Melena rala e tordilha
Vincos do tempo na testa
É tudo o que me resta
Num semblante veterano
De um “índio” forte, aragano
Que se criou por ali
Correndo desde guri
Debochando do minuano
Por mim passou-se o tempo
E a vida naquela estância
Esquecida na arrogância
Do filho do meu patrão
Que assumiu sem ter noção
Do valor de tudo aquilo
E nem o pingo que encilho
Recebi por doação
Quem diria, quem diria?
Me pergunto em pensamento
Sofrenando o sentimento
De uma existência perdida
Sentindo a própria vida
Se esvaindo num galope
Ao ouvir de um piazote
Que já não sirvo pra lida
Foi-se um eito de invernos
Quebrando geada cedito
Ordenhando pra um piazito
Parar de choramingar
Sem tempo para brincar
Cresci no arrocho do campo
Sem afrouxar, no entanto
E sem poder reclamar
Trabalhei na casa grande
Caseriei, cortava lenha
Co' patrão, que Deus o tenha,
Parceiro de campereada
Mateava de madrugada
E tinha sua confiança
Que guardei como herança
De uma vida dedicada
Do que ouvi do meu avô
Contei nas rodas de mate
Marcação, pealo, aparte,
Curar terneiro e tosquia
Ensinei o que sabia
Ao patrão novo de agora,
Para ser mandado embora
Quem diria, quem diria!