Porta-relíquias - PARTES 2 E 3

Porta-Relíquias - PARTE 2 (A gaveta do presente) - PARTE 3 (Relíquias de sempre)

(continuação do poema PORTA-RELÍQUIAS. Se preferir,

conheça a primeira parte na publicação anterior)

SEGUNDA PARTE

A gaveta do presente

VII

Como é breve este instante... com cuidado

vou abrindo a gaveta do presente.

Muito há que guardar daqui pra frente,

pois se é já se foi... virou passado.

Mas respeito – se me foi destinado

fez de mim quem eu sou e vai fazer

tudo aquilo que um dia eu hei de ser

nesse lúdico jogo da existência,

pois só vence o presente quem convence

a si mesmo que a vida é pra viver.

VIII

Pouco tenho de fato, mas sou rico

na doçura de tudo o que sou eu;

tenho a dádiva deste jubileu

e alicerço no agora o que edifico;

tenho as boas ações quando as pratico

e o vazio toda vez que nada faço;

o aconchego daquele a quem abraço

no exato momento que o permito

e na vida o meu saldo quando hesito

é que apenas deixei de dar um passo.

IX

O que tenho de mim ninguém o tira

e só eu poderei jogá-lo fora:

tenho o opaco da noite e tenho a aurora,

cintilando o meu céu todo safira;

tenho o prisma real e o da mentira

num só facho que uso a bel-prazer;

tenho, pois, tanto quanto eu queira ter

dentre as muitas escolhas que eu fizer;

posso, então, ser aquilo que eu quiser

– também posso ninguém ou nada ser.

TERCEIRA PARTE

Relíquias de sempre

X

Tenho mundos às vezes tão fecundos

que ultrapassam as raias dos meus versos:

uns no enredo da vida são perversos

e machucam meus sonhos mas, no fundo,

se os desvendo, descubro um outro mundo

como nunca pensei que fosse achar;

outros, tão transparentes como o ar,

vêm e vão sem segredos, sem escolhas:

vêm na forma de um mundo mas são bolhas

e só duram o tempo de estourar.

XI

Todos eles são parte do que sou

construindo o capítulo recente:

os amigos da casa aqui de frente

ou aquele de longe que voltou;

os netinhos que a vida me ofertou,

mas que ainda não pude conhecer

ou aqueles que estou vendo crescer

sem que sejam – mas juro que eles são;

e no prisma perfeito da emoção

sou feliz sendo tudo o que eu quis ser.

XII

Tenho a honra maior que há nesse mundo

no orgulho que guardo de meus filhos

não me faço egoísta e os compartilho

porque vivo este amor cada segundo

se são dádivas, nutro o mais profundo

sentimento que um pai pode nutrir...

Quantas vezes pensei em desistir,

mas eu tive a certeza absoluta

de que nada conquista quem não luta

e por eles lutei pra não cair.

XIII

Eu os tenho – são meus – ninguém me tira!

Moram dentro de mim, vivendo fora:

foram ontem, são hoje e são agora

o amanhã que meu coração aspira;

sei que o mundo que os leva, quando gira

os devolve lá onde eu estiver;

quando um dia algum deles não vier

saberei respeitar tal decisão

porque sei que são meus mas também são

o que cada um deles bem quiser.

... o poema continua na próxima publicação.

São Paulo, noite de 7 para 8 de fevereiro de 2011