[Memórias do chalé amarelo – Araguari-MG]
A Avenida Minas Gerais era o mundo,
a vida era lenta, sem voragens;
no quintal do meu chalé amarelo
o relógio era só as estações do ano!
Os gerúndios por lá eram mansos,
terminavam em ano e não ando
mesmo que se gastasse um ano
no caminhando da prosa!
O Marinone catarrento da Maria
achava de cagar no meio do terreiro;
roda amarelenta de desanda aguada,
resultado da fortidão do leite de vaca.
A gente gritava com ela:
eh Maria, olha a caganeira
desse seu menino; Maria,
vem logo dar um jeito nisso!
E ela respondia enfezada:
“Num tô nem somano co’ele!”
Ah, Maria, corre que o filho é seu!
Sem esconder a irritação, ela repicava:
“Ara, vai tombano, sô!”
Tombando pra onde, Maria?!
“Pro meio dos infernos, ara!
Tô quereno é paz, viu?!”
A empregada Maria do Marinone
era mãe solteira num tempo
em que essa condição tinha
outro nome: moça perdida!
Mas, perdida, ou posta a perder,
ela jamais fugia à dureza da vida,
os seus gerúndios eram mansos
até quando limpava o Marinone!
[Penas do Desterro, 22 de maio de 2002]
Do meu livro "Arribadas, O Passo da Volta",
ilustrado por Paula Baggio