Danças Circulares – Capítulo 3
 
Durante a viagem, tive a sensação de resgatar, pouco a pouco, a confiança em mim mesma. Permiti que minha mente relaxasse enquanto a paisagem passava ligeira lá fora. Embora o dia estivesse cinza e chuvoso, eu conseguia enxergar poesia nele.
 
As montanhas, o cheiro de terra molhada, o vento frio que soprava e agitava a Mantiqueira me preencheram de profunda paz. Depois de um longo período nebuloso, eu me sentia plena novamente. O silêncio me abraçava e embalava com ternura e para meu espanto, posto que isto é fato raro, eu não estava pensando em nada, apenas fluindo.
 
Era final de tarde quando chegamos ao Hotel. Como não conseguimos parar o carro próximo à porta de entrada, tivemos que andar alguns intermináveis metros com as malas pesadas nas costas, enquanto uma garoa fina caia e respingava nossos óculos.
Quando nos aproximamos do saguão de entrada, o recepcionista veio correndo em nossa direção e falou em tom eloqüente:
 
- Pelo amor de Deus, isso não pode acontecer!
 
Em frações de segundos, mil coisas passaram pela minha mente, cheguei a pensar que havia cometido algum erro terrível. Quando ele começou a pegar nossas malas eu entendi que aquele exagero todo, era a forma que ele usava para receber os hóspedes, portanto, nada pessoal em relação a minha pessoa, tive que me segurar para não ter uma crise de riso.
 
Ele continuou com sua simpatia exagerada e divertida:
 
- É um absurdo vocês carregarem esse peso todo sozinhas, por favor, deixem-me ajudá-las !
 
Após preenchermos a ficha de estadia, fomos conduzidas ao quarto 112, pelo mesmo recepcionista que insistia em se mostrar mais e mais simpático e para coroar o momento:
 
- Não é possível que vocês sejam mãe e filha, tem certeza que vocês não são irmãs?
 
- Você está dizendo que pareço muito mais velha do que sou ou que ela parece muito mais nova do que é?
 
O recepcionista abriu a porta do quarto, o sorriso, e eu fiquei sem minha resposta, talvez tenha sido melhor assim...
 
Ao entrar no quarto, mais uma surpresa. O mobiliário era bem velho, assim como as roupas de cama e de banho. A televisão não tinha controle remoto e só dois canais estavam disponíveis, o abajour que poderia iluminar uma boa noite de leitura, estava com a lâmpada queimada, era apenas um adorno. Decidi  tomar um banho antes de sair para encontrar meus amigos e a porta do box saiu na minha mão. Parece piada, mas não é.
 
Após o banho, fui ao encontro do pessoal que já estava no Hotel desde o dia anterior. No corredor, encontrei um casal de amigos. Nos abraçamos trocamos algumas palavras e seguimos juntos para o salão onde estavam acontecendo as atividades do Encontro de Jovens.
 
De repente, ouvi chamarem por meu nome - era uma das organizadoras do encontro :
 
- Ju, que bom te ver, eu estava quase morrendo achando que não vinha mais! Você chegou na hora certa, vamos aplicar a última atividade do dia, venha participar, vai ser muito boa, vai te fazer bem.
 
Aceitei o convite e abracei a proposta...