Tarde demais

 

Tarde demais



De repente, sinto que palavras são signos por demais rudimentares para expressar os incômodos que me assolam. A dor, em si, é algo objetivo e de uma simplicidade cruel, mas seus efeitos são de uma sofisticação tal que torna sofrimentos comezinhos em requintadas e indescritíveis torturas.

Quando as pequenas tragédias pessoais se acumulam a tal ponto e com tal frequência que chorar se transforma em ocorrência banal, é sinal de que algo de muito errado nos acertou. O destino tem mira aguçada e, caso se ponha a disparar mazelas, nenhum alvo tem escapatória. Só fico me perguntando, por que eu?

A busca por respostas só levou ao beco sem saída do remorso. O extrato de meus vexames já fermentou-se em vergonha. O ontem dissolveu-se em decepção, o hoje está diluído em angústia e o amanhã tem um cheiro nauseante de medo.

Lá fora, noites e dias, sol e chuva, continuam se alternando, mas cá em mim o tempo já não prossegue inexorável, porque ficou atolado numa sombria poça de mágoas paradas.

A esperança grita que o socorro deve estar a caminho, mas antídotos, por poderosos e eficazes que possam ser, não surtem efeito quando o veneno já teve chance de sobra para uma consumação fatal.

Vontade de viver é um irônico paradoxo quando serve apenas de epitáfio.

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