QUE BOCA SUJA!
Era a minha semana de acender o fogo. É, naquele tempo ainda não tínhamos fogão a gás, apenas um fogão alimentado com carvão. Naquela manhã, não sei por que cargas d’água, o carvão não queria acender. Irritada e com olhos lacrimejando pelo efeito da fumaça, a certa altura perdi a paciência e com raiva, despejei em cima do fogão todo o repertório de palavrões que conhecia até aquela idade. E não eram poucos não. Não reproduzo aqui porque não quero que meus netos leiam, mas qualquer pessoa sabe quais são. Quando terminei minha explosão de cólera, voltei-me para a porta que dava acesso à cozinha e eis quem estava lá de pé me olhando! Ela, a Dindinha. Imaginei logo o que podia me acontecer: pimenta na boca, lavar com água sanitária, sabão seja lá o que fosse. Mas ela não fez nada disso. Apenas falou com uma voz mansa e cheia de decepção, não sei. Ela disse: que pena, uma menina tão bonita, tão inteligente, tão trabalhadora, mas com uma boca tão porca! E deu-me as costas. Eu fiquei ali parada, envergonhada pela minha “boca suja”. Raramente digo palavrões, só quando levo uma pancada no cotovelo ou nas canelas ou quando algo muito grave me tira do sério. Mas sempre lembro das palavras de Dindinha e aí peço desculpas a mim mesma pela minha “boca suja”.
CONCEIÇÃO GOMES