AMOR E PAIXÃO

AMOR E PAIXÃO

(aulas)

O amor nada perdoa nunca

nada releva.

Não contém o carinho,

este é um dos seus sintomas.

Ele é tão metódico

que aninha em seus escaninhos

cada fala franca (que magoa)

cada gesto espontâneo ( que fere)

como se fossem documentos

que devam ser apresentados

ao escrivão-chefe para o livro de tombo.

O amor anota no diário

cada falta do amor.

O amor é o estudante atento às aulas

que não faz o dever de casa

que se nega a aprender no dia-a-dia

as lições que cairão na prova do novo amor

Quando repete de ano

o amor acha tedioso, enfadonho

e repete ano de novo

mesmo mudando o professor.

Ao amor que nada esquece, a paixão.

Essa sucessão de portas que se abrem

de memórias saudosas

lembranças sutis e violentas.

A paixão, aluno gazeteiro

que não aprendeu e não quer

que doa tudo de uma vez por todas.

Onda violenta que remexe

o lodo no fundo da baía serena

deixando ver o podre do belo.

Ao amor que nada esquece,

a paixão que nada lembra.

O amor tem memória de elefante,

a paixão, suas patas e o marfim.

O amor repousa, terno, a cabeça

após exigir do amor o cetim e a seda.

A paixão não deixa dormir

ignorando a aspereza.

Chega o momento em que se diz

'te amo para sempre'

perdendo-se no tempo

a paixão.

É quando o amante olha atrás

lamentando ter faltado às aulas

não ter feito o dever de casa

não aprender a lição.