O AMOR NASCE ETERNO
No princípio era o Amor.
No princípio era eterno...
No princípio É eterno. Toda a gente sabe disso, toda a gente sente isso. Na pele, na alma...
Nasce livre de pecados, livre de tentações intrusas, vive eterno, num Paraíso de frutos doces, apetites puros, ternas matizes de cores e flores, brisas de ar fresco que alimentam respirares incertos, tacteando emoções novas...
Mas... como directos descendentes de Adão e Eva, temos a costela da insatisfação a rasgar-nos o invólucro do peito. E essa frágil costelinha, mais tarde ou mais cedo, revela-se letal para o indefeso e estreme Amor... A arma é sempre essa, a nossa costela de terrena humanidade, mas o motivo desdobra-se em mil e uma feições...
Há quem mate o Amor, encantado pela serpente da tentação, enleado pela cobiça da maçã proibida.
Há quem mate o Amor por renúncia, à nascença, sem dó, mesmo que auto mutilando-se...
Há quem mate o Amor por interesses vários: preconceitos, dinheiro, comodidade.
Há quem mate o Amor alegando distância física. Outros que criam, voluntariamente, distâncias próprias, feitas de egoísmo e egocentrismo.
Há quem mate o Amor valendo-se do tempo (e o tempo é pura invenção do Homem, não existe no Paraíso do Amor...).
Há quem mate o Amor por vingança, urdida sobre fantasmas passados.
Há quem o mate ou mutile por desconfianças sem fundo, por ciúmes sem base...
Há quem mate o Amor por se deixar cair no atoleiro da rotina, por desleixe, por desatenção.
Há quem o mate pela tortura do silêncio, do frio, da fome...
Há tantas formas de matar o Amor!... Ele nunca morre por si, o Amor nasce eterno... Nós, nós é que o matamos, o expulsamos do Paraíso onde nasceu, nos perdemos do Paraíso onde o vimos nascer!
Mas a pior, a mais dolorosa morte do Amor, é a do Amor enterrado vivo... Essa morte lenta e cruel é a que deixa mais marcas na alma e na vida de quem assim o deixa morrer, soterrado em palavras por dizer, razões por dissecar, esquinas escuras por dobrar... Deixar que um Amor jovem, pujante e luminoso, de repente se perca em trevas asfixiantes, num túnel sem saída, porque se não luta por ele, não se mexe um dedo, não se arrisca a exposição duma lágrima, não se grita a raiva em ebulição!..., é o pior crime contra o Amor eterno e original...
O silêncio feito de orgulho próprio, de medo, talvez... de esperança no outro, de fé na capitulação do outro, da espera inerte que a outra metade do nosso amor em risco, nos venha cair aos pés...
O pior crime de amor é deixar o Amor morrer vivo. Enterrá-lo. Cada dia sem cor, cada noite em branco, cada hora negra, à espera que os passos ainda amados nos tragam ar, luz, sustento, ao nosso Amor agonizante...
O pior crime é deixar que o silêncio se abata para sempre sobre um Amor jovem, um Amor que não teve hipótese de se mostrar inteiro.
Não ter a coragem de o molhar com as lágrimas que teimamos em guardar no lençol subterrâneo da nossa dor...para fazer desmoronar o entulho e a terra escura que o asfixia...
Não ter a coragem de pegar fogo ao rastilho da nossa raiva, para fazer explodir a capa de massa negra que o ameaça engolir...
Não ter a coragem de olhar o outro de frente e lhe dar o sinal de partida, lhe indicar que o instante da sincronia, da junção de forças, é ali e então...
O Amor nasce sempre eterno, para ser eterno. Nós é que o matamos, ele nunca morre por si só...
E a pior morte do Amor, é a morte em vida. A morte-viva...
...Será que essa é a única forma humana, tristemente humana, de manter eterno o Amor??...