A vida, manso lago azul algumas
Vezes, algumas vezes mar fremente,
Tem sido para nós constantemente
Um lago azul sem ondas, sem espumas,
Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
Matinais, rompe um sol vermelho e quente,
Nós dois vagamos indolentemente,
Como dois cisnes de alvacentas plumas.
Um dia um cisne morrerá, por certo:
Quando chegar esse momento incerto,
No lago, onde talvez a água se tisne,
Que o cisne vivo, cheio de saudade,
Nunca mais cante, nem sozinho nade,
Nem nade nunca ao lado de outro cisne!
Júlio Salusse
JÚLIO Mário SALUSSE nasceu em Bom Jardim (RJ) a 30 de Março de 1872 e morreu no Rio a 30 de Janeiro de 1948. Cursou Direito em São Paulo e no Rio e foi promotor público em Paraíba do Sul e Nova Friburgo. Epígono do parnasianismo, com afloramentos do simbolismo e decadentismo, a sua poesia lírico-erótica traduz «oscilação dos sentimentos entre o plano do ideal e do sensual, entre o plano da vontade e o dos sentidos».
(Soneto e nota biobliográfica extraída de «A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria É a Língua Portuguesa. Introdução, coordenação e notas de António Ruivo Mouzinho. Edições Unicepe - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, 2004).