EU PRECISO DIZER ADEUS(Prêmio)

Publicado por: Cíntia Thomé
Data: 23/08/2008

Créditos

EU PRECISO DIZER ADEUS DE CINTIA THOMÉ VOZ CÍNTIA THOMÉ PREMIO I PREMIO LITERARIO CANON DO BRASIL 2OA. BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO DE SAO PAULO 2008 SOFWARE AUDACITY
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EU PRECISO DIZER ADEUS(Prêmio)

EU PRECISO DIZER ADEUS

I Prêmio Literário Canon do Brasil 2008

20a. Bienal Internacional do Livro Sao Paulo 2008

(escute em audio)

Eu preciso dizer adeus

Às paredes que grafitam poesia

Do dia-a-dia das guias, das agonias

Do asfalto frio que não me vê

Na esquina da solidão

Da Consolação, cão faminto

Tão sozinho

Eu preciso dizer adeus

À fumaça das fábricas, dos carros

No proibido das faixas neon

Ao lixo, aos escarros

Aos trincados telhados

Ao quartel, ao cartel, patrulha

Aos negros gatos

Eu preciso dizer adeus

Aos prédios espelhados

Reflexos de mim, tempo molhado

À garoa da minha fé retrô

Nos trilhos, no metrô, à Praça da Sé

Aos ambulantes e andantes sem café,

Pedantes, arrogantes elegantes

Eu preciso dizer adeus

A toda gente que aqui não tem lugar

Ao parque que eu também corria

Que há poeira nas flores, no ar

No descanso no Ibirapuera

Beijos no Arouche, carinho fugaz

Carrinho de mão, verdura e limão

Velho moço, velha lata... idoso

Na casa papelão, na escadaria

À gritaria, aos fumantes. Droga!

Às Catedrais, ais.

Escadas rolantes, finos barbantes

Eu preciso dizer adeus

À minha amiga Paulista

Que tem pista e sombra que zomba

Nos spots e placas oportunistas

Dos trapezistas e alpinistas

Nas pernas de pau e sale

Preço da fantasia, álcool e gasolina

Do tostão, da creolina, fedentina, das Carolinas

Que perdi o passe e não vejo qualquer estação

Ao portão do não que arromba

Ao pedinte que ronda. Rapadura!

Eu preciso dizer adeus

Ao gelado da contramão

Do 13 ou 23 de maios já vãos

No sinal entoando vermelha paixão

Sem ensaios, desmaios

Do palhaço, do cordel, do cantador

Sem outdoor encantador

Eu preciso dizer adeus

Aos réus, às vitimas, aos fariseus,

Às chuvas de março e aos ipês no breu

Jacarandás de aço como eu

No barranco, furados pneus

Aos cartões picotados e afanados

Eu preciso dizer adeus

Aos pastéis, ao arroz e feijão sem vaidade

Baião de dois, de mil mornos e sem gás

À bandeira que agita a cidade

Tremula no rubro e negro de mim

Tremula... Tremula...

Nos carretéis dos andaimes

Nos motéis perfume

Eu preciso dizer adeus

À arquitetura, às abandonadas esculturas

À arte sem cor, só dor demolição

À loucura da meia-noite no corredor

Nos pontos de açoite e chorinho

À candura do menino vadio

Que vazio chora baixinho

No meio fio, no meio fio

Marginal, das marginais

Eu preciso dizer adeus

Aos filhos meus e teus

Estou por um fio de lamento

Sem tua mão quente

Nas valas, nos rios, nas veias

Da realidade da cidade

Do meu coração já doente

Eu preciso dizer adeus

Às cabeças, aos monumentos

Neste Imperial momento

Sem querer ter documento

Ser especial, espacial

Na nave de um Cometa

A me levar

À sorte, ao norte ou morte

E na janela sem nada dizer...

A Deus... a Deus...

Que tudo é normal.

Eu preciso dizer adeus

Adeus...

Cíntia Thomé

2008

DEDICO AO MÚSICO LAILTON ARAÚJO E A TODOS NÓS QUE SENTIMOS A CIDADE "GRANDE"

(escute o audio abaixo)

Cíntia Thomé
Enviado por Cíntia Thomé em 05/09/2008
Reeditado em 01/10/2008
Código do texto: T1163580
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