foram publicados em dois volumes com o título Trèfle.
Drummondiana, parodiou o mestre:
CDA (imitando)
O vida, triste vida!
Se eu me chamasse Aparecida
Dava na mesma
Alguns versos:
“Se vens a uma terra estranha curva-te...”
”Só porque erro encontro o que não se procura...”
“ Basta o profundo erro ser em que a rosa descansa...”
“...se o dia é todo estranheza submete-te..”
“... o cruel saber que despedaça o ser sabido...”
Um poema:
HERANÇA
Da avó materna
Uma toalha (de batismo)
Do pai:
Um martelo
Um alicate
Uma torquês
Duas flautas
Da mãe
Um pilão
Um caldeirão
Um lenço.
* Orides Fontela faleceu aos 58 anos, em outubro de 1998, num sanatório em Campos do Jordão. Não gerou filhos, não plantou árvores, mas deixou obra para a eternidade.