PÂNICO
Estava despreparado quando
aconchegou-se a mim esse mal
sem alma,
essa dor convulsa, esse olhar
sem mira.
Todas as palavras que, hoje,
forem ditas,
de nada servirão, acalmarão o
sofrimento
que se tornou companheiro atroz
que por mais que queira não se
evita.
Nada que meu coração me diga,
minha vontade queira,
minha cabeça ordene,
impedirá que me voe por dentro
o corvo
dessa solidão desmedida,
que espantalhos ineficazes de
palavras
tentam, sem sucesso, expurgar
de mim
para que não se alimentem mais
da minha vida.
Um dia semeei, o tôlo,
todas as sementes que tive à
mão.
Agora, após partidas e chegadas,
após arrancar, com as mãos
crispadas
todos os ramos que julgara joio,
vejo-me, no alto desse plano,
a contemplar a terra vazia
onde homens ôcos prenunciam
grandes novidades.
Esta é a época dos homens sem
nada
que observam a terra desolada
apenas repetindo palavras.
De onde estou, esse calmo vazio,
observo as aves daninhas
fartarem-se em suas revoadas.
Queria pronunciar som,
emitir sinal, ter o gesto capaz
Mas a boca não sabe traduzir em
coisa
o que sente o corpo flagelado.
E todas as emoções ficam
congestionadas
nessa garganta rouca
sem encontrar forma ou jeito
de comunicar perfeito
o que me rasga a alma.
Essa impotência, esse dia
nublado,
essa falta de palavras para
dizer a todos
que ainda amo, que ainda quero,
que tento de todas as formas
erguer o peito
andar ereto
sufoca o homem em sua luta
que transforma o caçador em fuga
apenas para que não percebam
que ando sofrendo, que corro
afoito
para que não me vejam o choro
que corrói as carnes do rosto
que tenta sorrir, apesar de
marcado.
Procuro, cada dia mais
insistentemente
o cume da minha jornada.
Quero, ao findar a trilha,
ter aprendido o idioma do medo
para gritar a todos o que fiz
segredo
por não saber como me comunicar
com esse mal, repito, sem alma
que atacou-me de repente.
Quando souber as novas palavras
poderei dizer a todos que estive
à beira do abismo e salvei-me
ao descobrir que pulando no
vazio
inventava do meu medo as asas
que o ar quente dessas rochas
plana para que eu possa enxotar
os corvos
de dentro do meu corpo
para nascer de novo, claro e
limpo.
Apenas falta-me a coragem
de lançar-me do alto
de atirar-me ao limbo
na dúvida das asas
que tinha quando menino.