O TEMPO

O tempo é medida de morte

E nos põe plateia

Para ver nossos sucessores

Beijarem antigas namoradas

E nossas amadas

Sonharem novas volúpias

Em braços que não tivemos,

Da forma que não soubemos.

O tempo

Faz nossos filhos ocuparem a mesma cadeira de bar,

Repetindo nossas desditas

E saboreando a mesma espuma no seboso copo.

O tempo

Que levanta a casa

É o mesmo que a derruba;

O tempo

Que traz o automóvel

É o mesmo que o enferruja.

O tempo é o mesmo

Que explica a inutilidade das falsas conquistas

E desmente as divisas.

O tempo nos põe plateia

Para o corpo esguio

E para a flacidez quando chega.

O tempo tange as entranhas,

Ausculta o ego,

Castiga derme e epiderme.

O tempo nos faz rei

E nos conduz à insignificância de pó.

O tempo é medida de morte.

Itapecerica da Serra, 2 ou 3 de junho de 1990

(ruas de Itapecerica, sábado para domingo)