Nasce um grande amor a cada dia
Carlos Marques
Quase nunca percebemos,
Mas todo o dia nasce um.
Às vezes de forma lenta e gradativa, após anos de rotina.
Às vezes melodramaticamente, como nas piores
Novelas com direito a bate-bocas vexaminosos,
Capazes de acordar o mais surdo dos vizinhos.
Nasce em uma cama de motel
Ou em frente à televisão de domingo.
Nasce sem beijo antes de
Dormir, sem mãos dadas, sem olhares compreensivos,
Com gosto de lágrima nos lábios.
Nasce depois de telefonemas cada vez mais prolongados,
Cartas cada vez mais freqüente, beijos que aos pouco são mais demorados.
Nasce da mais completa e legal imaginação.
Todo dia nasce um amor.
Às vezes com uma explosão, quase sempre com um suspiro.
Todo dia nasce um amor, embora nós,
Românticos mais na teoria que na prática, relutemos em admitir.
Porque nada é mais
Lindo do que a constatação de que estamos amando
De saber que, mais uma vez, um amor chegou.
Porque, por mais que não queiramos aprender, a vida
Sempre nos ensina alguma coisa.
E esta é a lição: amores nascem.
Todos os dias um amor é perdurado.
Mesmo com a adaga do tédio, a cicuta da indiferença,
A forca do escárnio, a metralhadora da traição.
A sacola de presentes devolvidos.
O silêncio insuportável depois de uma discussão:
Mesmo assim ele nasce e permanece vivo
Todo crime deixa evidências. Mas o amor deixa vidas.
Todos nós tentamos assassinar um amor que um dia nos fez felizes.
Há aqueles que, se refugiam
Em salas de cinema vazias.
Outros confessam sua culpa em altos
Brados e fazem de pinico os ouvidos de infelizes garçons
Há aqueles que negam, veementemente, que estão amando
Para esquecer buscam por novas vítimas em salas de chat
Ou pistas de danceteria, mas com o coração cheio de dor e remorso.
Os mais apaixonados aproveitam suas experiências
Para escrever livros de auto-ajuda
Difundindo ao mundo seus amores
Fatais aos corações sem cicatrizes.
Existem os amores que clamam pelo nascimento do seu grande amor
Outros imploram misericórdia: para o seu nascer.
Existem, aqueles que nasceram; vivem em
Permanente estado de letargia, comuns principalmente
Entre os amantes platônicos que recordarão até o fim de
Seus dias o sorriso daquela gatinha da escola.
Existem, por fim, os amores-fênix. Aqueles que,
Apesar da luta diária pela sobrevivência, dos preconceitos da sociedade,
das contas a pagar, da paixão que aumenta a cada dia.
Com o decorrer dos anos, da mesa-redonda no final de
Domingo, das calcinhas penduradas no chuveiro,
Das toalhas molhadas sobre a cama e das brigas
Que não levam a nada ressuscita das cinzas a
Cada fim do dia e perduram: teimosos, belos, cegos
E intensos. Mas estes são raríssimos e há quem duvide
De sua existência. Alguns os chamam de amores-unicórnio,
Porque são de uma beleza tão pura e rara que jamais poderiam
Ter existido, a não ser como lendas. E é esse amor que eu quero
Viver com você, PARA SEMPRE! Não vamos o deixar acabar nunca..