Sonata

 

O anoitecer se desenhava no esmorecer do dia,

Na gravura do sol que se escondia no horizonte

E prenunciava horas de profunda solidão.

Chegou assim sorrateiro, mansamente...

Tão logo a luz apagou-se por detrás dos morros.

 

Dia após dia... Semanas ... Meses ... Anos ...

Como se o tempo não contasse,

Como se a história se repetisse, incansavelmente.

Como se os cabelos embranquecessem, sem que se notasse...

 

A mesma partitura amarelada, repousa sobre o piano,

Como se esperasse a hora de acariciar as lembranças,

Revolver as ilusões empoeiradas, empilhadas na alma.

Quase um ritual, assemelhando-se a um filme antigo,

Daqueles que assistimos milhares de vezes, mas nunca recordamos o final.

 

Os primeiros acordes soam tingindo o branco silêncio.

São tons róseos, como as saudades que pendem em cachos perfumados

Adornando os galhos da árvore de cada vida.

O coração não mais acelera, apenas acompanha o compasso

E bate nota a nota, pulso a pulso, pauta a pauta...

 

E na mente, confundem-se anseios, desejos, esperas...

Os dedos deslizam sobre o teclado puído, desgastado.

Já sabem onde devem ir. Sabem como falar da dor,

Sabem como dimensionar distâncias, sabem como lembrar do amor.