A Faculdade
Mesmo quando o ambiente assim não exigia, logo no primeiro dia de aula ali cheguei todo arrumadinho, camisa branca bem passada, por dentro da calça, cinco e sapatos pretos bem lustrados. Cabelos já bem embranquecidos, facilmente fui percebido como o mais idoso da turma. Na auto-apresentação, todo metido a falante, fiz uma ligeira retrospectiva da minha trajetória, dizendo o motivo de ali estar na condição de recém aposentado. Terminada a apresentação dos colegas, o professor disse que era de praxe eleger um representante da turma para fazer a ponte entre a classe e a coordenação do curso. Não deu outra. Por unanimidade, não pude fugir da missão, que foi até o final do curso, após quatro anos. Tarefa um pouco espinhosa, levando-me muitas vezes a condição de Tancredista para conciliar alguns conflitos, coisa natural do universitário que se diz cabeça feita, querendo sempre ver prevalecer a sua déia.
Não foi difícil manter o bom entrosamento com a coordenação, até porque o próprio coordenador do curso também foi nosso professor de algumas disciplinas, tendo começado com a famosa TGA-Teoria Geral da Administração, a partir de quando já percebeu o nível de amadurecimento da turma, a maioria formada por quarentões e cinqüentões, todos já com uma boa dose de experiência profissional.
Numa aula de direito, quando se falava sobre alguns tópicos de atenuantes da pena, entre elas a idade, a partir dos 60 anos, uma colega me fitou ironicamente, apontando-me como o próximo a ser beneficiado. Não estava muito distante dessa idade. Levados pela zombaria da colega, a partir daí todos passaram a me chamar de “o garoto sexy” numa referência a sex de sexagenário. Respondi que terminaria o curso antes de completar essa idade, e por isso não me enquadrava ainda nesta situação. Entretanto, como alguns procedimentos burocráticos geram algum atraso nas diversas instituições brasileiras, não sendo diferentes nas educacionais, mesmo o curso tendo terminado antes do meu aniversário, a colação de grau ocorreu depois. Aí, então, pelo Estatuto do Idoso, eu já estava mesmo plenamente enquadrado. Não pude mais fugir da brincadeira. Fiquei sendo mesmo “o garoto sex(y)”, não de sexualidade, mas de sexagenário.
Hoje vemos que idade não é mais problema para quem quer estudar. O pessoal da terceira idade está voltando à sala de aula, como forma de rejuvenescimento das idéias e por conseqüência a melhoria da qualidade de vida.
Pela proximidade da Faculdade, costumava ir a pé, sendo confundido por algumas pessoas que me chamavam de professor, por me verem com livros debaixo do braço, a caminho da escola, com os meus cabelos brancos. Mesmo quando era possível um esclarecimento daquela minha situação, ainda achavam que eu estava brincando, querendo me passar por estudante. É muito natural que as pessoas ainda encarem muita coisa pela aparência. Mas, a condição de estudante deve ser encarada mesmo como uma necessidade permanente, já que as mudanças são rápidas e constantes. Nem tudo de ontem serve mais para hoje. Já dizia o grande filósofo Heráclito: “Na vida, a única coisa que é constante são as mudanças”.