Abro as cortinas do ano
Que chamaram de ANO NOVO
E vejo passando o povo
Rumo ao seu quotidiano
Num vai-e-vem desumano
De quem não sabe onde vai:
É filho agredindo pai,
É mãe corrompendo filha...
Mil cães da mesma matilha
Pisoteando quem cai.
Afasto mais as cortinas
Pra ver melhor o que espio:
Velhinhos tremem de frio
Desolados nas esquinas
Enquanto mãos assassinas
Recebem mil cumprimentos
Levados aos quatro ventos
Pela mídia de plantão
Que anseia por seu quinhão
Das verbas dos Parlamentos.
Nas ruas, todos se apressam:
Alguns, com suas mochilas,
Outros, correndo pras filas
Que mal findam, recomeçam.
E, por mais que se pareçam,
São todos tão desiguais,
Sonhando que nunca mais
Serão aquilo que são
E nessa tosca ilusão
Repetem seus ancestrais.
Um deles, o mais afoito,
Jura paixão à inocente;
Ela, sabendo que mente,
Aceita, porque já foi
Toda ilusão aos dezoito,
Mas cansou da solidão;
Entre um sim ou mais um não
Prefere agora o talvez
E jura que dessa vez
Tem o futuro nas mãos.
Revejo o nascer de planos
Iguais aos planos que havia
E o ano velho que eu via
Repete-se todo ano.
No calendário do engano
Buscamos o dia D,
Uns querem saber por que,
Outros quanto, outros quando.
Mas eu sigo perguntando:
E o ano novo... cadê?
São Paulo, 06/01/2011 – 21h08min