Mistérios da Lua (II)
Vi-a nascer, parida por uma curva mais desanuviada do meu caminho. Circundada de noite, inundada de sol. Plena. Tinha na face gordinha de criança travessa, covinhas de riso fácil e tons de láctea luz, ainda velada pela inocência de rendas brancas. Perseguiu-me fielmente, saltitando o lado Este da minha rota rumo ao Norte. Tal qual uma bola enorme, brincalhona, insuflada de vento que se fizera frio e ora a encobria, ora a descobria de nuvens cúmplices e fugazes, verdadeiras companheiras de folguedo.
O meu olhar, incapaz de agarrá-la, perdeu-se das estrelas tímidas, que pareciam ter-se retirado, em respeitosa reverência à princesa da noite, coroada de luz...
Reencontrei-me com ela já moçoila de formas definidas, majestosa e soberana. Um halo magnífico, feito de poalha de neblina, coroava-a de diadema precioso, com reflexos de arco-íris. E agora?... Ah, dir-se-ia que estava vestida de noiva, envolta em diáfanas sedas, filigrana de rendas, tule branco, que ela parecia arrastar em cauda, graciosamente subindo a escadaria forrada a veludo azul escuro. E todo o Céu reflectia em festa, brilhos argênteos... Linda!
Desapareceu de seguida, levada pela sinergia do Universo irrequieto, ou talvez por uma nuvem mais ciumenta e possessiva... Ou pela minha pressa de chegar a norte...
Ainda a vi, de soslaio, umas vezes e outras. Mas já muito acima do meu caminho, já muito enredada em correntes de pesadas nuvens. Já muito enrolada pelas tramas dum tempo agreste, ora fingindo-se de minguante, ora refugiando-se num quarto pretensamente crescente. Não mais completa e arrojadamente nua...
Até que a nebulosidade a tomou por completo, se fechou sobre ela, como cobertor grosso. Não sei se a protegê-la do frio ou a tolher-lhe o soberbo reinado. Só sei que lágrimas caíram...
(Choveu...)
( Lua de Sábado passado, dia 13 de Dezembro, que me fez companhia parte da viagem Lisboa-Régua)