Abri meus sonhos, escanracei minhas portas,
destramelei as janelas,
andei de mãos dadas com minhas vontades mortas,
sinti n'alma suas sequelas.
Fingi não sentir o que sentia,
Porque o que sentia, não era o que fingia,
E na via crucis de uma alucinada fantasia,
Via o eu, sem saber que assim morria.
E quando levantei as pálpebras no meu entardecer,
Vi que passei sozinho desde o meu amanhecer,
Não estava lá o meu tão desejado bem querer,
E anoiteceu em mim, sem eu mesmo perceber.
Encantos e desencantos,
que a vida traz em seu caminho,
E mesmo que eu vá aos quatro cantos,
O pranto mostra que andei sozinho.
Ai, ouço da boca da noite uma canção,
E no céu da minha boca um pronuciar vazio,
Como pássaros noturnos em dispersão,
em gorjeios sinistros em ecos de calafrio.
Deitei então no berço da minha ingenuidade,
relembrei em lampejos a minha mocidade,
Que trouxe-me um mundo de saudade,
Do eu menino num mundo de longa idade.
Ah! Se o meu coração não compactasse meus anseios,
E fizesse deles coros resumidos de melodias,
Eu sofreria a angustia dos meus devaneios,
E sobreviveria nos versos lânguidos das poesias.
E quando a noite desmaiou em meu colo,
Descobri o quanto peregrinei nos meus garimpos,
Senti-me feito uma sombra estática no solo,
Peregrinação sem êxito em campos de sonhos limpos.
Longas estradas de girassois,
Que na vastidão do meu desejar humano,
Voei como Ícaro em asas de cera rente aos sóis,
E definhei-me em gotas de cera no meu querer insano.
E tu que me olhas com teu olhar infame,
julgas-me e condenas-me na minha morte subta,
Saiba que minha sacrosanta alma num liame,
laça, enlaça em nós de insanidade estupida.
E se um dia abraçares-me na tua volúpia,
sentiras a minha real fascinação,
E quererás possuir-me por inteiro como relíquia,
já que passei de ti, de mim, nesta surreal peregrinação.