Quem decide sou eu com que roupagem
Pela vida me devo apresentar...
Antes mesmo de alguém me analisar,
Sei quem sou – e que estou só de passagem;
Quem decide sou eu qual a imagem
Vou deixar pelo rastro da existência...
Sou o réu. Já a postos, na audiência,
Sei de mim e conheço o meu legado.
Ninguém foge. Estou pronto. Preparado;
Sei quem sou. Tenho plena consciência!
Que sementes lancei caminho afora?
Quais espécies na vida cultivei?
Quantas vezes também as desbastei
Dando às boas sementes boa flora?
Minha herança, ao chegar a minha hora,
Brotará do que faço no presente;
Sei que a flor se abrirá e lá na frente
Novos frutos virão de tais plantinhas...
Plantas nobres? Não sei: ervas daninhas?
Isso tudo depende da semente.
Quantas vezes eu disse, por costume,
Certas frases de efeito e de defesa?
Eram tolos sintomas de fraqueza
De quem erra e se esconde e não assume
E engendra manobra até que arrume
Quem na teia se veja emaranhado...
Quantas vezes, fingindo de coitado,
Fiz sofrer uma vítima inocente?...
Não mereço perdão... Infelizmente,
Sou culpado: o único culpado!
Que lembranças de mim terão um dia?
Guardarão os momentos mais suaves
Ou aquelas contendas duras, graves,
Recheadas de neura, de agonia?
Será que eu, tolerante, não seria
Mais humano com quem vive comigo,
Sendo o amigo que sabe ser amigo,
Sendo ombro nas horas de aflição?
Quais lembranças mais vivas estarão
Na memória de quem viveu comigo?
Reconheço o que tenho a meu favor
E o que está contra mim: álibis, culpas...
Não me valem trapaças nem desculpas
Nem tampouco aliados sem pudor.
Eu me olho nos olhos; onde eu for
Vai comigo o que sou com transparência.
Inocente ou culpado... sem clemência.
Cedo ou tarde haverá um veredito.
Ninguém pode fugir. Está escrito:
Não se foge da própria consciência.
São Paulo, 16 de maio de 2014 – 23h15