LUZES
Quantas vezes essas minhas letras tontas se equilibram
para dizer o que guardo como trunfo de poeta
dos horrores, e tento, em vão, falar de cores
e as frases fogem, não fluindo de verdade e por inteiro?
Quantas horas despejei pelos caminhos
entre o vil e o verdadeiro,
E eu, durante todo esse tempo,
Só descrevo o cinza dessa longa jornada
Só digo das flores caídas, esquecidas, pisoteadas..
Mas será de dores tão somente essa estrada?
Não tenho eu deixado, estilhaço no percurso
Os olhares furtivos, as cores, as gargalhadas.
Não tenho tido tempo para ver pétala atrevida,
O perfume dessa mesma rosa, envaidecida,
Embalada pelo vento fresco das manhãs ensolaradas?
Tenho, acho eu, sido egoísta, exigente, descontente
Cega, amarga desmedida e até mesquinha
Quando não percebo as cores tão intensas, reluzentes
E nem a vida que transita livremente, nos canteiros
Invisíveis aos meus olhos, em lágrimas viciados, inquietos,
Desconfiados, como se escravos das nuances preto e cinza,
Num universo de arco-íris, cantos e cores,
Sigo eu, quem sabe, presa a dores desconcertantes,
Lamentando tudo, ou o nada, e esses amores,
Que somente eu decido se os quero ou não,
Mas me perco em devaneios, troco o dia pela noite
Desejo o vento frio, ao calor do sol no rosto,
Reprimo os meu sorrisos, trago o cenho como timbre
Desse rosto que mascaro com tristezas construídas,
Mas me vem esse reflexo de poesia, e me traz
Toda essa luz, esse lampejo, me resgata um sorriso
Tão antigo, me mergulha nas belezas que ignoro,
Por querer fazer de sombras o meu mundo,
Mas quiçá, um dia a mão do tempo, em cirurgia reparadora
Arranque das entranhas minha história, e eu esqueça
Que a vileza em si sucumbe e eu não posso
Apagar essa aquarela, que insiste em tão bem tingir meus dias
nem ousarei emudecer a melodia
do encanto desses pássaros teimosos
e quem sabe eu viva um dia esse beleza,
O milagre do rei sol, buscando a lua.
JOANA PRADO