Os sonhos estranhos

Os sonhos estranhos

Havia uma espécie de suspiro em ritmo sequencial, muito longe, quase imperceptível. Dentro dessa sequência, se bem sincronizado, eu sentia um ventinho aliviador. Eu ficava ansiosa pra aquele ventinho voltar. Eu sabia que tinha que prestar atenção pra tentar ouvir de novo aqueles suspiros monótonos, quase inaudíveis. Quanto mais calma, mais ventinho vinha. Era esse o segredo. Meses depois entendi que era o '' bird '', o respirador artificial.

Sonhei que eu era um sardinha enlatada. Espremida, quietinha e amontoada com as outras ali, bem deitadinha e imóvel. Na escuridão, todas podiam respirar por um único buraquinho que fizeram com o abridor de latas. Cada sardinha tinha o direito de respirar uma de cada vez só uma vez enquanto as outras aguardavam disciplinadamente a próxima vez.

Gritaram de novo no meu ouvido, que susto, que raiva. Perdi meu ventinho, acordei em pânico com falta de ar de novo. As enfermeiras tinham que me dar banho, mexer em mim me deixavam catatônica, elas diziam. Poucas eram humanas e sem se preocuparem se eu ouvisse ou não, riam e faziam os mais diversos comentários maldosos.

Desculpem, mas essa eu jurei pra mim mesma que um dia publicaria. Até a cabeça, cheia de escaras, me levantavam pelos cabelos me puxando pra cima. Isso com certeza não era sonho, mas um verdadeiro pesadelo. E eu não tinha como reclamar, elas sabiam disso.

Calma... a calma era o segredo chave pra achar meu ventinho de volta e ficar sardinha bem comportada. Precisava amar as enfermeiras, Precisava perdoar e ficar menos tensa. Tudo que eu precisava era relaxar, senão o 'bird' não liberava mais oxigênio.

Jesus surgiu de repente. Em zoom muito aumentado, mostrando o seu rosto ensanguentado, sujo, suado e macilento. Seus olhos arregalados, já sem vida, estavam enjetados de sangue. Senti uma enorme sensação de culpa e vergonha dele estar ali por minha causa. Algo estava errado. Porém, uma outra voz dizia, '' Eu sei que o meu redentor vive! ''.

Ladyrosso
Enviado por Ladyrosso em 27/04/2009
Código do texto: T1561968
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