ANAANATOMIA
150682
Tuas duas fracas mãos
Se interpõem entre este homem
Insone e o mundo.
Tuas duas fracas mãos
E nada mais.
As pequenininhas unhas brancas
(brancas, limpas e aparadas
como devem ser)
seguram um imaginário
mundo d´outras aventuras
de outras historias
bem diferentes daquelas
que vive um homem só.
Teu peito farfalha (que o teu
Peito pode, apenas, farfalhar)
Sobe e desce, tão lenta e calmamente
Que tua morte aparente me desespera
Tenho ganas de te acordar
Despertar-te para o mundo
dos vivos que morrem
muito mais que vivem.
Teus pés (que não caminham vagos)
Brancos e pequenos
Mexem-se vagarosamente
Teus olhos, linhas indivisíveis
Se fechados, estremecem e quase
Falam quando tua boca, linha única
Sorri.
Teu ventre sobedesce.
Tão fraco e enrijecido, eu;
Tão forte e frágil, tu
E tenho desejos de proteger-te
Abraçar e, no entanto
De minhas forças não necessitas
Nas a usarias para nada
(sólido que és, exo-alma)
Para nada te presto.
Sou inútil se dormes
Sou inútil quando sonhas
Que teu sono é plácido,
Calmo, longe das intempéries
E aleijões existentes nas almas
Nossas, os outros.
Teus cabelos molhados
Dos suores diurnos
Alisados por minha mão
Esquerda, enorme perto das tuas
Tua cabeça repousa
Tranqüila, distante
Perdido nos sonhos que te riem.
Sobre teu pequenino peito
Ajeito o cobertor. Teus dedos minúsculos
Seguram firme meu polegar
Aperto suavemente tua mão
Que cabe dentro da minha
Que conteria dez mãos tuas
Se as tivesses.
Deito-me ao teu lado. Sofro.
Preocupo-me com uma eternidade
Menos breve e um mundo melhor.
Abraço teu frágil corpo
Nada te afeta. No teu sorriso
No teu sono, uma completa indiferença
Para com o mundo
(que ainda não conheces)