Espelho do banheiro

Publicado por: Vavá Borges
Data: 09/03/2014
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Créditos

Texto: Espelho do banheiro Autor: Borgys Intérprete: Borgys Música: https://www.youtube.com/watch?v=n89_C7L-H6I#aid=P9LlVm678WQ

Espelho do banheiro

Tem alguém que me espia

Olhos meio serrados

Soslaio

Desconfiado

Expressando meu tempo

Meus tentos

... no espelho calado do banheiro

Nada me diz

Em tudo me observava

Meus cabelos

(cada vez mais escassos)

Minha índole

Meus anos de vida

(cada vez mais escassos)

Minha pele ganhando linhas

Meu rosto fulgurando os anos passados

Grito ao prestobarba;

- Me salve!

Limpe minha cara, enxugue minha idade

O cara vítreo ri de mim

Gargalha sobre a pia cheia de cosméticos

E dança com a cabeça num gesto negativo

Como que quisesse dizer:

“- A vida só tem uma direção.”

Não, não há como fugir

A vida é um cavalo desenfreado

Que corre apenas na direção do sol em plena madrugada

Queria eu ter um coração maior

Ou não ter um

Andar pelas calçadas

E rir das desgraças do mundo

Queria que não coubesse em mim tanto Drummond

Nem Pessoa

Queria ser extravagante como Dalí

Mas sou sensível como um cão

Embora seja duro como pedra

O homem que me olha do espelho

Despiu todas suas vestes

Agora é um holograma

Ou um fantasma sem ópera

Me assombra com minha sombra

Acusa-me no palpitar do seu coração

Os amores que não tive

E os que tive

São flores que mal cuidei

Não aguei

Magoei

E fiz chorar de saudade

Numa canção antiga

Num passado próximo

O homem que me olha do lado de lá

É meu amigo

Que me atesta o grau de insanidade

Provocados pelas chuvas e ventos

Que assolaram a cidade

Nas últimas três décadas e meia

E tudo é um trem

Ora cheio

Ora vazio

Um entra e sai de gente e bagagens

A cada estação

Meu sentimento de culpa

Um egoísmo de ser além do que sou

Enfurece e dá descarga no colibri

Que tanto suga o néctar da flor dos meus sonhos

Pássaro bisonho

E o moço do espelho

Agora risonho

Põe dentifrício na escova

Ajeita a gola da camisa sobreposta

No corpo antes arredio

Abro a porta

Recolho a âncora

É manhã e o ar tem cheiro de café moído

No bolso moedas da condução

E no peito um bocado de fé

De que hoje

Vai ser melhor que amanhã

Vavá Borges
Enviado por Vavá Borges em 09/03/2014
Código do texto: T4721600
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