OS LÍRIOS NO CAMPO
Estou repleto de coisas, delas cercado
como animal acuado, em direção ao abate.
Enquanto mais as coisas me circundam
mais em coisa me transformo
e me desdobro evitando a metamorfose
querendo esquecer tudo, agnose
para poder livrar-me do que construí.
Se não me assombrassem tanto
as palavras soltas pelos cantos
revoluteando à minha volta
metáfora em metástase disseminada
assaltando-me quando passo pela casa
decerto esta lide já estaria terminada.
São as palavras que me redimem das coisas
dos inventos humanos e da sua solidão.
Podem anunciá-los em prospectos
nos letreiros das avenidas
que nada se alterará na minha vida.
Estou isento das coisas, alheio a elas
Automaticamente, ilhado no mundo.
Minha única embarcacão rumo ao continente
é a palavra que me revela gente.
Quanto mais esqueço coisas, humanidades
mais me aproximo da realidade
da vida real, dos homens e da naturalidade
Enquanto rumo para ser o feliz ignorante
onde esqueço coisas e as coisas que fiz
vou amando o lírio no campo, abundante
que nada sabe, faz. Basta-lhe ser lírio
para, sem palavras, ser divino e feliz.