Peguei-me, de novo, na intenção de versejar para ti. Ao ver-me só, notei-me frágil e tão sentido... E vi que o amor me fez patético – e sem sentido! E o verso, assim, seria um desperdício. Pensar em ti é uma imolação que não purifica, que não consagra, que não purga nem redime. É um ritual de autoflagelo já reprisado tantas vezes que há muito deixou de ser sagrado. É mera liturgia condicionada, insana e vazia. De repente, notei que meu coração tornou-se um altar de vãs adorações, por onde desfilaram divindades indignas disso e que se sucederam a cada pretexto de desencanto. E tu foste importante e valiosa, mesmo sendo mais uma delas! Mas, agora, pouco importa quem sejas tu, porque o que fica é sempre esse altar vazio em que só a desilusão se aloja escarnecendo do que foi o sonho. Por que, então, rabiscar um verso? Por que, então, arriscar o verbo? Ora! Porque o poema não é mais para ti. O que cultuo são os restos de mim. Quem ama a si mesmo jamais se abandona. Para quem já perdeu quase tudo, de consolo, resta sempre a esperança. Para mim, que até a esperança já perdi, restou somente a poesia. Desperdiço versos para não desperdiçar a mim!