Aquele vendedor de sonhos me arguiu com palavras torrentes, urgentes em um tom febril. Me mostrou que era possível ir além da cortina realística do cotidiano, e que era desumano deixar os sonhos, mesmo os mais estranhos, guardados e esquecidos em um armário medonho. Em pandemônios ficaram meus pensamentos quando o vendedor, sem pudor, me mostrou um azul do mar que até então era sem par.
Deixa eu respirar, lhe pedi.
Mas, constante e com paciência, parecia que me conhecia desde a infância, me mostrou em palavras, imagens e miragens onde eu queria ir. Sem aferir, era sim o lugar dos meus sonhos, um sonho que sempre tive e nunca estive, em qualquer ocasião, próximo de realizar.
Ele me mostrou um lugar onde a luz do luar se misturava, embaçava, com o brilho do sol. Lá tinha cachecol tecido com ramas campestres para as noites sempre frias. Lá tinha gurias a brincar na areia branca, que encanta nos dias sempre quentes. E também tinham entes, parentes, condolentes, pertinentes, cadentes, viajantes. Lá não tinha pressa e nem dor, compressa só de frutas silvestres para aliviar o calor. Era um lugar pintado com lápis de cor sem desdém, muito além da cortina contra fina da realidade. Na verdade, era um lugar só para imaginar.
E mesmo assim, sem um pingo de incredulidade enfim, aquele vendedor de sonhos, jeito risonho, me fez sonhar e acreditar que mesmo um lugar imaginário, sem destinatário, pode ser alcançado, sentido, visto, percorrido sem que perca todo o juízo, só o permitido.