NOITES PROIBIDAS

Lembro-me que vinhas à tardinha, às escondidas do sol, entre um solo de melro e o estremunhar das estrelas. A água do tanque gorgolejava regas disciplinadas por enxadas já recolhidas pelas Trindades, e os grilos vestiam o fraque e ensaiavam um nocturno. Vez em fase, a lua enchia a noite e descobria-lhe segredos de alcova...
Essas noites eram as mais nossas: despíamo-nos, banhávamo-nos de luar e mergulhávamos ao fundo de nós... Depois, rindo baixinho para não despertar o melro já adormecido, deitávamo-nos na erva fresca, e a brisa vinha, quase ciumenta, secar-nos a pele húmida em carícias insinuantes...
E a lua, por recato, mandava deitar as estrelas e seguia-nos a noite, duma ponta à outra do céu negro, alumiando o amor que faziamos...
e só se deitava quando nos via já adormecidos também, achados perdidos um no outro, em trança apertada...
De manhã, a aurora cúmplice vinha de mansinho, velar o sol com ténue cortina feita de nuvens de algodão fresco, para que o nosso acordar fosse doce...
...
Só que certa lua vazante, uma tempestade inesperada cerrou um reposteiro de algodão pesado e sujo sobre o oriente e nós não acordamos, traidos pela falsa noite...
...e encoberto pelas nuvens, o Dia descobriu-nos!
Ao longe, ainda o toque das almas se repercutia no ar pesado, em dolências de pranto, quando uma enxada pagã, surda de sinos, se fez raio e castigo...
E eternizou o teu sono e o nosso amor...
...
Ainda te trago flores, todas as noites permitidas.